| Retrato realizado por seu filho Lydio Bandeira de Mello em 1956 (detalhe). Fonte: pontocinza.wordpress.com
     LYDIO MACHADO BANDEIRA DE MELLO   (1901-1984)     foi  um jurista (tendo sido professor emérito na UFMG), filósofo e matemático  brasileiro.       HORTA, Anderson Braga.  Do que é feito o poeta.  Brasília,  DF: Thesaurus Editora, 2016.  412 p.  14x21 cm. Arte da capa: Tagore Alegria.  ISBN 978-85-409-0287-9            LYDIO  MACHADO BANDEIRA DE MELLO
 EM BREVES TRAÇOS
 por ANDERSON BRAGA HORTA   ALLA – Academia  Leopoldinense de Letras e Artes, em 31 de maio de 2013.
   Leopoldina  tem sido, pelo menos desde os inícios do século XX, uma referência cultural no  Estado de Minas. Não apenas pelo fato de ter na cidade vivido os seus momentos  finais o grande poeta Augusto dos Anjos, ou de ter ilustrado os bancos do seu  Ginásio o notável poeta e prosador português Adolfo Correia da Rocha,  imortalizado sob o nome literário de Miguel Torga. Ao tempo em que o jovem  poeta Anderson de Araújo Horta iniciava os estudos secundários no então Ginásio  Municipal Leopoldinense, havia já doze anos que em suas classes brilhava, por  exemplo, o grande Professor Joaquim Guedes Machado. Vindo de Portugal com o  curso de engenharia, e depois de se formar em direito em Niterói, atuar como  engenheiro numa usina de Tombos (terra de meu Pai), tornar-se proprietário e  diretor do Ginásio Carangolense e fundar a Escola Normal, na cidade em que  nasci, Machado era já famoso pelo temperamento e pela inteligência, postos a  serviço da Matemática, disciplina que sempre lecionou e que o tornaria um  mestre legendário, na expressão do escritor José do Carmo. Em 1950, quando me  matriculei no Colégio Leopoldinense, para cursar o Clássico, tive ainda a  fortuna de conhecê-lo e de ser seu aluno.    Ao  lado de Machado outros educadores ilustres circulavam, como o francês Rodolphe  Gibrat, seu amigo, Oiliam José, secretário perpétuo da Academia Mineira de  Letras, Hamil Adum, de saudosa memória, e ainda outros que relembro em “Poeta e  Mestre de Poesia”, prefácio aos poemas de Para Elza, de meu inesquecível  professor de Português, Química e História Natural, Geraldo de Vasconcellos  Barcellos, excelente guia nos caminhos iniciais de minha poesia. (Não posso  deixar de assinalar que a edição desse livro nasceu de uma conspiração de que  foram protagonistas, entre outros, nosso sempre recordado Deodato Rivera e seu  irmão, José Jeronymo Rivera, este amigo fraterno que ora generosamente me  recebe.)   Entre  esses educadores, o Professor Lydio Machado Bandeira de Mello.  Lydio  era uma figura singular. De modesta estatura, meio atarracado, causava a  impressão de homem solitário, pouco sociável, inteiramente dedicado a seus  altos estudos. Viamo-lo dirigindo-se ao Colégio ou dele saindo, adernado ao  peso de volumosa pasta, caminhando ao som de uma banda presente ou imaginária,  em marcha comandada pelo ritmo imperativo de um dobrado às vezes inaudível para  nós outros. Em sala, dava com gravidade a sua aula, que acompanhávamos com  atenção. Sabíamos que era autor de muitos livros. A mim, particularmente,  fascinava o título de um deles, Prova Matemática da Existência de Deus.  Falando, encantava-nos com coisas misteriosas, como as raias de hidrogênio que  reteriam, gravada in æternum, toda a  história do Cosmo. Até hoje não sei em que regiões da Física, da Química e da  Cosmologia ficam essas raias... Mas encontro-lhes correspondência nos registros  acásicos – palavra não dicionarizada, encontrável em textos esotéricos,  dizendo-se akásico, ou akáshico, na definição mais lata, o registro de tudo o  que acontece.   Lembro-me  bem de evaporar-se a aparência de pouca sociabilidade, certo dia, quando um  sorridente Lydio reuniu, fora de classe, pequeno grupo de rapazes e moças  interessados em poesia para a leitura de poemas próprios. Fomos ao encontro  compenetrados, levando nossos melhores poemas para a crítica do mestre. Ele  ouviu, complacente, e ao final nos passou um “pito”: esperava que nós, poetas  adolescentes, lhe levássemos poemas de amor, e nós nos esmerávamos na  apresentação de poemas sérios, pretensamente profundos... A partir daí a  tertúlia se desenrolou mais descontraída.  Também  me lembra ouvi-lo dizer um de seus poemas, em alexandrinos, mas não lhe gravei  nem um verso. Mais tarde, já poeta publicado, retomei contacto com ele,  mandei-lhe livros. Recebi alguns dos dele, em retribuição. Impressos em letra  de fôrma ou caprichosamente manuscritos e multicopiados. Desse reencontro  epistolar guardo carinhosamente a documentação. Nenhum livro de poesia, entre  os ofertados; mas numa de suas cartas encontro alguns versos. Dr. Lydio  manifesta preocupação com a descrença que julga perpassar os meus Exercícios de  Homem; e alegra-se com este verso: “para nós O Absoluto é a nossa ânsia dele”,  do poema “Que não Somos Deuses”. Diz, a propósito: “A esta ânsia, eu chamo  TEOTROPISMO. Explico-a como sendo a marca, o MADE BY GOD que DEUS consubstancia  em suas criaturas.” E oferece-me à meditação dez versos exemplares de um de  seus sonetos:     DEUS é a Realidade  preexistente QUE condiciona a  Possibilidade. Não ser visto por nós  ELE consente para nos não tolher a  liberdade.   Dá-nos um símile o  estendal sidéreo: para que o céu floresça  em luz de estrelas, deve ocultar-se o sol no  outro hemisfério.   Irmão, convém  refletirmos com calma: É por amor de ti que  DEUS SE vela: para que sejas dono da  tu’alma!     Nascido  na cidade mineira de Abaeté, em 19 de julho de 1901, viveu 83 anos devotados ao  magistério, ao direito e à glória de Deus. Dos 70 livros que escreveu, 44 estão  “publicados e espalhados por 800 universidades do mundo”. Versam sobre direito  penal, filosofia, filosofia do direito, teologia, etc. A matemática e a  metafísica tonificam toda a sua obra. Em seu blog, José do Carmo Rodrigues  fornece dados importantes acerca de sua vida e seus trabalhos. Tendo uma feita  inquirido o magistrado Augusto Vieira acerca de seu extraordinário vulto,  obteve o seguinte depoimento:   O  mestre Lydio foi um gênio. Bondoso, extremamente estudioso, suas obras de  direito penal deveriam estar permanentemente na cabeceira de qualquer operador  do direito. .... Suas aulas eram magistrais. Gostava de música e recebia-nos em  sua casa com o maior carinho, nas nossas serenatas. Sob aquele manto de homem  durão, vivia uma alma cândida, doce e amante da vida. Há muita polêmica em  torno dele, mas isso acontece em relação a qualquer figura genial.    Lydio  Machado Bandeira de Mello foi um dos seis ou sete mestres mais altamente dignos  dessa denominação que encontrei em meu curso de humanidades. Desses que deixam  marcas luminosas em nosso caráter. É uma honra vincular-me à Academia  Leopoldinense de Letras e Artes, como sócio correspondente, sob o signo de seu  nome.       Página publicada em  julho de 2016 
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