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                         Foto  extraída de https://www.google.com/ 
                         
                            
                        IZABELA GUERRA LEAL 
                            
                        Nasceu  no Rio de Janeiro, em 1969. Izabela Guimarães Guerra Leal, também conhecida como Izabela Leal, é doutora em  Literatura Portuguesa pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ,  mestre em Letras pela Pontificia Universidade Católica do Rio de Janeiro e  graduada em Psicologia pela UFRJ. 
                          Atualmente é professora de Literatura Portuguesa na  Universidade Federal do Pará.  
                          
                          
                        TEXTOS EN ESPAÑOL      /     TEXTOS EM PORTUGUÊS 
                         
                          
                        MARÇO NO CENTRO 
                           
                            era o começo de março no centro 
                            seu corpo junto ao meu corpo, uma 
                            proximidade assustadora. 
                            primeiro um sorvete de creme derretia 
                            com o calor e as frases que dizíamos 
                            escorriam sobre os livros 
                            do andar de baixo. 
                            confissões de chocolate. 
                            depois pedimos um café e eu olhava espantada 
                            uma palavra 
                            que se debatia no líquido escuro. 
                            pensei em socorrê-la com a colher, mas logo vieram 
                            outras palavras 
                            e mergulharam no copo d´água. 
                            (na mesa a margarida inclinava-se) 
                            era tudo tão claro, apenas aquela palavra 
                            turvava a nitidez do dia. 
                            olhei novamente e ela 
                            jazia no fundo da xícara, 
                            imóvel. 
                          
                        
                          PAPO NO CAFÉ 
                             
                            e foi assim mais uma vez enquanto 
                            tomávamos café 
                            uma abelha ameaçava 
                            nossa fatia de bolo 
                            e você falava das teorias da física quântica 
                            da força atrativa dos buracos negros 
                            da massa comprimida das anães brancas 
                            e agora já eram duas abelhas 
                            — a primeira afogada 
                            num resto de mate — 
                            e você falava que a idéia de deus 
                            é congênita 
                            e falava também da teologia negativa 
                            da teologia positiva e da teologia 
                            neutra 
                            — abanei o bolo e a abelha entrou 
                            na cesta de lixo — 
                            falava dos discos voadores 
                            dos seres interplanetários 
                            dos enigmas egípcios incas maias e 
                            astecas 
                            queria saber a minha opinião 
                            eu ruminava um pedaço de bolo 
                            e tudo aquilo me deixava tão cansada 
                            
                            
                            
                          
                          INIMIGO RUMOR. REVISTA DE  POESIA,  NO. 10 – Edição Especial : 10  anos de Inimigo Rumor.   projeto gráfico Mariana  Bernd.  São Paulo: COSAC NAIF; Rio de  Janeiro: Viveiros de Castro Editora Ltda.        ISSN 1415-9798-00028   Ex. bibl.  Antonio Miranda 
                            
                            
                          FUGA EM DÓ MAIOR 
                            
                          Da sua janela eu via todo o Aterro  
                            e o ritmo incauto dos automóveis  
                            que passavam  
                            num ir e vir diabólico 
                          como marionetes guiadas por fios invisíveis  
                            ou gigantesco imã 
                          que os motoristas em seus interiores  
                            de todo ignoram. 
                            
                          dentro dos carros 
                          mergulhadas em cápsulas de hidrogênio 
                          as pessoas supõem 
                          (tão crédulas!) 
                          conhecer o destino e saber 
                          para onde vão 
                          mas você dizia que não decidimos nada  
                            e 
                          cada gesto 
                          repleto de incontáveis e ínfimos movimentos  
                            deixava no ar um rastro mais ou menos  
                            espesso 
                          que julgávamos quase tão palpável  
                            quanto o aroma desprendido  
                            pela nossa bebida. 
                            
                          nós sorvíamos um pouco do jasmim  
                            lentamente 
                          preenchendo com o olhar os espaços  
                            desabitados 
                            mas não havia nem uma leve madeleine 
                          para molhar naquele líquido 
                          e recuperar o que se esvai 
                          da memória 
                          em meio à fumaça 
                          levantada das nossas xícaras 
                          de chá. 
                            
                            
                            
                            
                          TELA 
                            
                          Você tem razão: 
                            
                          buscamos as possibilidades no vulgo caminhar  
                          das formigas, átomos e elipses  
                          entre mariposas 
                          magma de vidro que o fluxo de logaritmos  
                          cautelosamente atrai 
                            
                          (olhamos o céu?) 
                            
