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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

POESIA ROMÂNTICA BRASILEIRA


DOMINGOS JOSÉ GONÇALVES DE MAGALHÃES

DOMINGOS JOSÉ GONÇALVES DE MAGALHÃES


 

Visconde de Araguaia. Nasceu na cidade do Rio de Janeiro a 13 de agosto de 1811. Filósofo, historiador, poeta, escritor de teatro, foi político e diplomata.Morreu em Roma a 10 de julho de 1882. Foi lente de filosofia do Colégio Pedro II. Doutor em medicina

pela Faculdade do Rio de Janeiro.

 

Obra:  Poesias, Rio, 1852; Suspiros poéticos «.saudades, Paris, 1856; Confederação dos Tamoios, Rio, 1857; Urania, Viena, 1862; Obras completas, 8 vols., Vienna, 1864-1865.

 

TEXTOS EM PORTUGUÊS - TEXTOS EN ESPAÑOL

 

 

 

A UM SABIÁ

 

Mimoso Sabiá, temo e canoro,

Alma dos bosques que o Brasil enfeitam,

Como seu mestre as aves te respeitam,

E os homens como o Orfeu do aéreo coro.

 

Os Amores, e Lilia por quem choro,

Teu doce canto por tributo aceitam;

Eles folgam contigo, e se deleitam,

Eu pasmo de te ouvir, e a um Deus adoro.

 

Tu vives em contínua primavera;

Lilia te afaga, Lilia ouve teu canto!

A tua feliz sorte, oh, quem m'a dera !

 

Então o meu penar não fora tanto ;

Pois seu peito abrandado já tivera

Co´a voz que ao seio d'alma leva o encanto.

 

 

 

Extraído de SONETOS BRASILEIROS Século XVII – XX. Colletanea organisada por Laudelino Freire.  Rio de Janeiro: F. Briguiet & Cie., 1913

 

 

 

MAGALHÃES, Domingos José Gonçalves deSuspiros poéticos e saudades. 5ª. edição.  Prefácio de Fábio Lucas.  Brasília: Editora Universidade de Brasília; INL – Instituto Nacional do Livro, 1986. 438 p.  15,5x22,5 cm.  Capa: Elmano Rodrigues Pinheiro.  ISBN 85-230-0213-8    “ Domingos José Gonçalves de Magalhães “ Ex. na bibl. Antonio Miranda

 

A BELEZA

 

Ó Beleza! Ó potência invencível,

Que na terra despótica imperas;

 

          Se vibras teus olhos

          Quais duas esferas,

5        Quem resiste a seu fogo terrível?

 

          Ó Beleza! Ó celeste harmonia,

          Doce aroma, que as almas fascina;

                    Se exalas suave

                    Tua voz divina,

10      Tudo, tudo a teus pés se extasia.

 

          A velhice, do mundo cansada,

          A teu mando resiste somente;

                    Porém que te importa

                    A voz impotente,

15      Que se perde, sem ser escutada?

 

          Diga embora que o teu juramento

          Não merece a menor confiança;

                    Que a tua firmeza

                    Stá só na mudança,

20      Que os teus votos são folhas ao vento.

 

          Tudo sei; mas se tu te mostrares

          Ante mim como um astro radiante,

                    De tudo esquecido,

                  Nesse mesmo instante,

25      Farei tudo o que tu me ordenares.

 

          Se até hoje remisso não arde

          Em teu fogo amoroso meu peito,

                    De estoica dureza

                    Não é isto efeito;

30       Teu vassalo serei cedo ou tarde.

 

          Infeliz tenho sido até-gora,

          Que a meus olhos te mostras severa;

                    Nem gozo a ventura,

                  Que goza uma fera;

35       Entretanto ninguém mais te adora.

          Eu te adoro como o Anjo celeste,

          Que da vida os tormentos acalma;

                    Ó vida da vida,

                    Ó alma desta alma,

40      Um teu riso sequer me não deste!

 

          Minha lira que triste ressoa,

          Minha lira por ti desprezada,

                    Assim mesmo triste,

                    Assim malfadada,

45      Teu poder, teus encantos pregoa.

 

          Ó beleza, meus dias bafeja,

          Em teu fogo minha alma devora;

                    Verás de que modo

                    Meu peito te adora,

50      E que incenso ofertar-te deseja.

 

Paris, março de 1836.

