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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


SOSÍGENES COSTA

(1901 – 1968)  

 

Natural de Belmonte (BA), onde nasceu em 11 de novembro de 1901, mas passou a morar em Ilhéus (BA) a partir de 1923. Faleceu no Rio de Janeiro em 5 de novembro de 1968. Foi redator do Diário da Tarde e secretário da Associação Comercial, e aposentou-se em 1954 como telegrafista do antigo DCT (Departamento de Correios e Telégrafos). Seus versos começaram a aparecer a partir de 1922 em revista e jornais, e devido à sua paixão pela literatura ingressou na Academia dos Rebeldes (grupo modernista liderado por Pinheiro Viégas) composta por Alves Ribeiro, Clovis Amorim, Dias da Costa, Da Costa Andrade, Jorge Amado dentre outros que tinham o desejo de mudar a literatura baiana juntamente com os grupos de Samba e Arco & Flexa. O seu livro Obra Poética saiu em 1959 pela editora Leitura, mas a sua obra só seria bem dimensionada em 1978, com os esforços de José Paulo Paes em editá-la de forma integral. O poema Iararana, escrito em 1933, mereceu edição especial em 1979, com ilustrações de Aldemir Martins. Trata-se de obra peculiar pela forma como vê a colonização e a descoberta do cacau. É um poema mitológico de riqueza peculiaríssima. Seu soneto O pavão vermelho, que é usado por Massaud Moysés para ilustrar seu livro sobre a Poesia, não pode ficar de fora de nenhuma antologia da poesia brasileira que se queira representativa. Em 2001, a sua produção poética foi reunida num volume único, Poesia Completa, publicado pelo Conselho Estadual de Cultura da Bahia.

 

O poeta grapiúna legou-nos uma obra poética que ainda hoje perturba e se impõe pelo arrojo com que soube criar o seu verbo próprio e inconfundível. É ele a história de uma alma que sofria por coisas estranhas e requintadas, sobretudo pela tão estranha sensibilidade, só poderia dar-nos versos estranhos e, antes de tudo, impressionantemente belos.   Gilfrancisco

 

 

[Página preparada por Salomão Sousa]


O pavão vermelho

Ora, a alegria, este pavão vermelho,
está morando em meu quintal agora.
Vem pousar como um sol em meu joelho
quando é estridente em meu quintal a aurora.

Clarim de lacre, este pavão vermelho
sobrepuja os pavões que estão lá fora.
É uma festa de púrpura. E o assemelho
a uma chama do lábaro da aurora.

É o próprio doge a se mirar no espelho.
E a cor vermelha chega a ser sonora
neste pavão pomposo e de chavelho.

Pavões lilases possuí outrora.
Depois que amei este pavão vermelho,
os meus outros pavões foram-se embora.

 

 

DUAS FESTAS NO MAR

 

Uma sereia encontrou
um livro de Freud no mar.
Ficou sabendo de coisas
que o rei do mar nem sonhava.

Quando a sereia leu Freud
sobre uma estrela do mar,
tirou o pano de prata
que usava para esconder
a sua cauda de peixe.

E o mar então deu uma festa.

E no outro dia a sereia

achou um livro de Marx

dentro de um búzio do mar.

Quando a sereia leu Marx

ficou sabendo de coisas

que o rei do mar nem sonhava

nem a rainha do mar.

Tirou então a coroa

que usava para dizer

que não era igual aos peixinhos.
Quebrou na pedra a coroa.

E houve outra festa no mar.

 

 

O pôr-de-sol do papagaio

O papa-vento nos jardins de maio
e o verde no seu mar de leite.
O mar já não é azul, é verde-gaio
num clarão que é relâmpago de azeite.

Se o mar é belo sem que a tarde o enfeite
quanto mais se o enfeitar o sol de maio.
O mar do papa-vento é o papagaio
e o céu do verde papa é o papa-leite.

Latadas cristalinas em desmaio.
Tombam flores do céu, meu papagaio.
E o papa-vento é de cristal e leite.

Deite leite, meu mar, pro papagaio.
Que o papagaio em verde se deleite
e não se enfeite de outra cor em maio.

 

 

A Cabeleira da Musa

No oceano de tua cabeleira entrevejo
um porto cheio de homens vigorosos de
todos os países... e navios de todas as formas.
Baudelaire

No teu cabelo há tardes outonais
amarelando o rio e os arvoredos.
Há cidades de mármores e rochedos
de açúcar-candi, bronzes e cristais.

No teu cabelo rútilo há milhões
de abelhas roxas fabricando favos
para o mel que roubam dos craveiros bravos
dos jardins levantinos de anões.

No teu cabelo há trêmulos trigais
de espigas fulvas e há gentis vinhedos
que molhas de perfume com teus dedos
com trinta anéis de pérola ovais.

No teu cabelo se abrem dos pavões
as estreladas caudas, dentre as rosas.
E brilham nela as pedras preciosas:
rubis, safiras, sárdios, cabuchões.

