POESIA GOIANA 
                
                  Coordenação de SALOMÃO SOUSA 
                 
                   
                
                  
                MARCOS  CAIADO 
                  
                  
                Na edição de 21 a 26 de maio de 2006, o Jornal Opção assim apresenta Marcos  Caiado:  
                  
                “Representante da nova geração de  poetas, de 40 anos, mantém alma de um menino prodígio e só pensa mesmo naquilo:  em arte, no sentido mais amplo e irrestrito do pensamento. O moço exercita com  garra sua própria história, revoluciona por romper com antigas estruturas e segura  a onda. Ele é escritor, roteirista, artista plástico, publicitário, marchand e  compositor musical. Dono de  inteligência ímpar, senso de humor ácido e texto idem, Marcos tem a rara  capacidade de transformar situações do dia-a-dia em poesia.“ 
                  
                O grupo teatral Cia Teatral in Cena informa em sua página  que a peça 'Melodrama' estreou no ano de 2005 e foi apresentada no Festival de  Teatro de Curitiba, um dos maiores festivais da América Latina, e também foi  mostrada no IV TENPO, na Casa de Teatro e Circo (em Campo Grande), no Jump  Dance Club (em Goiânia), no Café Filosófico (em Pirenópolis), no Festival de  Poesia Encenada (evento realizado pela Federação de Teatro do Estado de Goiás,  FETEG, e que entregou os prêmios de melhor direção, ator, figurino, poesia inédia  e poesia encenada ao espetáculo), no Centro Municipal de Cultura Goiânia Ouro  (durante a programação de inauguração do espaço), no Teatro Goiânia e nas  cidades de Goianésia, Ceres e Anápolis. 
                  
                Convidado para a  curadoria do Goiânia em Cena 2006, assisti ao vídeo com os textos e performance  de Marcos Caiado. Não foi difícil convencer os outros membros da comissão de  seleção, e aprovamos a proposta do jovem poeta com entusiasmo. Um talento. Antonio Miranda  
                  
                Bibliografia: M.M.C, 1996; Segundo Primeiro, 2000; Mais  Um; e Só; Um poeta faz a festa, peça  teatral apresentada em Goiânia e São Paulo em 1995/96;  Melodrama,  peça apresentada em 2005. 
                  
                 
                Bibliografia:  M.M.C, 1996; Segundo Primeiro, 2000; Mais Um; e Só; Um poeta na fresta, peça teatral apresentada em  Goiânia e São Paulo em 1995/96;  Melodrama, peça apresentada em 2005. 
                   
                 
                Veja  outros textos do autor em: www.marcoscaiado.blogger.com.br  
                  
                   
                 
                 1  
                  
                por fora,  
                  trago o sabor  
                  da amora;  
   
                  por dentro,  
                  uma saudade  
                  que devora.  
   
                  por fora,  
                  comemoro  
                  a vida;  
   
                  por dentro,  
                  sou veia cava  
                  obstruída.  
   
                  por fora,  
                  um banquete  
                  sobre a mesa;  
   
                  por dentro,  
                  essa dinamite  
                  acesa.  
   
  morreu o cravo,  
    sonhando  
    a margarida.  
   
    pelo próprio espinho,  
    se fez a rosa,  
    ferida.  
   
                  por fora,  
                  a poesia move;  
   
                  por dentro,  
                  o verso suicida. 
                   
                  
                  
                 2  
                  
                  
                nada a declarar.  
                  a não ser que estou cansado e sem escudos.  
                  que depois que você foi embora, os deuses ficaram mudos.  
                  que as borboletas voaram pra outros mundos  
                  e eu fiquei só.  
                  só eu e os meus cadernos,  
  à mercê dos mais profundos invernos...  
   
                  nada a declarar:  
                  a não ser que eu estou cansado e sem horizontes.  
                  que depois da sua partida,  
                  os amigos se debandaram aos montes  
                  dizendo o quanto fiquei chato e intragável.  
                  e quando até o automóvel se nega a dar partida,  
                  repito comigo mesmo: coisas da vida... vai passar!  
                  a droga, é que nunca passa.  
                  o foda, é que tudo perdeu a graça.  
                  (vale acrescentar!)  
   
                  vale acrescentar  
                  que, cada vez que bato à porta da alegria,  
                  ela grita de longe: passa outro dia!  
                  tá tudo muito escuro.  
                  sequer o futuro acredita num claro despertar...  
                  ficamos então combinados:  
                  vou dormir com mais este maço de desagravos  
                  e se por acaso acordar do meio deste pesadelo,  
                  peço desculpas a ele.  
                  viro de lado e digo: coisas da vida, amigo...  
                  pode continuar! 
                   
                  
                  
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                 l  
                       
                  não há ninguém no jardim  
                  não há luar, nem jasmins:  
                  jardins não há também.  
   
                  sumiram todos os ventos (e ventres),  
                  e os rabiscos da vida, e a taça do vinho.  
                  não há caminho:  
   
                  - tu, por onde vens?!  
                 