 

 

 

 

A AFLIÇÃO

 

          Não, não é sangue; é fel envenenado,

          Que em minhas veias gira.

          Não, não é vida; são espinhos hirtos,

          São hervados acúleos, que incessantes

5                  O coração me pungem.

          Não, não é ar; é o hálito da morte,

                    Que o peito me comprime.

          Não são do mundo as cenas que me envolvem;

                    São as cenas do Inferno.

 

10      É possível, meu Deus, que tanto sofra

          Um mísero mortal, e qu'inda viva?

                    Queres ver do teu servo

          A alma, de padecer já calejada,

          Sem murmurar, sem blasfemar, té onde

15               A paciência leve?

          Em mim acaso novo Job preparas?

          Ou o meu coração não é de humano,

Ou a dor já o tem empedernido

                    Co'o reiterado embate.

 

20      Ó meu Senhor, pequeno é o meu peito,

          Para conter um coração repleto

          De tantas aflições, de angústias tantas.

                    Tira-me a própria vida,

                    Tira-me o sentimento,

25       Ou com tríplice lâmina de ferro

 

          Forra meu peito, e meus ouvidos cobre.

                   

                    Ó dever de homem probo!

          Hei de eu como uma incude duros golpes

          Suportar insensível, sem queixar-me
30      De quem martírios tais sem dó me causa?

          sem dó?... e talvez mais; sem um remorso!

                    Tu Zeno, assim me ensinas;

                    Filosofia austera,

          Eu sigo a tua lei, por ti me guio.

                    Oh, que esforço é preciso

          Na idade do prazer, e do interesse!

 

          Eu chorei, e meus olhos se secaram;

          Nem mais em nova dor lágrimas novas

          Terei para chorar; as dores todas

40      Me fizeram tragar seus amargores;

          Não há mais dor que apresentar-me possa

          Nova taça de acético veneno.

 

                    O triste solitário,

          Que em áspero deserto transviado,

45      De improviso se vê acometido

          De cruéis serpes, que o pescoço lhe atam,

                    E lhe cravam no peito

          Agudas presas de peçonha cheias,

                    É a horrível imagem

50      Do estado meu, do meu duro martírio.

                    Mas quem poderá crer-me?

          Quem pode avaliar minhas angústias?

          Mimosos do prazer, eia, deixai-me;

          De vossa compaixão não necessito;

55         Vosso riso me ofende.

 

          Estala, coração, estala, acaba!

                    Não tens uma só fibra,

          Que ao golpe de uma dor não retinisse.

          Por que não deixas o meu corpo, ó alma?

60      Que fogo de esperança inda te anima?

          Ó esperança, quase que me foges!

          Não há consolação para o infelice,

          Que longe de seus pais, da Pátria longe,

                    Definha entre pesares.

65      Que, ó mundo, com dores'só; misturas

          As lições que nos dás? A experiência

                    Só com dores se colhe,

          Como uma flor de espinhos guarnecida?

          São inúteis os livros, e os conselhos?

70      É tudo a experiência?

          A experiência é só quem nos ensina

                    A ciência da vida?

 

                    Ó infantil vaidade!

          Vós, ó jovens, cuidais que sabeis tudo,

75      As páginas de um livro apenas lendo.

          Dos velhos desprezais os sãos conselhos,

          E orgulhosos dizeis: — Hoje a velhice

          Lições deve tomar da juventude;

          Hoje de nossos pais acima estamos.

80      Moço sou, como vós sábio julguei-me;

                    Como vós iludi-me.

 

          Ontem fagueira a sorte se mostrava,

                    Ria-se a Natureza,

          E em sacros laços de amizade estreita

85                Os homens se apertavam.

          Hoje terrível tempestade brama,

          Os homens se repelem, se debatem,

          Como rábidas feras nas florestas.

