|     Diálogos  e tensões da poesia experimental brasileira: poesia concreta, poema processo e  cia.     Rogério  Barbosa da Silva  Doutor em Literatura  Comparada (UFMG), Professor do CEFET-MG.       Artigo publicado originalmente na edição  especial da Revista de Litratura  Brasileira / FALE / UFMG, v. 13, 2006, p. 85-94, com o “ O EIXO E A RODA - Dossiê 50 anos da poesia concreta”, com textos de especialistas  brasileiros e estrangeiros. Rogério apresentou-se no Verão Poesia (Belo  Horizonte, 8 a 10 de fevereiro de 2010), onde participamos de uma mesa de  discussões e ele gentilmente nos cedeu o volume supra-citado. A. M.    Resumo: Hoje, já  decorridos 50 anos da odisséia dos últimos grandes movimentos internacionais de  vanguarda (a Poesia Concreta surgiu oficialmente em 1956), qualquer avaliação  que deseja obter uma real dimensão de sua extensão e profundidade na esfera da  arte deve considerar não só os tentáculos de sua expansão como também as  principais tensões e divergências intrínsecas a seus projetos estético-ideológicos.   Palavras-chave: Poesia Concreta,  Neoconcretismo, Tendência, Vereda.              Surgida,  oficialmente, em 1956, a Poesia Concreta foi desde logo  um  marco nas vanguardas literárias nacionais e internacionais. Esta afirmação,  muitas vezes feita pelos poetas de Noigandres e tantas vezes subestimada pela  crítica brasileira, agora desvestida da polêmica, pode ser realmente tema de  uma reflexão e efetivamente redimensionada. De fato, hoje, já decorridos 50  anos da odisséia dos últimos grandes movimentos internacionais de vanguarda,  qualquer avaliação que deseje obter uma real dimensão de sua extensão e  profundidade na esfera da arte, em especial da arte literária, deve considerar  não só os tentáculos de sua expansão, como também as principais tensões e  divergências intrínsecas aos seus projetos estético-ideológicos.            Essas  tensões e divergências seriam também decorrentes do modo  como  cada vanguarda atualiza e aprofunda uma vertente criativa do passado. Assim,  por exemplo, no Brasil, Gilberto Mendonça Teles situa o  experimentalismo  de vanguarda em duas vertentes, uma que seria decorrente do próprio processo  evolutivo do modernismo, e outra que a ele se opõe. Seria uma vanguarda  artificial (provocada), saída do modernismo e a ele contraposta (portanto,  também provocante). A "sinfonia experimental", ainda segundo Teles,  se organiza em dois momentos: um que vai de 1956 a 1964 e outro que vem de 1967  aos nossos dias:
   Em ambos se  percebem: a onda de ascensão da maré experimentalista (a  poesia concreta e o  Poema-Processo) e seu refluxo natural da vanguarda  modernista  (Neoconcretismo, Violão de rua, Praxis, etc.). O primeiro  movimento, na  verdade, muito mais importante que o segundo, deixando  teorias poéticas e  críticas que se incorporaram a poesia e a crítica brasileiras.  O segundo, de que se salvou apenas a poesia  praxis, principalmente por causa da obra de seu fundador, Mario Chamie, é  nitidamente consequência do primeiro, com repercussão mais provinciana que  metropolitana constituído que é pelos epígonos e aderentes incapazes de levar  adiante o mesmo afã experimentalista. (TELES, 1985, p. 399-400).              Essa  observação de Gilberto Mendonça Teles é correta, considerando-se que a poesia  concreta e o poema-processo inauguram novos procedimentos na cena literária  brasileira. O poema concreto incorpora os dados novos da espacialização, do grafema,  da tipografia em cores, do princípio de composição matemática, promovendo uma  atualização crítica e material que renova o contexto nacional e projeta a  poesia brasileira para um cenário internacional. Por sua vez, o Poema-Processo  retoma e radicaliza procedimentos utilizados pela Poesia Concreta,  respectivamente, ao enfatizar os aspectos plásticos e estruturais do poema, e  ao retirar a primazia da palavra na criação poética. O Poema-Processo constrói  uma poética de criação de formas que se movimentam como numa sequência de  fotogramas. É a idéia de "uma relação icônica que se estabelece entre o  leitor e a percepção da forma cotidianamente consumida", conforme mostra  Antênio Sérgio Mendonça, que aponta também como características do  Poema-Processo:     [o] rompimento dos  limites do espaço enquanto sobredeterminado à palavra; e finalmente vai-se  buscar um dado essencial aos dois prismas do significante, busca-se ser a  anti-ideologia enquanto dado verbalista. E se assinala um dado cultural  importante, a poesia não é uma comunicação morta, nem reacionária, ela subsiste  como tradutora de um mundo, mesmo que, hipoteticamente, não se expresse mais  fundamentalmente por palavras.  (MENDONÇA,  1970, p. 5).              Praxis,  referida na citação acima, foi idealizada e liderada por  Mario  Chamie, que produziu uma teoria organizada que dá consistência à  poesia  produzida por um grupo de poetas não subordinados programaticamente ao movimento,  mas com afinidades teórico-criativas. A  base  teórica são os dois volumes de Instauração  Praxis, organizados por  Chamie.  Ao ler esses volumes, percebemos haver igualmente um esforço de  clarividência  do autor em propor uma nova teoria do texto e uma preocupação permanente de  distinguir a sua teoria daquela proposta pela Poesia Concreta — às vezes com  ataques mordazes ao grupo Noigandres. Afinal, são duas correntes paulistas se  digladiando. Isso, talvez, explique a descentralização do poema-processo  preposta por Wlademir Dias-Pino. Segundo o poeta, "evitou-se a penetração  (do movimento) em São Paulo pelo exemplo histórico da apropriação  centralizadora que sua força econômica demonstra no modernismo e na geração de  45" (DIAS-PINO, apud MENEZES, 1991, p. 83).              O  objetivo de Praxis, porém, é a constituição de uma poesia que  leve  em conta uma "realidade situada", como demonstra o seu  "Manifesto  Didatico",  levando em conta: a) o ato de compor; b) a área de levantamento da composição;  c) o ato de consumir. (CHAMIE, 1974, p. 21). O destaque a esses elementos  demonstra idêntica preocupação com o processo de composição, característica  também de outras correntes de vanguarda. Praxis concebe tais procedimentos  enquanto resultado de um projeto correlacionado ao problema do levantamento dos  dados de uma realidade existente — e não prévia. A partir dessa realidade, o  poeta pesquisa o vocabulário de criação coletivo - e não pessoal -, que resulta  numa articulação semântico-pragmática operada pelo autor e pelo leitor. O poema  de Praxis pressupõe, no próprio gesto de criação, o leitor ativo ou participante,  que interfere critica e criativamente no texto. Com isso, o poeta de Praxis  estabelece equivalência entre o ato de criar e o de consumir, conforme explica  Chamie:   O autor praxis,  porém, não vai apenas do vocabulário a sintaxe. Para entrosar-se  criticamente com a dialética interna da área e acionar os seus fatores de  transformação, ele põe em prática a relação dos signos (levantados e  articulados numa sintaxe) com o contexto geral em que á area se situa. (...) se  eu parti de algo que pertence a todos e não a mim; de algo que é mais coletivo  que individual. Significa mais: que eu incorporei um ato          coletivo no meu ato  de compor. Ora, se é assim, nada mais legitimo que um texto praxis se  abra a interferência do leitor que assume a condição de co-autor. (...) O  leitor se introduz nele, o redimensiona em seus significados pelo simples  relacionamento que venha a estabelecer entre as palavras ou      signos de conexão e  a sua percepção de leitor. (CHAMIE, 1974, p. 248-249).        |            Evidentemente,  a língua é um patrimônio coletivo, de modo que  o  vocabulário, por mais particularizante que seja, é parte deste patrimônio.  Mas  é perceptível o desejo do poeta de controlar o estilo e o próprio processo de  subjetivação, em prol de uma autoria coletiva. Chamie luta pela construção de  uma teoria de vanguarda autóctone, nacional, em oposição as correntes da poesia  experimental em pleno vigor teórico naquele instante, como a Poesia Concreta, o  Neoconcretismo e a do grupo mineiro da revista Tendência. Como se vê, é nítida  a preocupação do autor de Praxis com os problemas decorrentes da  industrialização, do crescimento urbano e da expropriação do trabalho, além da  consequente luta pelo acesso das camadas populares a melhores condições de vida  e as novas tecnologias; uma realidade que ela comunga com as outras vanguardas.  Curiosa é a opção de Chamie, que prefere entrincheirar-se na realidade interna,  para daí resolver os problemas do subdesenvolvimento nacional. Isto é, ele não  percebe que, sem vincular essas discussões a um plano mundial, sua visão do  problema será limitada ou parcial. O projeto estético de Praxis tem,  entretanto, correspondência com a de outras correntes do experimentalismo. No  plano textual, por exemplo, a preocupação com o trabalho semântico do texto  aproxima-a tanto do concretismo quanto do trabalho de Affonso Avila, um dos  articuladores do grupo em torno da revista Tendência.  