| STELA DO PATROCÍNIO 
                    
                      
                        
                          
                            (1941-1997) Stela  do Patrocínio apareceu no mundo pela primeira ve em 9 de janeiro de 1941, no  Rio de Janeiro, e o que se sabe dela é muito pouco. Negra, doméstica, de  instrução secundária, a  família de Stela  era quase uma lenda, de dados incertos, um rabisco e lembranças esparsas e não  confirmadas. No dia 15 de agosto de 1962, Stela do Patrocínio é interna no  Centro Psiquiátrico Pedro II, no Engenho de Dentro, o mesmo Pedro II que já  serviu de estadia e morada pra outro louco brilhante  chamado Afonso Henriques de Lima Barreto, quando  a instituição situava na Praça Vermelha, seu “cemitério de vivos.” Aos 21 anos  de idade, Stela desaparece do mundo, para mergulhar no obscuro universo da  instituição psiquiátrica, suas estruturas de exclusão, nojo, repressão e,  principalmente, esquecimento. 
 (...)  Aos 45 anos de idade, Stela  reaparecerá , agora, noutro local de reclusão, a Colônia Juliano Moreira, onde  permanecerá  por quase 30 anos. Uma  reaparição pela fala, pela voz e palavra, surpreendendo a artista plástica Neli  Guttmacher que, com o auxílio luxuoso de uma de suas estagiárias, Carla  Guagliardi, grava os depoimentos de Stela, registrados entre 1986 e 1988. Daí  esses registros chegam à mão da estagiária de psicologia Mônica Ribeiro que  transcreve as falas de Stela para o papel, até alcançar o olhar atento da  filósofa e poeta Viviane Mosé, que irá organizar (ou seria remixar?) esses  depoimentos onde se lê poema, onde se diz verso, no livro Reino dos bichos e  dos animais é meu nome, publicados em 2001 (Azougue Editorial).            CARLOS  AUGUSTO LIMA
   POESIA (IM)POPULAR  BRASILEIRA. Organização de Julio  Mendonça.  São Bernardo do Campo, SP:  Lamparina Luminosa, 2012.   302 p.  14x21 cm.   ISBN 978-85-85-64107-03-8 Inclui  textos sobre e poemas de Aldo Fortes, Edgard Braga, Gregório de
 Matos, Joaquim Cardozo, Max Martins, Omar Khouri, Pagu, Qorpo Santo, Sapateiro  Silva, Sebastião Uchoa Leite, Sousândrade, Stela do Patrocínio e Torquato Neto,  apresentados por Omar Khouri, Reynaldo Damazio, Carlos Felipe Moisés, Manoel Ricardo  de Lima, Tarso de Melo, Julio Mendonça, Carolina Serra Azul,  Julia Studart, Fabrício Marques, Renan  Nuernberger, Guilherme Gontijo Flores, Carlos Augusto Lima e  Paulo Ferraz. Ex. bibl. Antonio Miranda
   
                             Não  trabalho com a inteligênciaNem  com o pensamento
 Mas  também não uso a ignorância.
         *         Eu era puro ar, espaço vazio, tempoEu  era ar, espaço vazio, tempo
 E  gases puro, assim, ó, espaço vazio, ó
 Eu  não tinha formação
 Não  tinha formatura
 Não  tinha onde fazer cabeça
 Fazer  braço, fazer corpo
 Fazer  orelha, fazer nariz
 Fazer  céu da boca, fazer falatório
 Fazer  músculo, fazer dente
         Eu não tinha onde fazer nada dessas  coisasFazer  cabeça, pensar em alguma coisa
 Ser  útil, inteligente, ser raciocínio
 Não  tinha onde tirar nada disso
 Eu era espaço vazio puro.
         *         O tempo é o gás, o ar, o espaço vazio         *         Você está me como tanto pelos olhosQue  eu já não sei de onde tirar força
 Pra  te alimentar
     ------------------ Negro na poesiaPágina publicada em maio de 2019
     
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