 

                    Misterioso enigma,

90      Inexplicável Ser, capaz de tudo,

          Fonte de vícios, de virtudes fonte,

          Que edificas, que assolas, e que sempre

          De ruína em ruína ovante marchas,

                    Como um Génio de morte,

95                Dize, o que és tu, ó homem!

 

          Cala-se a Natureza, e só ressoa

                    Um grito doloroso

Dos túmulos erguido;

          Como um gemido de agoureiro Mocho,

100    Quando sobre destroços esvoaça.

 

                    No peito â destra aplico;

          Palpita o coração fraco e pausado;

          Atento escuto, as pulsações calculo;

                    Não me agita o remorso,

105    Nem espectros a noite me apresenta;

          E minha alma tranquila na tormenta

                    Como um firme penedo,

          Nem a sombra de um crime a entenebrece.

Doce consolação de um peito aflito!

          110    Ó único juiz incorruptível,

Ó meu Deus, ante quem brilha a verdade

Mais clara do que o sol; a cujos olhos

O mais pequeno verme iguala ao homem,

E a Natura descobre os seus arcanos;

          115   Tu, que o meu coração penetrar podes,

Julga tu só, e vê se são meus erros

          Iguais às minhas dores.

 

Enganar-te, meu Deus, não pode o homem!

 

Se feia iniquidade n'ele habita,

          120   Se mereço o que sofro, ah deixa, deixa

Que os inimigos meus de mim se vinguem.

Não me atendas. Senhor; meus ais despreza.

          Deixa expiar meus erros

Na terra onde este pó ao mal me prende,

          125    Antes que eu suba ao tribunal eterno.

Mas se fala a inocência em meu socorro,

Mostra a verdade, salva-me, e absolve

          Aqueles que me infamam;

Que eu os perdoo, ó Deus; por ti o juro;

          130    Sou Cristão; - e o Cristão sofre, e perdoa.

 

 

OLIVEIRA, Alberto dePáginas de ouro da poesia brasileira. Rio de Janeiro: H Garnier, Livreiro-Editor, 1911.   420 p.  12x18 cm Ex. bibl. Antonio Miranda
Inclui os poetas: Frei José de Santa Rita Durão, Claudio Manuel da Costa, José Basílio da Gama, Thomas Antonio Gonzaga, Ignacio José de Alvarenga Peixoto, Manoel Ignacio da Silva Alvarenga, José Bonifacio de Andrada e Silva, Bento de Figuieredo Tenreiro Aranha, Domingos Borges de Barros, Candido José de Araujo Vianna, Antonio Peregfrino Maciel Monteiro, Manoel de Araujo Porto Alere, Domingos José Gonçalves de Magalhães, José Maria do Amaral, Antonio Gonçalves Dias, Bernardo Joaquim da Silva Guimarãaes, Francisco Octaviano de Almeida Rosa, Laurindo José da Silva Rabello, José Bonifacio de Andrada e Silva, Aureliano José Lessa, Manoel Antonio Alvares de Azevedo, Luiz José Junqueira Freire, José de Moraes Silva, José Alexandre Teixeira de Mello, Luiz Delfino dos Santos, Casemiro José Marques de Abreu, Bruno Henrique de Almeida Seabra, Pedro Luiz Pereira de Souza, Tobias Barreto de Menezes, Joaquim Maria Machado de Assis, Luz Nicolao Fagundes Varella, João Julio dos Santos, João Nepomuceno Kubitschek, Luiz Caetano Pereira Guimarães Junior, Antonio de Castro Alves, Luiz de Sousa Monteiro de Barros, Manoel Ramos da Costa, José Ezequiel Freire, Lucio Drumond Furtado de Mendonça, Francisco Antonio de Carvalho Junior, Arthur Narantino Gonçalves Azevedim Theophilo Dias de Mesquita, Adelino Fontoura, Antonio Valentim da Costa Magalhães, Sebastião Cicero de Guimarães Passos, Pedro
Rabello e João Antonio de Azevedo Cruz.   