A diferença clara em relação ao concretismo esta no campo da sintaxe, pois o  grupo Noigandres busca uma sintaxe analógica, paratática, justamente para  romper com o discursivismo. Praxis e os escritores de Tendência exploram ainda as relações lógicas da  linguagem  verbal, embora os seus textos já marquem uma ruptura com o  verso  tradicional e procurem ir muito além da estrutura lógico-discursiva.  Também  é notório o empenho de Praxis e Tendência em construir uma  literatura  em compasso com os problemas imediatos da realidade nacional, o que marca  diferença em relação ao grupo Noigandres. A Poesia Concreta  estava  muito mais concentrada na projeção de uma poesia transnacional, a  partir  da qual pudesse refletir sobre os problemas locais.            Esta  preocupação irá aguçar o diálogo, a ruptura, e a mudança  de  rota entre as principais correntes de poesia experimental no país no fim da  década de 60. A busca de um nacionalismo crítico vigorou até 1964, quando o  golpe militar impôs novos rumos na trajetória pessoal desses poetas. Esse período  marca, também, o refluxo a maré modernista, referido por Gilberto Mendonça  Teles, mas, além disso, assistimos a uma guinada de muitos desses poetas a um  projeto individual, numa aventura de criação inventiva e de redescoberta de  linhagens e tradições. Como afirmou Antônio Sérgio Bueno, ao lembrar a  pertinência de uma reflexão sobre esse período histórico da poesia de  vanguarda, já decorridos 30 anos, nos anos 60, "não havia espaço para  pensamentos desinteressados". Tal consideração é relevante, pois os cenários  dos anos sessenta e noventa nos trazem questões muito distintas e, de certa forma,  até mesmo antitéticas, já que houve nesta ultima década do Século Vinte uma  derrocada das propostas utópicas. Mas os depoimentos dos principais atores da  Semana Nacional de Vanguarda nos mostram que houve uma coerência no caminho  trilhado por cada um dos poetas, em sua produção individual, se considerarmos  as propostas abraçadas pelos mesmos nas várias vertentes do experimentalismo  brasileiro.            Assim,  por exemplo, as reflexões de Haroldo de Campos em sua  conferência,  por ocasião das Comemorações dos 30 Anos da Semana Nacional de Poesia de  Vanguarda, não destoa, apesar dos anos decorridos, de seu compromisso com a  invenção e com a ação crítica sobre a linguagem e sobre a realidade brasileira.  Contrapostos os depoimentos e as obras dos participantes (na perspectiva da  década de 1990), aos documentos do encontro de 1963, verificamos que houve  mudanças de rumos e transformações formais, mas manteve-se no horizonte crítico  e criativo dos poetas essa preocupação com a poesia de invenção e seu poder de  refletir sobre problemas da realidade brasileira'. No encontro de 1963,  estiveram presentes  muitos poetas, mas assinaram o referido documento os do grupo Noigandres, os  mineiros de Tendência e Vereda, além de outros poetas como  Roberto Pontual, Pedro Xisto, Paulo Leminski, Frederico Morais e intelectuais  como Benedito Nunes, Luis Costa Lima, Fabio Lucas, entre outros. É, de certo  modo, a sagração do "salto participante" iniciado no Congresso de  Escritores em Assis no ano de 1961 - dois anos antes, portanto. Em síntese, o  documento assinado em Belo Horizonte sistematiza objetivamente quatro aspectos  da "vanguarda participante": a) consciência da forma; b) comunicação  e participação; c) função pratica; d) opção.            Na  prática, buscava-se a efetivação de contatos permanentes e  atuação  conjunta, ou mesmo individual, nas questões da realidade nacional,  além  da criação de "novos métodos e meios de aplicação do texto - falado,  musicado,  escrito ou visualizado - além da intensificação do emprego dos já  existentes  (jornais, revistas, livros, cartazes, conferências, debates, gravações, rádio,  televisão, cinema, teatro"). Era uma tentativa de manter o poeta situado perante  a linguagem e as questões de sua época. Sem perder a dimensão lúdica da criação  poética, propor uma poesia participante. Neste sentido, a obra poética e  critica de Affonso Ávila é um testemunho desta possibilidade, pois manteve  sempre um trabalho atento e arguto em tomo da criação poética e da investigação  da tradição inventiva brasileira. Tendo elaborado o conceito de "poesia  referencial" para explicar a sua produção do início dos anos 60, em  especial Carta do solo, o poeta pode fundamentar um projeto que balizou toda  sua produção desde então. Com "poesia referencial", ele quer dizer:  "ela é referencial por ser uma criação, uma fundação, uma invenção. E o  homem só cria, só funda, inventa suas evidências numa projeção da realidade, em  formas de percepção que se condicionam ao seu mundo existencial." (AVILA, 1978,  p.127).            