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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 




ALEX POLARI DE ALVERGA

 

 

(João Pessoa - PB, 1951). Teve publicado seu primeiro livro de poesia, Inventário de Cicatrizes, em 1978. Na época, estava preso; por sua militância política contra o regime militar brasileiro, permaneceu na prisão entre 1971 e 1980. Seu segundo livro, Camarim de Prisioneiro, saiu em 1980. No início dos anos de 1980 passou a fazer parte da comunidade esotérica Santo Daime, no Amazonas. Na poesia de Alex Polari, de tendência contemporânea, se manifestam de maneira forte e direta experiências de cárcere, de tortura.  Para o crítico Carlos Henrique de Escobar, ?Alex político e Alex poeta, como alguns dos seus muitos companheiros em diferentes prisões do país, alguns já libertados, outros exilados, poderão significar toda uma postura e uma produção artística (na poesia, na pintura e no romance) que rompe com os padrões estéreis e reacionários de até então."

Fonte: www.itaucultural.org.br/

 

"A poesia de Alex não se formaliza de fora, não se organiza à margem de suas motivações e propósitos - ela é inseparável do que diz, na forma pela qual se expressa e que é formidavelmente diversa tanto do espírito autoritário e escolar do experimentalismo de direita quanto do populismo altissonante mas insípido dos ´nossos´ poetas editados e reeditados pela máquina editorial e publicitária do reformismo. Fluente em sua forma, imediata em sua captação, lúcida e transparente, a poesia de Alex chega-nos desde os cárceres políticos da Ditadura, das suas salas de tortura, numa linguagem direta, franca e rigorosamente cuidada. É possível hoje retomar a história da nossa poesia, de 22 para cá, e mostrar como suas formas e impasses são dominantemente inseparáveis das formas mesmas que a história política do país vai tomando. Nesse sentido Alex político e Alex poeta, como alguns dos seus muitos companheiros em diferentes prisões do país, alguns já libertados, outros exilados, poderão significar toda uma postura e uma produção artística (na poesia, na pintura e no romance) que rompe com os padrões estéreis e reacionários de até então."

Carlos Henrique de Escobar (1978)

 

“Comprei o Inventário de Cicatrizes na época de seu lançamento para colaborar com o Comitê Brasileiro pela Anistia. Eu havia regressado da Inglaterra sem concluir o meu doutorado (a Capes não me concedeu a bolsa que complementaria a que eu tivera com o British Council, mesmo havendo recebido um prêmio pela dissertação de mestrado...)

porque havia contra mim um dossiê acusando-me de ter escrito poemas anti-militares durante meu auto-exílio na Venezuela anos antes, no início da Ditadura Militar. Estava com um romance no prelo – A Quadratura do Ó – que tinha umas cenas sobre tortura no regime militar... Vi com extrema simpatia a publicação do livro de Alex Polari de Alverga, um preso político, mesmo sem ter qualquer informação sobre sua poesia. Houve uma identificação automática com ele.

 

A leitura da obra foi pura emoção. Independentemente do mérito literário. A confissão de um poeta prisioneiro do regime, relatando torturas e privações, numa linguagem absolutamente sem rebuscamento, sem apelações ideologizantes, até com certo escárnio e humor, era pungente. Estava além da literatura. Assim entendi o prefácio de Carlos Henrique de Escobar que, com certo viés, fazia tabula rasa de toda a poesia brasileira da época – desde modernismo, passando pela Geração 45 e vanguardismos concretizantes de meados do século – e exaltando a obra do poeta no cárcere. Estava ele condenado, depois de torturas humilhantes, a 80 anos de pena. Como não ficar emocionado com aqueles versos crus, irônicos, alguns tão bem construídos como os do poema “Foices”?

 

Reencontro o livro em minha biblioteca da Chácara Irecê e a releitura teve um impacto sem o peso da consciência – o autor já estava em liberdade há cinco lustros -, mais maduro do que nos idos de 70 e com o distanciamento brechtiano necessário para o julgamento da obra. A emoção continuou forte, em parte por ferir os nervos da memória... mas também pela singeleza mordaz dos versos, pelo descarnamento da linguagem, pela tom confessional com certa perquirição e até mesmo um senso crítico que, sendo o poeta jovem e vivenciando sua própria tortura levada à poesia, que resulta surpreendente. Do ponto de vista formal, percebe-se uma certa desigualdade, coisa comum na maioria dos livros de poetas em geral... Um confessionismo às vezes ingênuo, algumas reflexões incipientes mas sempre num conjunto impressionante pelo despojamento de linguagem, por um coloquialismo que dá frescura e autenticidade aos textos, aliviando-os da pieguice e do fanatismo. Cresce na leitura uma figura humana extraordinária, avançada, arejada. Admirável.  É com este espírito e admiração que seleciono os poemas que considero exponenciais no conjunto de sua obra inicial. Infelizmente, não tive (ainda) acesso ao seu livro mais recente para aquilatar o crescimento do autor e para entender seu posterior envolvimento com o Santo Daime.