Nele há brondões, revérberos, fanais.
Pois isso atrai cornígeros besouros.
Por isso pombas e canários louros,
sempre de noite, feiticeira atrai.

No teu cabelo há reinos de sultões.
Teu cabelo relumbra como uns matos
cheio de olhos fosfóricos de gatos
e de escamas de fogo dos dragões.

Na tua cabeleira há catedrais.
No teu cabelo rola e ferve estranha
cascata de falerno e de champanha
por entre alabastrinos jasminais.

No teu cabelo vive uma serpente
que descasca por hora uma imponente
pele conteúdo bíblica signais.

No teu divino e esplêndido cabelo
rugem tigres de azul-celeste pêlo
e de unhas de ouro, lúcidas, fatais.

No teu cabelo. Musa Helena e saiba,
queimam-se incenso e nardo azul da Arábia
e outras sortes e espécies aromais.

No teu cabelo há um céu com muitas luas
iluminando cem mulheres nuas
que se banham num lago entre juncais.

No teu cabelo há sílfides e bruxos
dançando dentro dos jorros de repuxos
e há templos de âmbar louro e há muito mais:

Há globos de ouro e estames de açucenas
e cem faisões de prateadas penas,
- Filha do sol, princesa dos corais!

 

 

 

De
Sosígenes Costa
Iararana
Introdução, apuração do texto e glossário por José Paulo Paes.
Apresentação de Jorge Amado. Ilustrações de Aldemir Martins
São Paulo:  Editora Cultrix, 1979.  115 p.  ilus. p&b  formato 32x23 cm
Exemplar numerado   0107

 

 

De Iararana:

 

Esse bicho da Oropa tinha parte com o diabo.
Esse bicho da Oropa foi o diabo neste rio
............................................................................
Ele fez guerra com espingarda aos cabocos do mato
............................................................................
tinha corpo de cavalo e andava de quatro pés

......................................................................

Mas ele dava na gente de taca e facão
e ensinou a gente a tirar broto de cacau
e o cacau desbrotado ficou parrudo
e bonitão como danado.

 

 

(Roda)

 

E o cacau foi chamado o alimento do céu,

a baba-de-moça comida na lua.

E o cacau ficou na coroa da lua,

e os meninos fizeram a roda na rua,

pedindo à lua manjar do céu.

 

         Carinha de anjo,

         moça do céu,

         bença, dindinha,

         me dê chá do céu,

         me dê chocolate,

         me dê bombom,

         baba de lua

         com manuê.

 

         Chá de santinho

         me dê me dê,

         café de anjo

         me dê me dê.

 

Dindinha, lua,

carinha de anjo,

me dê chá da lua

mais uma broa

pra meu pintinho

que saiu do ovo

que pinta pôs,

vestido de pelo

como um morcego,

feito uma poncã

de pó-de-arroz.

 

Me dê chocolate,

me dê bombom,

a teobroma

de seu Linneu.

 

A lua batiza

menino que nasce

depois que o cavalo

andou na lua

botando aquilo

que faz bombom.

 

         E o retrato do cavalo ficou na lua

         e ainda se vê o bichão na lua

         que está redonda como um botão.

         Não é S. Jorge que está na lua.

         Quem está na lua é aquele bichão.

 

 

 

 

Vocabulário (compilado por José Paulo Paes)

 

DINDINHA: s.f., bras. Diminutivo carinhoso de “madrinha”.

MANUÊ:  s.m, bras. O mesmo que manuauê, bolo de fub[a preparado com mel e outros ingredientes.

PONÇA: s.f. Esponja para aplicação de pó-de-arroz, feita de penugem de pato.

TEOBROMA: nome latino que designa o gênero botânico do cacau; o étimo grego que significa “manjar dos deuses”.]

 

 

 PAES, José Paulo.  Pavão, parlenda, paraíso: uma tentativa de descrição crítitca da poesia de Sosígenes Costa.  São Paulo, SP: Editora Cultrix, 1978.  119 p.   13,5x19,5 cm.    “Em ocnmvênio com o Clube Grapiúna do Livro, do Projeto de Atividades Culturais Cacau (Pacce), Itabuna”.  “ José Paulo Paes “  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

“Estou certo de que algum dia a literatura brasileira há de ficar devendo a Sosígenes Costa um desses certificados de vitalidade que só um grande poeta esquecido, quando criticamente reabilitado, pode passar-lhe.  Morto em 1968, com um único livro publicado, não se pode dizer, a rigor, que ficasse de todo esquecido. Poemas seus aparecem numa ou noutra antologia; pelo menos uma história literária inclui-lhe o nome entre os pouco conhecidos poetas do grupo modernista baiano; no lançamento da Obra Poética, alguns tímidos artigos fizeram-lhe o registro na imprensa; amigos da Bahia cuidaram de divulgar-lhe os versos em jornais e revistas, sempre que possível. Mas essa mesquinha repercussão está longe de corresponder à importância de Sosígenes Costa, que não será exagero incluir entre os principais poetas do nosso Modernismo.”  JOSÉ PAULO PAES  

 

 

 

A CANÇÃO DO MENINO DO EGITO

 

QUANDO surgir o sol no mar dos crocodilos,

irei caçar os grous com setas de açafrão.