                          estraçalhamos flores para alcançar  
                          o pistilo 
                          e no silk de um espinho  
                          - o ovário deserto de cada palavra – 
                          uma nesga de pólen sem precipitação ou pressa 
                            
                          nada regressa às memórias abissais 
                            
                           
                          
                          
                          
                          POETAS DE HOJE EM DIA(NTE).  Org. Priscila Lopes e Aline  Gallina.  Florianópolis: Letras Conntemporâneas,  2009.   157 p.                    Ex. bib. Antonio Miranda 
                            
                          Fluxos  
                             
                            quando  os olhos se fecham sob a goma 
                              dos dias 
                              e no ar subsiste um brilho 
                              de escamas 
                              talvez os raios 
                              colados nas frestas de sua janela 
                              embaralhem os restos de tinta 
                              e memória 
                              no ralo centrífugo que banha 
                              o estômago. 
   
                              e se de repente o torvelinho 
                              de um gesto 
                              invade a traquéia e estoura 
                              na língua 
                              desenterrando vestígios de naftalina 
                              quem sabe as palavras 
                              refluam na boca 
                              e aterrisem 
                              de leve 
                              sobre os papéis da sua escrivaninha 
                            
                          Ruinas 
                             
                            para  além das ruínas 
                              uma cidade 
                              inacessível 
                              o visitante apenas olhava 
                              não conhecia a senha 
                              embora a cidade não tivesse muros 
                              nem portas 
   
                              recolhidos numa pequena caixa 
                              os vestígios 
                              aguardavam  
                              pacientemente 
   
                              (chegará o dia?) 
   
                              o viajante 
                              agora cansado 
                              abria a caixa 
                              num ímpeto de escavação 
                              eram traços 
                              maços de cartas  
                              atados com barbante 
                              e um vago bloco de notas 
                              eram destroços 
                              um pequeno frasco 
                              oitavado 
                              cuja esparsa essência 
                              se volatizava 
   
                              o viajante caía perplexo 
   
                              e para além das ruínas 
                              a cidade 
                              desaparecia  
                             
                            
                            
                            
                          Página publicada em outubro de 2020 
                           
                            
                            
                            
                         
                         
                          TEXTOS EN ESPAÑOL 
                            Traducción de Cecilia Pavón. 
                         
                          MARZO EN EL CENTRO 
                             
                            empezaba marzo en el centro. 
                            tu cuerpo junto a mi cuerpo, uma 
                            proximidad que asustaba. 
                            primero un helado de crema se derretia 
                            con el calor y las frases que decíamos 
                            se escurrían sobre los libros 
                            del piso de abajo. 
                            confesiones de chocolate. 
                            después pedimos un café y yo vi espantada 
                            una palabra 
                            que se debatia en el líquido oscuro. 
                            pensé en socorrerla con la cuchara, pero pronto vinieron 
                            otras palabras 
                            y bucearon en el vaso de agua. 
                            (en la mesa, la margarita se inclinaba) 
                            era todo tan claro, sólo aquella palabra 
                            turbaba la nitidez del día. 
                            volvi a mirarla 
                            yacía en el fondo de la taza, 
                            inmóvil. 
                             
                             
                            CHARLA DE  CAFÉ 
                             
                            y así sucedió una vez más mientras 
                            tomábamos café 
                            una abeja amenazaba 
                            nuestra rebanada de pastel 
                            y tú hablabas de las teorias de la física cuántica 
                            de la fuerza de atracción de los agujeros negros 
                            de la masa comprimida de las enanas blancas 
                            y pronto ya eran dos abejas 
                            — la primera ahogada 
                            en un resto de mate —  
                            y tú decías que la Idea de dios 
                            es congênita 
                            y también hablabas sobre la teología negativa 
                            la teología positiva y la teología  
                            neutra 
                            — abanique el pastel y la abeja entro 
                            en el cesto de basura — 
                            hablabas de los platôs voladores 
                            de los seres interplanetários 
                            de los enigmas egípcios incas mayas y 
                            aztecas 
                            querias saber mi opinión 
                            yo rumiaba un trozo de pastel 
                            y todo aquello me hacía sentir tan cansada. 
                          
                        Extraído de: CAOS PORTATIL – POESÍA CONTEMPORÁNEA DEL  BRASIL 
                           – EDICIÓN BILINGUE. Selección de Camila  do Valle y Cecília Pavón. Traducción de Cecilia Pavón. México:  Edicones El Billar de Lucrecia, 2007.  ISBN 978-970-95317-2-5 
                          Apoyo del Fonde Nacional para la Cultura y las Artes  
                          
                        
                        De 
                           Heloisa Buarque de Hollanda  
                            Otra línea de fuego - Quince poetas brasileñas         ultracontemporáneas.  
                              Traducción de Teresa Arijón. Edición bilingüe.  
                              Málaga:  Maremoto;  Servicio de Publicaciones, Centro de Edciones  de la Diputación de Málaga, 2009.  291 p 
                            ISBN  978-84-7785-8  
                         
                          Perspectiva 
                          
                        Do  alto das ladeiras implacáveis 
                        sulcadas  na carne pela passagem dos trilhos 
                        —  cicatrizes de ferro ou de um vil material qualquer — 
                        vejo  uma arquitetura de cortes 
                        marcas  insolúveis do ímpeto 
                        que  oscila 
                                           entre  a vida e a morte. 
                          