 

NAPOLEÃO EM WATERLOO  

Eis aqui o lugar, onde eclipsou-se
O meteoro fatal ás regias frontes !
E nessa hora em que a gloria se obumbrava,
Além o sol em trevas se envolvia.
Rubro estava o horisont, e a terra rubra !
Dois astros ao occaso caminhavam;
Tocado ao seu zenith haviam ambos:
Ambos iguaes no brilho, ambos na queda,
Tão grandes, como em horas de triumpho !

Waterloo !... Waterloo !... Lição sublime
Este nome revela á Humanidade :
Um oceano de pó, de fogo e fumo
Aqui varreu o exercito invencível,
Como a explosão outrora do Vésuvio
Até seus tectos inundou Pompéa !
O pastor, que apascenta seu rebanho,
O corvo, que sanguíneo pasto busca,
Sobre o leão de granito esvoaçando,
O echo da floresta, e o peregrino
Que indagador visita estes lugares :
Waterloo !.... Waterloo !... dizendo, passam.

Aqui morreram de Marengo os bravos !
Entretanto esse heróe de mil batalhas,
Que o destino do reis nas mãos continha.
Esse heróe, que com a ponta de seu gladio
No mappa das nações traçava as raias,
Entre seus marechaes ordens dictava!
O hálito inflammado de seu peito
Suffocava as phalanges inimigas,
E a coragem nas suas accendia.

Sim, aqui estava o génio das victorias
Medindo o campo com seus olhos de águia!
O infernal retim-tim do embate de armas,
Os trovões dos canhões que ribombavam,
O sibilo das balas que gemiam,
O horror, a confusão, gritos, suspiros,
Eram como uma orchestra a seus ouvidos !
Nada o turbava. Abobadas de balas,
Pelo inimigo aos centos disparadas,
A seus pés se curvavam respeitosas,
Quaes submissos leões, e nem ousando
Tocai-o, ao seu ginete os pés lambiam !..
Oh ! porque não venceu? Fácil lhe fôra!
Foi destino, ou traição ? A águia sublime
Que devassava o céo, com vôo altivo,
Desde as margens do Sena até o Nilo,
Assombrando as nações com as largas azas,
Porque se nivelou aqui com os homens?

Oh ! porque não venceu? O anjo da gloria
O hymno da victoria ouviu tres vezes,
E tres vezes bradou : — « E' cedo ainda ! »
A espada lhe gemia na bainha,
E inquieto relinchava o audaz ginete,
Que soja escutar o horror da guerra,
E o fumo respirar de mil bombardas;
Na pugna os esquadrões se encarniçavam,
Roncavam pelos ares os pelouros,
Mil vermelhos fuzis se emmaranhavam,
Encruzadas espadas, e as baionetas,
E as lanças faiscavam retinindo.
Elie só, impassivel, como a rocha,
Qual de ferro fundido estatua equestre,
Que invisível poder, magico anima,
Via seus batalhões cair feridos,
Gomo muros de bronze, por cem raios,
E no céo seu destino decifrava...

Pela ultima vez, com a espada em punho,
Rutilante na pugna se arremessa;
Seu braço é tempestade, a espada é
 raio !
Mas invencível mão lhe toca o peito!
E' a mão do Senhor — barreira ingente:
— « Basta, guerreiro ! tua gloria é minha;
Tua força em mim está; tens completado
Tua augusta missão ! — E's homem. — Pára! »

Eram poucos, ó certo; mas que importa?
Que importa que Grouchy, surdo ás trombetas,
Surdo aos trovões da guerra, que bradavam :
— « Grouchy ! Grouchy! a nós, eia! ligeiro !
0 teu imperador aqui te aguarda!
Ah! não deixes teus bravos companheiros
Contra a enchente luctar, que mal vencida
Uma após outra em turbilhões se eleva,
Como vagas do oceano encapellado,
Que furibundas se alçam, luctam, batem
Contra o penedo, e como em pó recuam,
E de novo no pleito se arremessam. »

Eram poucos, é certo; e contra os poucos
Armadas as nações aqui pugnavam !
Mas esses poucos vencedores foram
Em Iena, em Montmirail, em Austerlitz.
Ante elles o Thabor, e os Alpes, curvos,
Viram passar as águias vencedoras !
E o Rheno, e o Manzanar, e o Adige, e o Euphrates
Embalde á sua marcha se oppuzeram.

