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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

NILTON CHIARETTI

 

UMA CONTEMPLAÇÃO...

O trabalho de Nilton é um arado singular, tão bom de se ler... Já no primeiro livro Rabiscos na roça encontramos porteiras e cercas que se abrem para uma nova paisagem que busquei respeitar como quem contempla uma ventania que chega movendo galhos e remexendo a poeira da estrada. Na revisão desse arado, o que fiz foi apenas admirar e vez ou outra inserir ou retirar aqui ou ali uma folhinha teimosa. Mas.. .nada além disso. Que siga seu vento selvagem, Nilton...

 

Cláudia Cantarella

Professora de Língua Portuguesa e de Literatura Brasileira

Mestre em Literatura pela Unesp/Araraquara

 

Às vezes, um desdobramento matreiro e caprichoso do cordel, sem assumir, livre de métrica e mesmice, com um linguajar de inocêcia (?!) que lembra nosso pantaneiro Manuel de Barros, só que mais sofisticado, mas igualmente telúrico. É pra dizer que gostei do versejar documental e interpretativo, algo irreverente, de Nilton Chiaretti.” 
ANTONIO MIRANDA

 

 

 

CHIARETTI, Nilton.  Proseio.  Ribeirão Preto, SP: Edição do autor, 2014.  104 p. 14X21 cm..         ISBN 978-85-914569-1-8   “ Nilton Chiaretti “  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

ABOBERADO

 

Ele recolhia

paus, pedras, flores

e tudo que couseguisse carregar.

Dizia que eram coisas

que euvidariam.

Pendurava-as nos varais.

Naquele colorido se encantava.

 

Lavadeiras apressadas e nervosas

toda manhã descoisavam os varais.

Maledeciam suas coisas.

Assim eram seus dias.

Trabalho de Sísifo,

diziam os estudados.

Aboberamento, diziam os dali.

Poesia, penso hoje.

 

Aquilo era seu palavrear.

Se eram frases bonitas, não sei,

mas lamento não ter aprendido

aquela linguagem.

Era tão mais simples e colorida.

Bem mais.


 

PEQUENO MANUAL DE BEBER CACHAÇA

 

Beba com morosidade.

Use copo de vidro

com fundo grosso.

Nada de jogar pró santo,

santo não bebe.

Por precaução deixe

um fundinho da primeira dose,

nunca se sabe.

A primeira é a que

acorda a alma e aquece o corpo.

Beba sem pressa.

Essa fase é prestimosa.

A segunda dose prepara o pensar.

Cachaça não ajuda a esquecer,

não se esqueça disso.

A terceira dose fanica o encantamento,

desenterra o passado, embeleza amores

e descontrola os quereres.

Atordoa.
Se ordenar as visagens, palavras e sentimentos

e colocá-las no papel estará poeta.

Se não conseguir, estará bêbado

ou poeta querendo poetar.

Tem pouca diferença entre um e outro.

A principal é a dor da ressaca.

No bêbado dói no corpo,

no poeta, na alma.

 

 

 

SANTOS

 

Ali era o sítio dos santos.

Santo António,

cantador de procissão,

cantava versos de fé,

de trabalhar não gostava

só lidava em precisão

quando a despensa minguava,

ou do padre vinha sermão.

Santo Celso retireiro

tirava leite rezando

pró leite sair abençoado

e nunca faltar pró bezerro.

Amava tanto essa arte

que ao entrar no curral

ficava igual pregador

pra seu rebanho pregando.

 

Também tinha Santa Benta,

Santa Clara como dia,

Santa Rosa, mãe de Santo,

Santo Salmo, carpidor,

catireiro no passado,

pai de Ana também Santa

que na vida triste caiu

por não saber de pecado.

Mas ali o pecado de hoje

era amanhã perdoado.

 

Santo Onofre italiano

do sírio de São Joaquim,

irmão de Zeca briguento

que não queria ser Santo •

preferindo ser marrento

foi marrento até o fim.

Morreu de morte matada

Santo nunca virou,

mas no local que morreu

foi uma cruz colocada.

 

São Geraldo jardineiro

com suas flores proseava.

Conhecedor do jardim,

flores diferentes cruzava,

deixando sempre bem claro

que isso tudo fazia

porque o Criador permitia

ou então isso mandava.

 

Até o menino Bastião

molequinho encapelado,

que eu achava que era Santo

no rio nadava pelado,

corria por todo canto

às vezes no brejo sumia,

um dia sumiu por uns dias

quando voltou foi surrado

pois isso ali existia,

surra de corre cão,

sendo o Santo

Santo ou não.

 

Quando tinha festa de Santos

ficava até engraçado,

os verdadeiros Santos chegavam

devagar, desconfiados,

alguns pedindo licença

para aqueles Santos dali

Santos cheios de pecados.

E pediam por saber

que o que ali era feito

do jeito que aqueles viviam

mesmo não sendo perfeito

era feito com paixão.

E, se o povo dali. Santos

não fossem,

eles, Santos verdadeiros,

Santos também não seriam.

Ficava difícil saber

se vinham pra perdoar

ou então

pedir perdão.

 

 

 


CHIARETTI, Nilton.  Rabiscos na roça. São Paulo, SP: Edição do Autor, 2012.   100 p.  14x21 cm, ISBN 978-85-91459-0-1   “ Nilton Chiaretti “  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

Cerca Viva

 

De tudo que vj na roça

o mais lindo que eu vi -

foi uma cerca caída

que um pé de maracujá

usou pra nela subir

Na cerca se agarrou

nela se pôs a correr

a cerca toda enfeitou

 

Quando tinha florada

era uma mistura de cores

porque junto das flores

uma cabocla danada

depois do dia na roça

pegava pra roupa lavar

E usava a cerca viva

pra sua roupa secar

 

Nessa mistura de flores

tinha a flor já nascendo

tinha a flor já secando

tinha meus olhos olhando

aquelas peças miúdas

e é claro pensando

na cabocla sem as peças

ou suas peças tirando

 

O cheiro daquela florada

era forte e adoçado

As roupas que eu via

tinham cores de pecado

Mesmo sem elas cheirar

só de ver ali secando

sentia o perfume que tinham

Podia isso sonhar

 

 

Ventania

 

O vento passou voando

Pró caboclo, é ventania

Levantou a saia da moça

Pró menino, alegria

Levou capim pra cozinha

Pra cabocla, agonia

Tirou o chapéu da cabeça

Pró vaidoso, correria

E se foi            

 

Ficou só              

o cheiro da terra seca

a cozinha pra limpar

a imagem do vestido

levantado pra lembrar

A cabeça sem cabelo

procurando seu chapéu

Um caboclo cuspindo

saliva e terra

olhando sério pró céu

 

Do jeito que veio partiu

Ninguém deu explicação

Uns falaram em fim de mundo

outros falaram em tufão

Ficou um proseio danado

que quem tava longe pensou

que o vento tinha voltado

 

 

 

Velório

Numa parede, poeira

uma cortina surrada

balança

No ar um cheiro de morte

blasfema pela

falta de sorte

Num canto, um canto

de adeus

Na sala, pobreza

uma praga pra Deus

Na mesa, o corpo

deitado

em meio a luzes de velas

Talvez

numa espécie de dança

a chama da vela balança

Ao ardor

do dia de dor

Ao odor

da rosa comum

No peito, a tristeza se abraça

Se mistura café

com cachaça

Se embola saudade e

desgraça  

E se fala da vida passando

ou que passa

 

 

 

 

Foto de Nilton Chiaretti

 

Página publicada em janeiro de 2015

 


 

 

 
 
 
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