POESIA  GOIANA 
                      Coordenação de Salomão Sousa 
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                    SÔNIA MARIA SANTOS 
                      
                    Nasceu na cidade de  Anápolis (GO) a 12 de julho de 1945. Pertence à UBE-Goiás. Figura na antologia  Goiás-Meio Século de Poesia, de Gabriel Nascente; em Feitio de Goiás, de Stella  Leonardos; no Dicionário do Escritor Goiano, de José Mendonça Teles; no livro A  Consciência da Palavra, (Ensaios) de José Luiz Bittencourt; na Antologia  Poética 2005- UBE-Goiás; no Dicionário Bibliográfico de Goiás, de Mário Ribeiro  Martins: e ainda, no Dicionário Crítico de Escritoras Brasileiras, de Nelly  Novaes Coelho. 
                    BIBLIOGRAFIA: A teia dos dias (Goiânia: UCG, 1985), Casa do Tempo (Goiânia: Kelps, 1995), Mar Invisível (Goiânia: Kelps, 2000) e Todas as Fábulas (Goiânia: Kelps, 2006).  Por este último, recebeu o prêmio nacional, ano 2007, “Francisco da Silva  Nobre”, da União Brasileira de Escritores do Rio de Janeiro. Ainda, no dia l7  de dezembro de 2007, o Prêmio Colemar Natal e Silva, conferido pela Academia  Goiana de Letras. 
                    Fonte do material: site da autora: soniamariasantos 
                      
                    DESDE QUE O MUNDO É MUNDO 
                      
                    Tudo  é medula, sangue: 
                    humana  veste, 
                    (e  tudo é alma) 
                    desde  Adão e Eva 
                                            e a serpente; 
                    e  a Esfinge, que de repente 
                    ainda  me suplica: 
                    Decifra-me. 
                      
                    Desde  que o mundo é mundo 
                    e  o mar é sem fim. 
                      
                      
                    E AINDA CANTO  
                    Vivo  o dia: 
                    o  de hoje, o de sempre 
                    —  admirada — 
                    de  ter mudado tanto 
                    e  de não ter mudado nada; 
                      
                    de  deixar fluir o canto 
                    como  se numa carta; 
                      
                    e  a esperança, 
                    a  quase impossível, 
                    como  se fosse água. 
                      
                      
                    COM O MESMO OURO  
                    Com  o poema de Borges, 
                    com  o mesmo ouro 
                    com  que dotou os tigres, 
                    as  tardes, os desejos, 
                    a  alma que tenho 
                    é  para sempre tocada. 
                    Como  se me assombrassem 
                    suas  palavras, 
                    como  se antes, seqüestrada, 
                    ausentasse-me  da árvore, 
                    da  pedra, da manhã, do rio. 
                      
                    SINALIZAÇÃO  
                    Não  há palavra 
                    mas  é como se houvesse. 
                      
                    Tantos  braços 
                    tantos  passos 
                      
                    tanto  caminho pisado 
                    monotonia  de setas. 
                      
                    Ainda  não cheguei a nenhum lugar. 
                    Só  um areal imenso 
                    sob  os pés feridos. 
                      
                    Chegaram  os homens 
                    as  mulheres e crianças 
                    o  tempo de olhar o mundo 
                    e  de sentir os seus sentidos. 
                      
                    Preciso  chegar 
                    aos  meus declives perdidos. 
                      
                      
                      
                      
                    A  VOZ INQUIETA LATEJA,  
                    pretende luz clara, água rasa,  
                    a manhã acesa — 
                    o arbusto venerável atrás da casa,  
                    tudo o que vive e semeia. 
                      
                    No andor de um tempo antigo  
                    ainda a nossa existência,  
                    estandartes, cruzes,  
                    ciladas, adagas, um olho cego. 
                      
                    Pouco ou nada, 
                    o que perece ou fica, a alma lava. 
                    Faz séculos. 
                      
                      
                    ESCREVO,   
                    preparo a "rosa inútil",  
                    sem fechar os olhos 
                              a  pretexto de quem reza  
                    nem lavar as mãos 
                              à  moda de Pilatos; 
                      
                    Sem perder-me,  
                    com meus sapatos  
                              exaustos 
                       de antigos chãos. 
                      
                      
                    AS  PALAVRAS  
                    fiam-se a si mesmas.  
                    Fico de olho apenas  
                    no desenrolar da fábula. 
                      
                    No fio invisível 
                    no seu silêncio 
                    na roda que trabalha o dia 
                    e engole a noite primordial. 
                      
                    — Eternas, polidas, puro ritmo: 
                    espadas    
                                  prontamente erguidas 
                                                                   ou buquê de lírios. 
                     
                      
                                 
                    
                    SANTOS, Sônia Maria.  Lúcida  chama.  Goiânia, GO: Kelps,  2015.  141 p.  141 p.   ISBN 978-85-400-1217-2 Prefácio: “Poesia (in)quieta”, por José Fernandes   “ Sônia Maria Santos “  Ex. bibl. Antonio Miranda 
                      
                    AVES  E FRUTOS   
                    fontes e pedras  
                    são sinais de porto. 
                      
                    Sei aos poucos,  
                    não sabendo muito  
                    e sabendo torto. 
                      
                    Ou não sabendo nunca. 
                      
                    Um dia aprendo,  
                    dizem os ventos,  
                    cores, aromas  
                    em prolongado sonho  
                    no firmamento. 
                      