Eram os poucos que, jamais vencidos,
Os seus dias contavam por batalhas,
E de cans se cobriram nos combates;
O sol do Egypto ardente assoberbaram,
A peste em Jaffa, a sêde nos desertos,
A fome e os gelos dos Moscovios campos :
Poucos, que se não rendem, mas que morrem!

Oh ! que para vencer bastantes eram !
A terra em vão contra elles pleiteara,
Se Deus, que os via, não dissesse — « Basta! »
Dia fatal de opprobrio aos vencedores!
Vergonha eterna á geração que insulta
O leão que magnânimo se entrega!

Eil-o sentado em cima do rochedo,
Ouvindo o echo fúnebre das ondas,
Que murmuram seu cântico de morte;
Braços cruzados sobre o largo peito.
Qual naufrago escapado da tormenta,
Que as vagas sobre o escolho regeitaram;
Ou qual marmórea estatua sobre um tumulo,
Que grande ideia o occupa, e turbilhona
Naquella alma tão grande como o mundo

Elle vê esses reis, que levantara
Da linha de seus bravos, o traírem.
Ao longe mil pygmeus elle divisa,
Que mutilam sua obra gigantesca;
Como do Macedonio outrora o império
Entre si repartiram vis escravos.
Então um riso de ira e de despeito
Lhe salpica o semblante de piedade.

O grito inda innocente de seu filho
Sôa em seu coração, e de seus olhos
A lagrima primeira se deslisa;
E de tantas coroas que ajuntara,
Para dotar seu filho, só lhe resta
Esse nome, que o mundo inteiro sabe !

Ah ! tudo elle perdeu ! a esposa, o filho,
A pátria, o mundo e seus fieis soldados.
Mas firme era sua alma como o mármore,
Onde o raio batia e recuava !
Jamais, jamais mortal subiu tão alto!
Elle foi o primeiro sobre a terra :
Só, elle brilha sobranceiro a tudo,
Como sobre a columna de Vendôme
Sua estatua de bronze ao céo se eleva.
— Acima delle, Deus — Deus tão sómente !

Da liberdade foi o mensageiro.
Sua espada, cometa dos tyrannos,
Foi o sol, que guiou a humanidade.
Nós um bem lhe devemos, que gosamos;
E a geração futura, agradecida,
— Napoleão ! dirá, cheia de assombro.

 

 

 

TEXTOS EN ESPAÑOL

 

POESÍA ROMÁNTICA BRASILEÑA

 

 

DOMINGOS JOSÉ GONÇALVES DE MAGALHAES (1811-1882)

 

Traducción de Ángel Crespo
[promotor de la poesía brasileña en España ena Revista de Cultura Brasileña]

 

REVISTA DA SOCIEDADE PHILOMATHICA. grafica do Novo Farol Paulistano.  S. PAULO.  Edição fac-similar patrocinada pele Metal Leve.  São Paulo: Companhia LIthographica Ypiranga, 1977   Apresentação de Antonio Soares Amora.  Inclui o no. 1, 2, 3, 4, 5 e 6 de 1833.
Ex. bibl. Antonio Miranda.

 

O número 2, de julho de 1833, inclui o “Ensaio crítico sobre a Colleção de Poesias do Sr. D. J. G. Magalhães”, do qual extraímos um fragmento e o soneto em sua linguagem original, escrito quando o autor, aos 21 anos, aparece no cenário literário brasileiro. A seguir, um fragmento do texto escrito por J. J. Rocha:

“Cheio da leitura de nossos classicos o Sr. Magalhães foge igualmente do arcaísmo pedantesco, e do insosso Galicismo, que ia solapando nossa lingua e com ella nossa poesia. Sua linguagem terça, e pura é animada por metaphoras, e comparações justas e brilhantes; a ridícula anthitesis, os chóchos e empolados palavrões, de que lanção mão os Elmanistas para disfarçarem sua nudez de pensamento, são proscariptos de seus versos. Mas, por desgraça, fugindo deste defeito, cahe no oposto, e às vezes sua dicção poética tem resabios de prosa; e bem que poder-se-hião appresentar milhões de vezes o mesmo defeito nas obras dos nossos classicos, não deixa de ser uma nodoa. O gosto, severo juiz de todas as composições, deve mostrar ao vate, entre o prosaísmo e a affectação Elsmanica, o meio termo tão dificil de achar em todas as cousas humanas.”

