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 OLGA DE SÁ     “Entre as frestas  iluminadas por um delicado olhar poético-reflexivo, na confluência das trilhas  híbridas de sua fértil e rica experiência intelectual nas esferas da  Literatura, da Filosofia, da Psicologia e da Teologia, Olga de Sá tece esta  poética singular, percorrendo a densidade de instâncias há muito alinhavadas na  memória: das coisas que não se calam, embora, paradoxalmente, às vezes, pareçam  caladas. Seu instrumento, aqui, é o olhar que pousa, leve, sobre as paisagens,  pessoas e fatos, e sobre o qual se pode lembrar a afirmação oswaldiana:”poesia  é descoberta das coisas que eu nunca vi”.   As palavras são de Beatriz Amaral, na apresentação do  livro Coisas caladas, de Olga de Sá, editado em Lorena, SP, em 2005,  com as belas ilustrações de Helena M. Marcondes. Curiosamente, a autora me  dedica o exemplar em janeiro de 2006 mas só chegou às minhas mãos no início de  julho de 2006. Tudo indica que passou um ano e meio extraviado...    Eu não conhecia a obra poética da autora, salvo poemas  dispersos. Mas conheço, há mais de duas décadas, a formação intelectual de Olga  de Sá até conquistar seu doutorado, suas pesquisas sobre Clarice Lispector,  seus ensaios e o trabalho constante à frente da revista Ângulo, publicação do Instituto Santa Teresa de Lorena, São Paulo.  E a sua atuação acadêmica à frente do curso de biblioteconomia onde, quando eu  ainda era assessor na CAPES/MEC, ela me honrou com um convite para ser  paraninfo de uma das primeiras turmas. Foi no início de uma amizade em que  quase nunca nos vemos mas acompanhamos o nosso trabalho profissional à  distância.    Iniciamos aqui a página de Olga de Sá poeta, com muita  alegria, aberta para futuras colaborações.                                       Antonio  Miranda POÉTICA  REVOLUCIONÁRIA E ANTI-AUTORITÁRIA? – por Olga de Sá – Editorial No. 66    SÁ, Olga de.  Coisas caladas. Lorena, SP: CCTA, 2004.  148 p.  16,7x23 cm.    ilus. col,  Projeto gráfico: Marcus Vinicius Monteiro  Gonçalves. Capa ilustração: Helena M. Marcondes. ISBN 85-99189-05-0  “ Olga de Sá “  Ex. bibl. Antonio Miranda 
   Dádiva    Manhã depois da chuva.  Recorte de verde,  alto-relevo de vermelho e roxo,  no topo das árvores.  Manhã de sol frio.  Neste mês de mormaço,  sob o rendado das nuvens,  o chiado estridente das cigarras,  que estouram sobre o chão regado,  pela chuva da noite.  Aqui, deste minarete,  a vida é um limite.  A solidão, uma dádiva.      Rotina    Fragmentos de mim,  em carne viva,  na rotina acidental do dia.    O seco ardor  da substância  esfria e aquece  a existência.    No provisório,  procura inútil  do permanente.    No limitado,  busca incessante  da infinitude.    E esta fome!  E esta sede!      Excesso    Juntei tanta coisa a vida inteira,  que agora é difícil me livrar.  Quantos vestidos, quantos sapatos,  quanta mala pra leiloar.  A morte é nua, não tem gavetas,  que a gente possa suplementar.  Joguemos fora o peso-excesso,  para o navio não afundar.      Memória    Eu me lembro de paisagens invisíveis,  de coisas passadas não vividas,  de lembranças indeléveis esquecidas,  memória imemorial de dias idos,  perdidos na contagem irrisória  de calendários datados cotidianos,  marcados de eventos em vermelho,  vazios de poesia e liberdade.  Eu me lembro de mim como promessa,  no labirinto de sonhos e desejos,  perdida a fala, repetindo o realejo,  a sorte paga a dez míseros centavos,  tal qual a voz do corvo de Alan Poe:  Nunca mais! Nunca mais! Never more!      Noa  (tarde plena)    Para morrer nesta hora oblíqua,  só com um grito, que ressoa há  séculos:  "Meu Deus, meu Deus, porque me  abandonastes? As trevas cobrem o dia claro.  Fel e vinagre nas relações humanas,  e o véu do templo rompido ao meio.  Haverá algum justo sobre a terra?  Tremem eles sob o estrondo dos  trovões?  Inocentes ainda são sacrificados?  Crianças sofrem violência?  A Deus, a agonia e o ultraje,  nesta hora amarga. 
 
 
 “...  Neste fluir incessanteartéria de água da  vida —
 levo o sangue da  raça,
 na largueza das  senzalas,
 no lamento das  canções.
 Restauração, Pau d´Alho,  Amarela,
 Três Barras, Boa Vista,  Cachoeira,
 Bela Aurora, Fortaleza, Gramado,
 Bela Aliança, Palmeiras,  Resgate,
 Vargem Grande, Maristela,  Sertão...”
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 “Nos casarões, nas várzeas,  nos clarões da mata,
 nos batéis, nas senzalas,  nos salões das sinhás,
 lambris, faianças e lustres brilhantes,
 cristais e louças  de antigamente,
 Mulheres e homens  inesquecíveis,
 gravados na minha memória  de água,
 tempo de rio, rio  do tempo.
 A Condessa de  Haritoff,
 a Baronesa de  Bela Vista.
 a matriarca de Bananal,
 Maria Joaquina Sampaio  de Almeida.
 Domiciana Maria de  Almeida Valim,
 Senhoras de terras, de  homens e casas,
 “Resgate”, entre elas, a  mais poderosa.
 Eufrásia  Teixeira Leite,
 dona de escravos, de amores liberta,
 da Casa da Hera, patrona  e princesa,
 orgulho do Vale no chão de  Vassouras...”
   SÁ,  Olga de. A saga do Rio Paraíba.  In: Arte eCultura no Vale do Paraíba: Literatura.
 Lorena, CCTA,  1998.  p. 144-146.
 
 
 
                   SÁ, Olga de. A saga do Rio Paraíba.  In: Arte e  Cultura no Vale do Paraíba: Literatura. Lorena,  CCTA, 1998.  p. 144-146                          “... Neste fluir incessanteartéria de água da  vida —
 levo o sangue da  raça,
 na largueza das  senzalas,
 no lamento das  canções.
 Restauração, Pau d´Alho,  Amarela,
 Três Barras, Boa Vista,  Cachoeira,
 Bela Aurora, Fortaleza,  Gramado,
 Bela Aliança, Palmeiras,  Resgate,
 Vargem Grande, Maristela,  Sertão...”
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 “Nos casarões, nas várzeas,  nos clarões da mata,
 nos batéis, nas senzalas,  nos salões das sinhás,
 lambris, faianças e lustres brilhantes,
 cristais e louças  de antigamente,
 Mulheres e homens  inesquecíveis,
 gravados na minha memória  de água,
 tempo de rio, rio  do tempo.
 A Condessa de  Haritoff,
 a Baronesa de Bela Vista.
 a matriarca de Bananal,
 Maria Joaquina Sampaio  de Almeida.
 Domiciana Maria de  Almeida Valim,
 Senhoras de terras, de  homens e casas,
 “Resgate”, entre elas, a  mais poderosa.
 Eufrásia  Teixeira Leite,
 dona de escravos, de  amores liberta,
 da Casa da Hera, patrona  e princesa,
 orgulho do Vale no chão de  Vassouras...”
   *Página ampliada e  republicada em novembro de 2023 
    
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