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                   Foto: https://doity.com.br/v-semana-de-engenharia-civil  
                  BOSCO LADISLAU   
                    
                  João Bosco Ladislau de Andrade, natural de Manaus, nasceu em  I,° de dezembro de 1954. É engenheiro civil e sanitarista, trabalhando como  professor da Universidade Federal do Amazonas, lotado na Faculdade de  Tecnologia. Mais conhecido como artista plástico, cultiva também a poesia, tendo,  na última condição, participado de algumas antologias, como Poetas brasileiros hoje (Rio de janeiro, I 986) e Marupiara (Manaus, 1988). 
                    
                    
                    
                  
                  POESIA E POETAS DO AMAZONAS. Organizadores:  Tenório Telles Marcos Frederico Krüger.   Manaus: Valer,  2006.   326 p.    Ex. bibl. de Antonio Miranda. 
                    
                    
                    
                    
                  É mentira o Que dizem estes senhores... 
                    
                  É mentira o Que dizem estes senhores todos - estes  
                    Que afirmam identificarem-se com a geração subjugada,  
                    mas Que nunca trazem as mãos fedendo a cigarro barato  
                    e nem recebem salário mínimo. 
                    
                  São, apenas, arautos 
                  das Nações e de Sociedades 
                  (corruptas e criminosas como as noites do Terceiro  Mundo). 
                  Disto sabem os deuses e os governantes 
                  Que nos conduzem à desgraça 
                  Quando simulamos a dissolução de seus sacramentos. 
                  Disto sabem os deuses e os governantes 
                  Que nos limitam a uma existência louca. 
                  E uma existência súbita e cruel; 
                  como o preço do pão, 
                  como a falta do feijão, 
                  como os 99 cruzeiros mensais 
                  das professoras do Nordeste 
                  no Hemisfério Ocidental, 
                  como os 60% de desempregados  
                    de algum lugar dispensados  
                    em 1976, como os crimes 
                  que cortam as tardes no Hyde Park  
                    ou na Praça da República! 
                    
                  Estes são os homens de ternos cinzas;  
                    meros executivos que lêem Garcia Lorca, ou fazem grandes projetos para o  amanhã. No fim do dia discutem entre si e dizem: 
                    
                  "Como são estranhos os homossexuais e as  prostitutas Que se beijam e se consolam na desgraça... Complexos são os camponeses  Que trabalham fazendo canções... Ordinários são os poetas, que falam de amor e  do Oceano Pacífico apenas para revelarem o choro dos oprimidos..." 
                    
                    
                          (In:  BEÇA & GATTI, Marupiara, p. I 30-1) 
                    
                    
                    
                    
                    
                  O Amargo da terra 
                    
                  Saúdo-te por último, 
                  meu caro amigo. Antes Que regresses 
                  novamente ao teu escuro Quarto de pensão, 
                  arrebentado, cego e traído 
                  pela estúpida moral de todas as filosofias. 
                  Eu venho de bares e mercados 
                  tristes e impenetráveis 
                  como as raízes de meu cérebro. 
                  A vida dos encarniçados 
                  Que aí se exilam e se embriagam 
                  é tão cheia de tragédias 
                  Que me faz dar gritos de agonia. 
                  Por isso tenho repulsa à tranquilidade 
                  e a canções de amor. 
                  Não tenho paz, senão Quando vejo 
                  a fome ausente de um operário 
                  e um sorriso obstinado 
                  na boca de uma mulher grávida. 
                  Fora disso sou intratável 
                  rebelde 
                  louco 
                  sem rumo: 
                  vivo e cruzo a cidade 
                  nas noites Que se erguem sedutoras 
                  como o sal terrestre. 
                  No entanto, amigo, 
                  sou como tu és: prefácio decadente 
                  de uma raça extinta pela necessidade. 
                  Ah, se morrêssemos de fartura 
                  numa noite de domingo! 
                  Entretanto, estamos presos à vida 
                  Que é a arte do impossível. Por ela 
                  nos tornamos irmãos 
                  entre jardins de papoulas. 
                  Viva e claramente 
                  não mais nos assustamos 
                  Quando dizem: "LO AMARGO DE LA TIERRA 
                  CANTA ENCIMA DE LOS PUEBLOS!", 
                  poroue temos 
                  um relincho selvagem Que se multiplica 
                  sempre e sempre 
                  no hoje e no amanhã; 
                  poroue somos a última geração Que luta. 
                  Nós, o ácido da Terra, 
                  nascidos da discórdia 
                  entre Deus e o Diabo. 
                    
                                (Inédito) 
                    
                    
                    
                  Página publicada em novembro de 2020 
                    
                
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