 

        Soneto-imitado de Scarren

       Do orgulho humano excelsos momentos;
       Piramides, jardins, cuja estrutura
       Triumpha das beldades de natura
       Dando victoria d´arte aos ornamentos;
             Theatros de grandeza, e de tormentos;
       Palacios, Coliseus, d´architectura
       Extremo afan, de que memoria dura
       Só na vida de rotos pavimentos;
              Succumbistes do tempo ao feroz corte;
       Ou vos prostou de todo o deshumano,
       Ou se viveis, sentis já perto a morte;
             Se pedras não se livrão de tal danno
       Será muito que soffra igual sorte
       Este Sapato, que me dura há um anno?
 


HADAD, Jamil Almansur, org.   História poética do Brasil. Seleção e introdução de  Jamil Almansur Hadad.  Linóleos de Livrio Abramo, Manuel Martins e Claudio         Abramo.  São Paulo: Editorial Letras Brasileiras Ltda, 1943.  443 p. ilus. p&b  "História do Brasil narrada pelos poetas. 

HISTORIA DO BRASIL – POEMAS

 

Retrato de Dom João VI. Pintura de Jean-Baptiste Debret, 1817.

 

 

CONFEDERAÇÃO DOS TAMAIOS 

CANTO SEGUNDO

           (fragmento)

 

P´ra acabar co´os ataques reiterados
Dos Lusos, confederam-se os Tamoios.
Bravos são os Tamoios, e descendem
Da raça dos Tupis. Eles não erram
Sem tabas, nos sertões, com os terríveis
Feroces Aimorés, raça Tapuia.
Natural, inspirada poesia
De todos os distingue, os enobrece,
E tratáveis os torna, inda que altivos:
Creem qu´esse dom, e as doces vozes,
As puras águas devem do Carioca.
Vasta extensão ocupam do terreno
Que banha a Guanabara. As suas tribos
Se estendem desde as longas serranias
Que um órgão fingem, donde o nome tiram,
Até o Cairuçú, terror dos nautas.
Um Deus adoram, que dispara ao raio,
E que pelo trovão aos homens fala:
Tupá se ele nomeia; aos seus ministros
São os pajés entre eles venerados.
Leis escritas não têm; mas não lhes faltam
As leis da Natureza e as dos costumes,
Herdadas de seus pais. O mais idoso
E o mais forte é por chefe respeitado.
Já todos os guerreiros se apercebem
De tacapes e maças de pau-ferro,
Arcos robustos, e emplumadas flechas.
Aimbire, o forte Aimbire, apregoado
Entre todos os fortes pela audácia
Com que arroja à frente dos Tamoios,
Pelo voto geral primeiro chefe.
Aimbire desde a infância se amestrara
A certeiro enviar co´a seta a morte;
Nem no rápido pulo lhe escapava
O jaguar mais ligeiro sobre a rocha:
Nem mesmo o gavião alto pairando,
Nem pequenino pássaro burlavam
Da seta alada o infalível tiro.
Fraldam tecido de encarnadas penas,
Matizadas de azul, que a arara imita,
A cintura lhe cinge. Do pescoço
Cai o colar de dentes arrancados
Por suas mãos das bocas dos vencidos,
E tão amplo lhe cai que o peito cobre.
Larga, escamosas, verdenegra pele
De enorme jacaré, que ele matara,
As espáduas lhe veste. Tem na destra
Uma de dentes de onça acha embutida,
Que de serra lhe serve e mortal arma.
C´roalhe a fronte um resplandor de penas
Da cor do fulvo sol: obra apurada
De Iguassú, que lhá deu de amor em prenda,
Iguassú sua amante, e que ele espera
Tomara, finda esta guerra, por esposa.
Nem ao lado lhe falta grossa aljava,
Nem o arco robusto, que dous homens
Como nós a vergá-lo suariam,
E em suas mãos porém fácil se curva.
O ancião Pindobuçu de nobre aspecto
Sua taba conduz: ele se cobre
Com negras plumas, que a tristeza exprimem
Pela morte do filho, qu´inda chora.
Parabuçu, de porte agigantado,
De penas não se cobre; moço ainda
Quer espanto causar co´o hórrido aspecto
Da figura; mandíbulas se enfia,
Até ao chão se estende; enorme casco
De tatú lhe defende o peito e o ventre;
De escudo outro lhe serve. Ele sobraça
A terrível inúbia que assinala
A hora da investida e retirada.
Tão medonho trajar mais lhe realça
O corpo colossal e musculoso.
Pindobuçú, seu pai, que muito o ama,
Nele de Chamorim tem viva a imagem,
E nele cifra o orgulho dos seus anos.