Antonio Miranda, fevereiro 2007

 

 

AMAR EM APARELHOS

 

Era uma coisa louca

trepar naquele quarto

com a cama. suspensa

por quatro latas

com o fino lençol

todo ele impresso

pelo valor de teu corpo

e a tinta do mimeógrafo.

 

Era uma loucura

se- despedir da coberta

ainda escuro

fazer o café

e a descoberta

de te amar

apesar dos pernilongos

e a consciência

de que a mentira

tem pernas curtas.

 

Não era fácil

fazer o amor

entre tantas metralhadoras

panfletos, bombas

apreensões fatais

e os cinzeiros abarrotados

eternamente com o teu Continental,

preferência nacional.

 

Era tão irracional

gemer de prazer

nas vésperas de nossos crimes

contra a segurança nacional

era duro rimar orgasmo

com guerrilha

e esperar um tiro

na próxima esquina.

 

Era difícil

jurar amor eterno

estando com a cabeça

à prêmio

pois a vida podia terminar

antes do amor.

 

 

NOITES NO PP (Presidio H. Gomes)

 

Estou aqui, pessoal, na C-8

nossa cela de passagem

nesse famigerado

Presídio Hélio Gomes

ex-Pp,

Presídio Policial,

rodeado de faqueiros

bichas, fanchones

guardas e faxinas.

No alto de minha beliche de pedra

leio o semanário Opinião,

autores latino-americanos

e vez ou outra espio a TV.

Porto apenas uma cueca Zorba

fumo incontáveis cigarros

Hollywood

bebo infindáveis canecas

de café Pelé

e em vez de grilhetas,

calço as legítimas sandálias

Havaianas.

Discuto a formação do Partido

os males da monogamia

relembro tiroteios e trepadas

e breve, após o confere,

ainda com as feridas da última visita

na capela,

sonharei com os anjos

pendurados em paus-de-arara

celestes.

 

 

FOICES

 

E fosse o vento

como rajada

fio de foice

rente ao horizonte

cortando espigas e auroras.

E fosse fosco

o vidro que nos separasse

da paisagem

assim semeador

vulto impreciso pelas grades

colher o que?

que fímbria de esperança

que migalhas de posteridade

disputar com os ratos?

 

 

TRILOGIA MACABRA (111 - A Parafernália da Tortura)

 

Nos instrumentos de tortura ainda subsistem, é verdade,

alguns resquícios medievais

 

como cavaletes, palmatórias, chicotes que o moderno design

não conseguiu ainda amenizar

assim como a prepotência, chacotas

cacoetes e sorrisos

que também não mudaram muito.

Mas o restante é funcional

polido metálico

quase austero

algo moderno

com linhas arrojadas

digno de figurar

em um museu do futuro.

 

Portanto,

para o pesar dos velhos carrascos nostálgicos,

não é necessário mais rodas, trações,

fogo lento, azeite fervendo

e outras coisas

mais nojentas e chocantes.

 

Hoje faz-se sofrer a velha dor de sempre

hoje faz-se morrer a velha morte de sempre

com muito maior urbanidade,

sem precisar corar as pessoas bem educadas,

sem proporcionar crises histéricas

nas damas da alta sociedade

sem arrefecer os instintos

desta baixa saciedade.

 

 

ZOOLÓGICO HUMANO

 

o que somos

é algo distante

do que fomos

 

ou pensamos ser.

Veja o mundo:

ele se move

sem nossa interferência

veja a vida:

ela prossegue

sem nossa licença

veja sua amiga:

ela se comove

por outros corpos

que não o seu.

 

Somos simplesmente

o que é mais fácil ser:

lembrança

sentimento fóssil

referência ética

apenas um belo ornamento

para a consciência dos outros.

 

A quem interessar possa:

Estamos abertos à visitação pública

sábados e domingos

das 8 às 17 horas.

 

Favor não jogar amendoim.

 

 

Extraídos de INVENTÁRIO DE CICATRIZES. 3 ed.  São Paulo: Teatro Ruth Escobar; Comitê Brasileiro pela Anistia, 1978.  58 p.



 

 

 
 
 
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