E, assim que o pôr-do-sol ornar-me de berilos,

voltarei ao país das flores do lodão.

 

Enquanto eu caço os grous e os pássaros tranquilos,

tu ficas nos jardins, beijando o meu pavão.

Só voltarei de tarde, ornado de berilos,

voando pelo mar, montado num dragão.

 

De lá trarei a flor que dá no Mar Vermelho

e a fénix traz no bico e atira sobre o espelho

do lago, pra que o grifo admire a perfeição.

 

Também trarei o nardo e a pedra preciosa

 

e os lótus cor de prata e os trevos cor-de-rosa,

 

quando caçar os grous com setas de açafrão.

 

(1935)

 

 

O DESPERTAR DOS ECOS

 

DENTRO da gruta quieta

os ecos dormem na gruta.

A fonte é amiga e discreta.

A noite é persona grata.

 

Mas eis que um génio projeta

uma vingança insensata

e, mais veloz do que a seta,

a tempestade desata.

 

A tempestade vem bruta.

Estronda a noite maldita.

E ao ribombar que se escuta,

 

acordam, medonha grita!

dentes rangendo em desdita,

os ecos dentro da gruta.

 

 

O TRIUNFO DE SOSÍGENES COSTA: estudos, depoimentos e antologia.  Seleção,
organização e notas de Cyro de Mattos, Aleilton Fonseca.  Ilhéus, BA: Editus/UEFS
Ed., 2004.  292 p. ilus. (Coleção Nordestina, 41)  15X22 cm.   ISBN 85-7455-088-4 
“Cyro de Mattos “  Ex. bibl. Antonio Miranda 

 

CANTIGA BANTO

 

Eu vi o herói de Luanda,

eu vi o grande Zumbi.

Eu vi

lacaia pisando o rei

e o rei fazendo zumbaia

a Zumbi.

Eu vi

rei de Luanda ei

adereçô lanim.

 

Que cousa boa é feitiço

em branco que tem bangüê.

Feitiço de bango ê bango,

muamba de Dambrubanga,

mandinga de angola ê.

Eu vi lacaia sambando ê

banguelê,

lacaia mulher-de-saia

pisando o rei de lanim

eta que tango-lo-mango

no samba de iô bandá!

 

Lacaia pisava o rei

e o rei fazia zumbaia

a Zumbi.

Que linda mungada ei!

Mungada só de Zumbi...

 

Me diga: que fez o rei?

Adereçô!

Sereia está me chamando.

Depois eu lhe contarei.

 

Me diga: que fez o rei,
depois de tanta zumbaia

a Zumbi?

Adereçô?

Tatu tá me chamando;

depois eu lhe contarei.

 

Quase que vence a demanda,

quilombo de Caxingui.

Dos grandes de Angola

o maior é Zumbi.

 

(1939)

 

 

 

Extraído de

 

 

POESIA SEMPRE.  Revista da Biblioteca Nacional do RJ.   Ano 1 – Número 1 – Janeiro 1993.  Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional / Ministério da Cultura – Departamento Nacional do Livro.   ISSN 0104-0626   Ex. col. Antonio Miranda

 

 

OBSESSÃO DO AMARELO

 

A areia é fulva, o monte é flavo e a flora
De bronze e de ouro. Sideral capela
Adorna o bosque que dourado agora
Mais lindo esplende entre os topázios dela.

De um ruivo estranho o lírio se colora
E o trevo exibe de um jalde de aquarela.
O áureo matiz até na passiflora
Dominadoramente se revela.

Chinês pincel esse esplendor dirige,
Lançando agora em cima da folhagem
Tanto amarelo que a pupila aflige.

E na paixão mongólica e selvagem
Pelos tons de ouro a natureza exige
Que os próprios troncos amarelo trajem.

 

                            (1927)

 

 

 

CHUVA DE OURO

 

As begônias estão chovendo ouro,
Suspendidas dos galhos da oiticica.
O chão, de pólen, vai ficando louro
E o bosque inteiro redourado fica.

Dir-se á que se dilui todo o tesouro.
Nunca a floresta amanheceu tão rica.
As begônias estão chovendo ouro,
Penduradas dos galhos da oiticica.

Bando de abelhas através do pólen
Zinindo num brilhante fervedouro,
As curvas asas transparentes bolem.

E enquanto giram num bailado belo,
As begônias estão chovendo ouro.
Formosa apoteose do amarelo!

 

 

 

 

 

 

Página publicada em janeiro de 2008; Página ampliada e republicada em abril de 2008. Ampliada e republicada em setembro de 2014; ampliada e republicada em novembro de 2014. Ampliada e republicada em novembro de 2017

 

 



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