                      
                      
                    Extraído de  
                      
                    
                    POESIA  SEMPRE.  Número  31 –  Ano 15 / 2009.  Rio de Janeiro: Fundação  Biblioteca Nacional, Ministério da Cultura. 2009.  217 p.     ilus. col. Editor Marco Lucchesi.   Ex. bibl. Antonio Miranda  
                      
                                    Uma lâmpada 
                      
                      
                    Rilke 
                    quando  canta  
                      dá-me uma lâmpada  
                     leva-me  
                      por entre pétalas 
           e  folhas tremulas; 
                      
                    por  estrelas 
                    silenciosas 
                    pequenas. 
                      
                    Nada  mais santo. 
                      
                      
                      
                    Trevos sem parar 
                      
                    Jardim  não é lugar parado,  
                      mas revolucionário:  
                      trevos sem parar. 
                      Pétalas, cores, alvuras; 
                      borboletas 
           sedas 
           cigarras,  
                      uma partitura.  
                      Delírio enfim. 
                      
                    —  De vez em quando finjo  
                      cuidar do meu jardim. 
                      
                      
                      
                    O lírio, o pêssego 
                      
                    Surpreendem-me 
                    pétalas e  frutos 
                    no seu halo  de beleza. 
                      
                    O lírio,  simples e puro;  
                      o pêssego, o contorno 
                          o aveludado 
                    coração  ileso 
              não trespassado      
              de humana vida. 
                      
                      
                      
                    
                      
BRITO,  Elizabeth Caldeira, org.  Sublimes linguagens.  Goiânia, GO: Kelps, 2015.   244 p.   21,5x32 cm.  Capa e sobrecapa.  Projeto gráfico e capa: Victor Marques.   ISBN 978-85-400-1248-6 BRITO, Elizabeth Caldeira, org.  Sublimes linguagens.  Goiânia, GO: Kelps, 2015.   244 p.   21,5x32 cm.  Capa e sobrecapa.  Projeto gráfico e capa: Victor Marques.   ISBN 978-85-400-1248-6 
Ex. bibl.  Antonio Miranda 
  
  
  
         CÓSMICA 
   
  Uma voz me dizia:  Deus vê todas as coisas. 
    E  Deus me via em secretíssimos temores. 
    Até  hoje me vê 
    e  me cobre de conforto. 
   
    A  minha mãe deu sabedoria, 
    rimas  perfeitíssimas para rimar com a dor. 
   
    Ela  que já foi sabia, como um poeta, 
    tinha  que ser universal. 
  
  
       SEJA A POESIA 
   
  Seja  a poesia, 
  nas  dobras onde pousa, 
  a  mais funda explicação; 
   
  e  a mais simples, penso, 
  se  na mais antiga aldeia 
  ainda  me vejo: 
   
  alma  suspensa, 
  apenas  um fio, um corte, 
  algo  feliz, ardente, 
  onde 
  indiferente 
  já não se morre. 
   
   
   
  APRONTANDO ESPUMAS 
   
  A  poesia vem de seixos e lenhas, 
  de  metais de qualquer estrela. 
  Inevitável 
  (como  o surgir de um broto na primavera) 
  vem  com brancas velas 
  aprontando  espumas 
  e  algum Ilíada. 
 
   
   
  MATÉRIA DA ALMA 
   
    Danço  ainda com uma flor na boca 
  a  esperança toda numa valsa. 
   
  Da  alma, a matéria o tempo não gasta: 
  prossegue,  amante, peregrina; 
   
  entre  a alegria e o assombro 
  das  horas repetidas; 
  entre  a luz que chega e cega 
  e  da que suavemente pousa na retina. 
   
   
   
  DECIDIDAMENTE 
   
    Surpreendo-me  louca, 
  mais  do que preciso 
  para  ver direito. 
   
  Acho  que é o tempo 
  com  sua assinatura ácida. 
   
  Ou  a vida que desenha 
  de  forma tão imensa 
  cada  réstia 
  (im)possível  de se olhar. 
  
  
  
       NATURALMENTE 
   
  Tudo  nos invade 
  Por  toda a vida, como 
  uma  hélice invisível 
  no  rompido corpo. 
   
  E  todo o perfil nos toca 
  de  dor, e todo o sonhos; 
  doendo  naturalmente 
  doendo  aos poucos; 
   
  na  voz de dentro 
  por  onde 
   
  nos  abismamos todos. 
   
   
 
       COM O MESMO OURO 
   
  Com  o poema de Borges, 
  com  o mesmo ouro 
         com que dotou os tigres, 
  as  tardes, os desejos, 
  a  alma que tenho 
  ้  para sempre tocada. 
  Como  se me assombrassem 
  suas  palavras, 
  como  se antes, sequestrada, 
  ausentasse-me  da árvore, 
  da  pedra, da manhã, do rio. 
   
   
   
  PURIFICAÇÃO 
   
    Os  tecidos da alma branqueiam-se no tempo: 
  pedra  de quarar que Deus nos concede. 
 
       ษ  como se tudo sobre o nosso corpo 
  que chamam sagrado 
  tivesse de doer; 
  
       at้  merecer, como nossos pais, em seus len็๓is, 
  o  branco derradeiro. 
   
   
   
  NUNCA E SEMPRE 
   
    Nunca  é o mesmo vento 
  que  estremece um sino. 
  Mas  outro vento vindo. 
   
  E  não serei a mesma nunca 
  entre  o joio e o trigo: 
  meu  próprio suprimento, 
   
  Sempre  é um moinho 
  moendo  o mesmo assombro 
  onde  existo.     
    
  
* 
  
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Página  publicada em junho de 2021 
  
                  Página  publicada em janeiro de 2010. Ampliada e republicada em junho de 2015. Página ampliada e republicada em outubro de 2018.                                          |