   
(A CONFEDERAÇÃO DOS TAMOIOS – Emprêsa
         Tipográfica Dois de Dezembro – Rio de Janeiro – 1857)



 

ROMANTISMO / seleção e prefácio Antonio Carlos Secchin.  São Paulo: Global, 2007.  (Coleção roteiro da poesia brasileira. Direção: Edla van Steen.)                           Ex. bibl. Salomão Sousa

 

INVOCAÇÃO À SAUDADE

Tu, que n´alma te embebes magoada,
Melancólica dor, e gota a gota
Vertes no coração tóxico acerbo,
Que entorpece a existência, e a vida rala!
Tu, tirana da ausência, que retratas
Em fugitiva sombra, em negro quadro
A imagem do passado;
Que ao filho sempre a mãe anosa antolhas,
A pátria ao peregrino, o amigo ao amigo,
O esposo à esposa; e ao malfadado escravo
Que sem futuro pelo mundo vaga,
Mostras a liberdade, e o lar paterno;
E a cada simulacro que apresentas,
Com farpado aguilhão rasgas o peito
Do triste que te sofre;
E nos olhos sanguíneos, encovados,
Não lágrimas destilas,
Mas fel, só atro fel, bárbara, espremes.

Ó saudade! Ó martírio de alma nobre!
Malgrado o teu pungir, como és suave!
Como a rosa de espinhos guarnecida
Aguilhoa, e apraz co´o  doce aroma,
Tu feres, e mitigas com lembranças.
Mas ah! o teu espinho ainda é mais duro;
E essas tuas lembranças são falaces,
Flores são que o pinhal de Harmódio cobrem.

Para agora oprimir-me tudo se ergue,
Tudo agora de encantos se reveste,
Para mais agravar minha saudade.
Sítios qu´eu desdenhei, sítios que amava,
Templos que orar me viram respeitoso,
Estes céus de safira, estas montanhas
Cobertas de cocares de palmeiras,
Pais, amigos, irmãos, ah! tudo, tudo
Me está representando a fantasia,
Como que pouco a pouco quer matar-me.

Que cena há-hi que mais encantos tenha,
Que ver lânguida virgem, pudibunda,
Pálida a fonte, as faces desbotadas,
Baixos os olhos, revoando a coma,
E uma terna expressão de oculta angústia
Que lavra-lhe as entranhas?

Que cena há-hi que mais encantos tenha,
Que vê-la num baixel, segura ao mastro,
Suspiros exalar, longos suspiros,
Que voam murmurando, e se misturam
Co´os ventos que sibilam nas exárcias?
De vez em quando olhar, e só ver nuvens,
Nuvens que o céu encobrem, retratando
Fugitivas imagens, que recordam
Terras da pátria; quem, meu Deus, quem pode
Resistir a tal cena?