Mais  do que as correntes do experimentalismo referidas acima, a  Poesia  Concreta pagou um preço alto à critica brasileira por ter afirmado sua condição  de novidade e por se propor como uma poesia de exportação, tal como também  desejou Oswald de Andrade. Alguns críticos chegaram a ver os poetas de  Noigandres como epígonos de Eugene Gomringer, o que é uma grande injustiça,  resultante do desconhecimento. Mais produtivo será estudá-la não só a partir  dos seus embates dentro e fora do país, mas principalmente pelo significado que  o dialogo trouxe para o campo da criação poética brasileira. Assim, é um fato  que o que se entende conceitualmente  como "poesia concreta" surgiu do diálogo. Usada, primeiramente, por  Augusto de Campos, a designação "Poesia Concreta" foi adotada por  Eugen Gomringer, conforme documenta carta a Décio Pignatari, incluída no volume Teoria da poesia concreta, em razão  de uma proposta de criação de um movimento, internacional de poesia concreta.  Gomringer chegou a poesia concreta por via da "arte concreta" e pelo  desejo de interferir livremente no arranjo visual e sonoro da escrita, conforme  já praticava Arno Holz. Desse modo, percebe-se que os brasileiros encontraram  fora do Brasil aqueles poetas cujo trabalho era afim ao que vinham produzindo  desde o início dos anos 50, e lograram, isso sim, despertar uma consciência  coletiva dos poetas a partir das propostas  da  poesia concreta no Brasil e na Europa, aproximando outras vertentes do  experimentalismo.            Marlene  Holzhauzen, ao estudar o diálogo entre os brasileiros e  o  poeta suíço-boliviano, destaca o papel de abertura estética e de liberdade  adquirido  pela poesia concreta. Ela mostra a importância que Gomringer  assumira  na Europa, quando descreve a situação de acomodação vivenciada  pela  literatura alemã no início dos anos 50, momento em que uma geração de jovens  escritores alemães conhecem as "Konstellationen  constellations  constelaciones” de Gomringer:     Para uma ala jovem  de escritores alemães, a técnica que o poeta suíço-  boliviano utiliza  para a estruturação destes poemas, assim como o resultado  obtido, revelam um  "Akt der Befreiung" (ato de libertação), um vôo libertador tanto do  escritor quanto da palavra, como a tende na época, o crítico e poeta alemão  Helmut Heissenbuttel (In: Gomringer, 1969, p. 13), descerrando uma outra  perspectiva de atuação para os jovens poetas da República Federal da Alemanha.  (HOLZHAUSEN, 1996, p. 108).              Lendo  os manifestos publicados por Gomringer e os textos teóricos escritos pelos  brasileiros, observamos a grande afinidade entre as ideias dos autores, como,  por exemplo, a valorização da palavra explorada  tipográfica  e espacialmente, refletindo a preocupação de não se restringir ao verbal. Essa  é uma característica marcante do primeiro momento da Poesia Concreta, mas ainda  é fundamental na produção poética de Gomringer, assim como na de Haroldo de  Campos. É também um primeiro passo para o desenvolvimento de uma poesia  intersemiótica, momento em que poetas como Augusto de Campos, Décio Pignatari e  outros passam a entrelaçar o código verbal e o não-verbal. Já no manifesto  "Concrete Poetry", de 1956, Gomringer opõe a Poesia Concreta à poesia  tradicional corrente, distinguindo-a em três aspectos: o aspecto visual, os  elementos de informação e de comunicação e o caráter internacional. O primeiro  aspecto trata, obviamente, da substituição do verso linear por uma configuração  estrutural e espacial do poema, em que sua forma visível seja idêntica a de sua  estrutura. O segundo aspecto está relacionado a problemática da comunicação no  poema concreto, já que as informações estéticas do poema são reveladas por sua  configuração estrutural, isto é, em sua forma concisa e não velada de  linguagem. Com relação ao terceiro aspecto, Gomringer justifica a sua crenÇa de  que a Poesia Concreta poderia realizar a ideia de uma "poesia  universal", em virtude do poliglotismo que toma os poetas afinados com o  movimento:   Este  poliglotismo intencional poderá permitir que algumas línguas vivas entrem em  contato uma com a outra, como numa festa, por exemplo, ou em um vôo, onde  pessoas de diferentes experiências, habilidades, idiomas e aparências externas  podem ser observadas. Então nos também levamos em conta a poesia moderna de  dialeto, que sabe que o mesmo representa o arquivo linguístico fora do qual  podem ser ganhas formas individuais e experiência linguística fundamental.  (Apud SOLT, 1970, p, 68) Essa  ideia de uma poesia que converge para uma linguagem universal não aparece  evidenciada na teoria da Poesia Concreta brasileira. Em suas producões  poéticas, há, entretanto, inúmeros exemplos de poemas que exploram palavras de  outros idiomas, as quais, em razão da articulação imagética, semântica, sonora  e das possibilidades de combinação e de arranjo, alcançam maior rendimento  expressivo e exploração do código verbal como a linguagem que ele é (não como  língua nacional). A título de exemplo, citamos os trabalhos dos brasileiros  Augusto de Campos (com a série "equivocábulos"), Décio Pignatari  (LIFE e os ideogramas verbais), Pedro Xisto, dos poetas de Poema-Processo, que  não se restringem a uma língua e muito menos a um único código. Importa neste  caso que a língua escolhida seja dúctil ao projeto proposto e, sem necessitar  de uma tradução, o poema seja capaz de mexer com a medula da linguagem. Basta  lembrar poemas "hombre/hembra/hambre" ou "Homem/Woman", de  Pignatari, em que o poeta explora o potencial ideogramático ou sonoro das  palavras para jogar com os idiomas.
          Embora  não seja possível aprofundar as discussões que as várias correntes da poesia  experimental encetaram, muitas vezes impulsionadas pela poesia concreta, é  importante assinalar que, decorridos 50 anos, o trabalho realizado pelos poetas  paulistas em consonância com poetas de outras vertentes mudou toda a discussão em  tomo da poesia brasileira. Há que se fazer ainda um balanço acerca de todas as  contribuições que a poesia concreta brasileira deu as vanguardas internacionais  e o que delas recebeu. Mas efetivamente ela se tornou uma referência observável  em vários continentes, onde muitas vezes os poetas paulistas tiveram seus  trabalhos expostos ou publicados em antologias, etc. Eles se inseriam num  "turbilhão cultural" que varreu o mundo a partir dos anos sessenta.  Hoje, efetivamente, importa muito mais a leitura do projeto consistente que  cada um dos poetas, individualmente, desenvolveu em sua obra. Mas a avaliação  crítica do movimento será sempre importante como forma de entendermos a formação  do leitor diante de obras tão abertas e tão abstratas que lhe são oferecidas  pelas formas contemporâneas do experimentalismo.   Abstract:  Today, 50years after the odissey of the last great international avant-garde  movements (Brazilian Concrete Poetry was officially launched in 1956), any  evaluation aiming to appraise the real measures of their extension and depth in  the sphere of art, in special of literary art, must take into consideration not  only the tentacles of their spreading move but also the main tensions and  divergences intrinsic to their aesthetic-ideological agendas.  Key words: concrete poetry, neo-concretism,  Tendência, Vereda.     Referências Bibliográficas AVILA, Affonso. O  poeta e a consciência critica. São Paulo: Summus Editorial, 1978. BUENO, Antonio Sérgio. Semana Nacional de Poesia de  Vanguarda - 30 anos. Belo Horizonte: Prefeitura Municipal de Belo Horizonte,  1993, p. 9-14. (Catálogo da Exposição Semana Nacional de poesia de Vanguarda). CAMPOS, Augusto et al. Teoria da poesia concreta. São Paulo: Livraria Duas Cidades, 1975. CAMPOS, Haroldo. Reflexões após um trintênio. In: SANTA  ROSA, Eleonora (Coord.). 30 anos da Semana Nacional da Poesia de Vanguarda  -1963/93. Belo Horizonte: Prefeitura Municipal de Belo Horizonte: Secretaria  Municipal de Cultura, 1993. p.36-45. CHAMIE, Mario. Instauração  Praxis. São Paulo: Quíron, 1974. 2 v.
 HOLZHAUSEN, Marlene. Poesia concreta:  dois percursos, um diálogo. 1996. Tese (Doutoramento em Literatura Alema) -  USP, Sao Paulo. (mimeo).
 MENDONÇA, Antonio Sérgio. Poesia de vanguarda no Brasil. Rio de Janeiro: Vozes, 1970. MENEZES, Philadelpho. Poética e visualidade - uma  trajetória da poesia brasileira contemporânea. São Paulo: Perspectiva, 1991. SOLT, Mary Ellen  (ed., introd.). Concrete poetry: a world  view. Bloomington: Indiana University Press,1970.               |