                  
                ll  
                       
                  dardos cegam o peloponeso  
                  dardos rumo a mim mesmo.  
   
                  enquanto a figueira balança, última,  
                  a esmo.  
   
                  ...foi no estalo de um beijo  
                  que deus ceifou cada endereço.  
   
    
                lll  
                       
                  não nos reconheço nas fotos  
  éramos felizes, ou mortos? 
                  
                  
                4  
                  
                com este segue  
                  um buquê de flores mortas  
   
                  e as chaves que fecham  
                  todas as portas.  
                 
                  nossas tramas de amor  
                  bagagem perdida.  
   
                  não pedirei reembolso  
   
                  nem à vasp  
                  nem à vida.  
                 
                  a lua que líamos no lago,  
                  o boi bebeu...  
                  
                  
                5  
                  
                te amo música antiga  
                  velha roupa colorida  
                  te amo  
                  bem maior que a vida  
   
   
                  ***  
   
                  eu te amo  
                  paralelepípedo  
                  inconstitucionalíssimamente  
   
                  te amo igual a tanta gente  
                  que mal sabe que ama  
                  assim tão diferente  
   
                  oma et ue  
                  ed  
                  sárt  
                  arp  
                  etnerf  
   
   
   
                  ***  
   
                  de dentro pra fora  
                  te amo e te reamo  
                  de dentro pra frente  
   
                  te amo ausente  
                  presente  
                  menos aqui e mais adiante  
   
                  te amo olho no olho  
                  te amo caolho  
                  te amo sem olho  
   
   
                  te amo miopia:  
                  lua noiva de dia  
                  (astigmatismo)  
   
                  te amo budismo,  
                  aula de catecismo  
                  e além do que cismo  
   
                  te amadoro pra sempre  
                  ou de repente só agora  
                  como quem mente  
   
   
  6 
                  
                 você roubou  
                  os meus salvo-condutos,  
   
                  os meus lábios sujos  
                  e minha ausência de parafusos...  
   
                  roubou-me inúmeras dúzias  
                  de preciosos 50 minutos.  
   
                  abraços dementes, idades, idéias  
                  e eus confusos.  
   
                  você roubou a arquitetura  
                  do meu educandário,  
   
                  a margarida da praça, a praça,  
                  e o relógio do rosário.  
   
                  relegou meu abecedário  
                  ao molho,  
   
                  furou cada um  
                  dos meus quase cem olhos:  
   
   
                  - você me deixou!  
                  
                  
                7  
                  
                morri naquele meio de tarde. alheio ao carnaval que corria.  
                  morri de beijo perdido.  
                  e nunca mais voltei...  
                  passo agora, horas a fio, tecendo grafias em queixumes de vento.  
                  morri sem avisar.  
                  enquanto vestia minha fantasia de rendas em frente ao mar...  
   
   
                  a alguém fiquei devendo um lírio branco.  
                  não sei se pago.  
                  amanhã, mais uma vez, em nome de iemanjá,  
                  volto a ser este mesmo dia:  
                  mãos frias de indiferença e sopro breve de andorinha triste.  
   
                  morri, enquanto morria. 
                   
                  
                  
                Extraído de 
                  
                  
                
                POESIA  SEMPRE.  Número  31 –  Ano 15 / 2009.  Rio de Janeiro: Fundação  Biblioteca Nacional, Ministério da Cultura. 2009.  217 p.     ilus. col. Editor Marco Lucchesi.   Ex. bibl. Antonio Miranda  
                  
                                1  
                se  penso em você ao meio-dia 
                um  segundo depois são onze e vinte da noite. 
                tudo  escurece: o mote, o norte, os montes e a luz do poste. 
                morre  o vaga-lume, some o horizonte. 
                  
                quando  penso em você, independentemente da hora, 
                o  relógio agoniza, a lua suicida, a poesia adoece     
                só  a tristeza roça além do que não pode.  
                  quando penso em você. 
                  
                quando  penso em você, 
                  a literatura se fode  
                  e, quase, vira zero: 
                —  zero vírgula, este verso que não morde. 
                  
                  
                2 
                  
                este poema 
                não é um  poema. 
                  
                este poema 
                é um pano de  prato 
                pronto 
                pra ser  bordado  
                  em ponto - 
                  cruz 
                e ponto  final. 
                  
                este poema 
                não é um  poema: 
                é o trejeito 
                -  insatisfeito - 
                de um canto  mero; 
                pranto 
                sussurrado  no limbo.  
                 
                  este poema não é um poema,  
                  é um cachimbo.  
                  
                  
                  
                3 
                  
                em tua direção marcha  
                  o meu prazer 
                  
                em teus flancos mora  
                  a minha libido 
                  
                mas 
                morro de ciúmes 
                  
                se me trais  
                  com teu marido 
                  
  
                                   |