Tu matas, ó saudade!... As crespas ondas,
Delirante Moema, e quase insana,
Por ti ferida se arremessa... e morre...
Que não pode a mesquinha
Longe viver do fugitivo amante,
Que tanto amor pagara com desprezos.
Lindóia, entregue à dor, desesperada
N´ausência de Cacambo, mal lhe soa
Do caro esposo o último suspiro,
Também suspira, odeia a vida... e morre...
E tu, Clara infeliz, filha dos bosques,
Gerada entre palmeiras,
Nada pode aprazer-te, nada pode
Extinguir-te a lembrança
Da rústica cabana, onde embalada
Em berço fostes de tecidas varas.
De diurnas, domésticas fadigas
Descansada, lá quando alveja a lua
Em fundo azul, mil vezes te enxergaram
Num tronco de coqueiro reclinada,
Cantar da infância tuas árias saudosas,
Árias bebidas nos maternos lábios:
Ai... minha mãe, dizias.

Ai, minha mãe... que sabe se ainda vives...
Aldeia onde nasci, pobre cabana,
Rede que em embalavas, eu vos choro!

Ó terra do Brasil, terra querida,
Quantas vezes do mísero Africano
Te regaram as lágrimas saudosas?
Quantas vezes teus bosques repetiram
Magoados acentos
Do cântico do escravo,
Ao som dos duros golpes do machado!

Ó bárbara ambição, que sem piedade,
Cega, e surda de Cristo a lei postergas,
E assoberbando mares, e perigos,
Vais infame roubar, não vãs riquezas,
Mas homens, que escravizas!
Mil vezes o Senhor, para punir-te,
Opôs ao teu baixel ondas, e ventos;
Mil vezes, mas embalde,
Nas cavernas do mar caiu gemendo.
À voz do Eterno obediente a terra
Se mostra austera e parca,
Que lágrima do escravo esteriliza
O terreno que orvalha.
A Natureza preza a Liberdade,
E só franqueia aos livres seus tesouros.

Ó suspirada, ó cara Liberdade,
Descende asinha do Africano à choça,
Seu pranto enxuga, quebra-lhe as cadeias,
E adoça-lhe da pátria a dor saudosa.

Ó palavras! ó língua! quão sois fracas,
Para d´alma narrar os sentimentos!
Ó saudade, aflição dura e suave!
Ó saudade, que o rosto me descoras,
Saudade, que me apertas, que nos lábios
Secas-me o almo riso,
E o pensamento meu absorves todo,
Como uma esponja o líquido, e o repartes
Co´o passado, o presente, e co´o futuro.
Ó saudade! Ó saudade!
Minhas endechas mal carpidas colhe;
Dá-me um lúgubre som, como o das vagas
Que nas praias se quebram
Sem ordem, como os meus chorados cantos;
Uma voz sepulcral, como a da rola
que em solitária selva se lamenta;
Um acento funéreo, um eco lúgubre,
Com o eco das grotas, quando a chuva
Goteja reboando.
Ah! corram minhas lágrimas, ah! corram
A quantos meus gemidos escutarem.

Ó saudade! Ó saudade!
Pois que em minha alma habitas,
E sem cessar me lembras pais, e Pátria,
Minhas tristes endechas serão tuas,
Saudade, serei teu... Saudade, és minha.

             Suspiros poéticos e saudades (1836)

ADEUS À EUROPA

Adeus, ó terras da Europa!
Adeus, França, adeus, Paris!
Volto a ver terra da Pátria,
Vou morrer no meu país.

Qual ave errante, sem ninho,
Oculto peregrinando,
Visitei vossas cidades,
Sempre na Pátria pensando.

De saudades consumido,
Dos velhos pais tão distante,
Gotas de fel azedavam
O meu mais suave instante.

As cordas de minha lira
Longe tempo suspiram;
Mas alfim frouxas, cansadas
De suspirar, se quebraram.


Ó lira do meu exílio,
Da Europa as plagas deixemos;
Eu te darei novas cordas,
Novos hinos cantaremos.

Adeus, ó terras da Europa!
Adeus, França, adeus, Paris!
Volto a ver terras da Pátria,
Vou morrer no meu país.

 

              Paris, agosto de 1836
Suspiros poéticos e saudades (1836)
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Página ampliada e republicada em maio de 2022


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Página publicada em outubro de 2021

 

 

 

Página publicada em junho de 2009. Ampliada e republicada em agosto de 2014. Ampliada e republicada em agosto de 2016. Ampliada em junho de 2019

 

 


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