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                          Foto: https://www.meionorte.com/
     JAMERSON  LEMOS     Jamerson Moreira de Lemos nasceu em Recife  (PE), em 22-12-1945 e faleceu recentemente em Teresina (5-8-2008). Poeta,  deixando sua terra, viveu alguns anos em São Luís (MA), onde  certamente se contaminou com a boa poesia daquela Província iluminada, de Gonçalves  Dias a Ferreira Gullar, pra não falar nos mais novos. Tanto é verdade que o seu  primeiro livro foi editado pelo Governo do Maranhão, com a participação da  Academia Maranhense de Letras, no final da década de 60, século XX. Sempre o  parto do primeiro livro é longo, por vários fatores que não cabe aqui explicar.  Não poderia ser diferente com Jamerson Lemos. Saiu com o nome da “Superfície do  Vento”, 1968, seleção de um calhamaço que me mostrara antes, com o título  provisório de “Cerca de Arame”. Depois publicaria ainda “Sábado Árido” (1985) e  “Nos Subúrbios do Ócio” (1996), ambos em Teresina. Deixou muitos  inéditos, entre os quais “Istmo Soledad”, ao qual dei um prefácio já publicado  aqui e alhures, situando sua poesia e seu fazer poético entre os melhores  cultores da poesia-práxis, uma corrente derivada do concretismo, cujos poetas  brasileiros mais conhecidos são Mário Chamie, Armando Freitas Filho, Mauro Gama  e Adailton Medeiros (este natural de Caxias-MA). Esse modo de fazer poesia  valoriza o ato racional de compor e busca um sentido intercomunicante entre  versos e palavras, tudo integrado ao real quotidiano, objetivo, ou seja, o dado  social-histórico vai de braços dados com a poesia e a pesquisa semântica ou  semiológica. Quem mais se celebrizou neste “sertão-vereda” foi o João Cabral de  Melo Neto, pernambucano como Jamerson Lemos. A preocupação maior com  letras, sílabas e palavras do que com o espaço em branco ou preto da página faz  da poesia de Jamerson um antilirismo que a muitos preguiçosos assusta. Mas, se  bem observada, sua poesia é de um apaixonado das coisas belas, dos sentimentos  mais puros e da riqueza na expressão, num estilo que parece desinteressado da  vida e do real, deixando visível a veia do bom humor em todos os poemas. A poesia-práxis é do Brasil dos anos 60. O  CLIP – Circulo Literário Piauiense, movimento daquela década, de  certa forma enquadra bem a poesia deste poeta que entrou para a convivência dos  clipianos. Se do CLIP não fez parte oficialmente, foi por ter chegado ao Piauí  pouco depois. Mas, de tal maneira integrou-se aos criadores do CLIP (Hardi  Filho, Chico Miguel e Herculano Moraes), que seria pecado não incluí-lo nessa  geração cujos efeitos ainda ressoam. (Fragmento de  biografia extraído de http://franciscomigueldemoura.blogspot.com/)         SONETO DA TERÇA   quando você se entristece       uma coisa qualquer se me entrista.  um gole de rum a mais que eu insista  é coisa pouca e você não  esquece.          quando, porém, se nada teça             vida minha e pobre de artista  você me toca e me diz: desista  meu bom amor, amo-te na terça.   muito bem, tento-te de novo  alma de pombo, espírito de corvo,    volvo-me a ti amor em praia,  soluço de sol, sal de caia —                da casa. só a luz e verão.                      (De Sábado árido, 1985)
   
                                    
 A CHUVA
                 entre a ponte e o Vagãoa  noite, o mangue brilham,
 ausentes  caranguejos
 presentes  iluminados
 tarantulam  o rio.
                    entre o sul e o lestearanham o medo e o  espanto.
 torcido o pó, ala
 se um tempo.
 
                                    INSONETAR   
                                  No  rio Parnaibadesce  o ouro
 desce  o ouro
 à  tarde
 às  5 e 5
 brilha  nele sol
 tanto  quanto brilha ao sol
 no  rio Parnaíba:
 se  platinam seixos
 cachos  de acácias
 sexos
 pranteiam  coxas
 arcas  descem
 sol  e ouro
                     CHAPADA  DO CORISCO E SEUS ACLIVES   
                                  I               Teres  ina — Teresina floraveaveflor  momento e movimento
 enigma  dos frutos e da terra
 —  finito instante infinito
                 Vens de longe moçoila gravea  começar de um tempo antigo
 (Portugal  nobreza brazões)
 mas  não tenhas sangue azul
                 II                Vê agora quando o sonoquando  à tarde quando à noite
 quando  à madrugada à manhã
 se  eleva às ervas sangue de antanho
                 Vede o campo verde e sua portaah!  quanto de luz há em ti
 como  tens e cresces só em sol
 e  brilhas no sal do teu banho
                 Assim, descalça e meninapercorrer  teu ventre e o colo
 é-me  a hóstia teu mistério
 e  meu sonho teu ar estranho
                 III               Teresina,  dorme sutil meninaFrágil/forte  moçoila dorme.
 Veste  de vento teus ares,
 esfria-te-me  nesta noite enorme.
 Estica-te-me  os pelos soturnos
 pomares  e luzes disformes.
                 Teresina solene de amores,imensa  tranquila e sombria
 Evocas  menina/moçoila
 retratas  bailes romarias,
 jardins  e bosques e flores.
                 Teresina — solene colores.                          (De Postais da cidade verde, 1989)               Página publicada em  janeiro de 2020
       
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