                        você  me mostrava as luzes da baía  
                        nosso  olhar perfurava a distância inerte  
                        que  tomba da noite 
                          
                                                    sobre  a cidade  
                        multiplicando  os pontos coloridos  
                        e  estendíamos as mãos 
                                                    como  se fosse possível  
                        tocar  as pequenas casas lá embaixo  
                        como  se fosse possível 
                          
                                           (com  as mãos)  
                        atravessar  o concreto e o silêncio. 
                          
                        e  como num lance de dados 
                        tentávamos  prever 
                          
                        o  momento em que o corpo 
                          
                        uma  vez erguido  
                        no  ponto mais alto de sua relativa  
                        trajetória 
                                 (a  mudança das marés e os ventos  
                        boreais  que atingem os montes)  
                        principia  a metamorfose  
                        da  queda. 
                          
                        Perspectiva 
                          
                        Desde lo alto de las laderas implacables  
                        surcadas en la carne por el paso de las vías  
                        —cicatrices de hierro o de un vil material cualquiera—  
                        veo una arquitectura de cortes  
                        marcas insolubles dei ímpetu  
                        que oscila 
                                           entre la vida y la muerte. 
                          
                        me mostrabas las luces de la bahía  
                        nuestra mirada perforaba la distancia inerte  
                        que la noche derrumba 
                          
                                                             sobre la  ciudad  
                        multiplicando puntos de colores  
                        y extendíamos las manos 
                          
                        como si fuese posible  
                        tocar las pequeñas casas allí abajo  
                        como si fuese posible 
                                                    (con las manos)  
                        atravesar el concreto y el silencio. 
                          
                        y como en un tiro de dados 
                        intentábamos prever 
                        el momento en que el cuerpo 
                                                    una vez erguido  
                        en el punto más alto de su relativa  
                        trayectoria 
                                 (mudanza de mareas y vientos  
                        boreales que alcanzan los montes)  
                        inicia la metamorfosis  
                        de la caída. 
                         
                          --------------------------------------------------------------------------- 
                          
                        O flamingo andino 
                          
                        na  lagoa colorada os pequenos pontos nus  
                        juncam  a superfície  
                        do  líquido branco e vermelho.  
                        movem-se  em delicada dança e num átimo  
                        a  cabeça mergulha  
                        os  olhos subaquáticos. 
                        de  tanto em tanto alguns levantam do chão  
                        em  vôos solitários e às vezes em grupo  
                        numa  tensão 
                        entre  a forma e o conteúdo.  
                        o  vento de aço não os afeta  
                        e  as plumas rosadas um pouco escondidas  
                        juntam-se  às negras nas pontas das asas  
                        numa  imitação do bico.  
                        e  ainda que seja pesado o corpo  
                        curvam  tão levemente o flexível pescoço  
                        que  evocam em plena Bolívia  
                        a  graça inapreensível  
                        de  uma bailarina oriental. 
                          
                          
                        Flamenco andino 
                          
                        en  la laguna colorada pequeños puntos desnudos 
                        cubren  la superficie 
                        del  líquido blanco y rojo. 
                        se  mueven en delicada danza y al instante 
                        Ia  cabeza sumerge 
                        los  ojos subacuáticos. 
                        de  tanto en tanto algunos se alzan del suelo 
                        en  vuelo solitário y a veces en grupo 
                        en  una tensión 
                        entre  forma y contenido. 
                        el  viento de acero no los afecta 
                        y  las plumas rosadas un poco escondidas 
                        se  juntan con las negras en las puntas de las alas 
                        en  imitación del pico. 
                        y  aun cuando el cuerpo sea pesado 
                        curvan  tan levemente el flexible pescuezo 
                        que  evocan en plena Bolívia 
                        la  gracia inaprensible 
                        de  una bailarina oriental. 
                          
                          
                          
                          
                        * 
                           
                          Página ampliada e republicada em agosto de 2022 
  
                          
                        Página  publicada em novembro de 2010 
                          
                        Página  publicada em maio de 2009; ampliada e republicada em dezembro de 2010 
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