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                  FRANCISCO CAVALCANTI DE  
                     
                  ALMEIDA LINS 
                   
                   
                   
                   
                   
                  Fez os cursos primário e  secundário em escolas particulares e no Liceu 
                  Alagoano, ingressando logo após no jornalismo, exercendo  essa profissão em diversos Estados do país, principalmente no Rio Grande do Sul  e São Paulo. Foi funcionário do Tribunal Federal de Recursos, no Rio de Janeiro,  onde reside há vários anos. Almeida Lins é um poeta filosófico angustiado, como  Antero do Quintal, à procura da forma e do velho problema metafísico. O poema  «EVA», que aqui transcrevemos, é a sua obra prima.  
                   
                   
                  Nasceu na velha cidade de  Alagoas, hoje Marechal Deodoro, a 13 de de 1895, sendo filho do dr. Silvério  Tertuliano de Almeida Lins e de dona Francisca Cavalcanti Lins.  
                     
                   
                    
                  Extraído  de:  
                  
                   
                   
                  AVELAR, Romeu  de.  Coletânea  de poetas alagoanos.  Rio de Janeiro: Edições Minerva,  1959.   286 p.  ilus.  15,5x23 cm.   
                    
                  EVA  
                     
                   
                  I  
                     
                   
                  Era o primeiro olhar para  o primeiro dia.  
                    Mas, nesse olhar, Adão estuda a Natureza.  
                    E a vê com tal rigor, e tal sabedoria,  
                    que causou, ao Criador, sobressalto e estranheza.  
                  Acaso, Deus, que via o  Todo, só não via,  
                    no cérebro de Adão, a brasa, bem acesa,  
                    do Carvão do Pensar? A brasa que alumia  
                    As Coisas, e as quer ver em completa nudeza?  
                  E apostrofou a Deus: -  "Algo falta na vida.  
                    Em meu pressentimento, em minha intuição,  
                  esse algo vale mais que a Terra Prometida ... "  
                  Ante essa rebeldia e  esperteza de Adão,  
                    que fez o Criador, com a cautela devida?  
                    Promete-lhe: — Outra Vida, outra Arte, outra Ilusão ... 
                     
                   
                  II  
                     
                   
                  A promessa de Deus,  porém, diante de Tudo,  
                    por que não se cumpriu?. . . Por que?. . . Era de ver  
                    Adão: ficara triste, angustiado, mudo,  
                    dessa séria mudez que se enche de saber.  
                   
                  Mudez  transcendental: com o tormento agudo  
                  Na  Dúvida; e a feroz alegria de crer  
                  da  força da Razão se vem do livre estudo ...  
                  Mudez  que a Adão revolta e o faz rir do dever ...  
                    
                  Mudez  com esta explosão : - "Que vale ter nascido  
                  à  Imagem de Deus, se esse Deus à palavra  
                  das  promessas que faz, fica logo esquecido? ... "  
                   
                  Essa  pergunta impõe um Concílio dos Céus.  
                  Toda  a Corte Divina, apavorada, lavra  
                  o  vaticínio cruel: - "Adão está contra Deus ... "  
                    
                  III  
                    
                  Se  Adão, na agreste paz da sua moradia,  
                  já  não tinha mais paz enquanto Eva esperava,  
                  quem,  melhor do que Deus, ao vê-lo, avaliava  
                  no  Anjo Bom, que ainda era, o Anjo Mau, que seria?  
                    
                  Quem,  senão o Criador, o Fogo que lavrava  
                  no  cérebro de Adão — Fogo de rebeldia —  
                  tinha  o dever de vir apagar? Se ficava  
                  nos  Céus, indiferente, esse Fogo, o atingia! ...  
                    
                  E  o atingiu! . . . Adão, na primeira Conjura  
                  pensa.  Conjura leal. Sua elaboração  
                  adverte  o Criador do ânimo da Criatura  
                   
                  de  conquistar uma Arte, e possuir uma vida  
                  que  sejam, do Universo, uma limitação ...  
                  que  sejam, do Infinito, um ponto de partida ...  
                     
                   
                  IV  
                     
                   
                  Eis  Eva: — do Universo, uma limitação.  
                  Eis  Eva: — do Infinito, um ponto de partida .  
                  Agora,  sim! Teria o que aspirava Adão:  
                  ao  Ciclo da sua vida, o Ciclo de outra vida.  
                     
                   
                  Teria  o Amor. . . Mas, que sucede? Esta traição :  
                  Qual  se quisesse ver sua Obra destruída,  
                  A  Eva Deus impôs ficar toda escondida  
                  no  sendal do pudor, na paz da devoção!  
                    
                  Na  iminência da luta, era de vê-lo, e vê-la:  
                  Para  Eva possuir, Adão fica mais forte!  
                  —  Eva, para animar Adão, fica mais bela! 
                    
                  E  Eva?. . . Chora e sorri. . . Sua harmonização  
                  é  a glória do Viver: - Interiormente, é acesa  
                  de  Amor, e, exteriormente, é acesa de Ilusão ...  
                    
                  X  
                    
                  Se  Eva foi bela nos jardins do Paraíso,  
                  no  areal do Deserto, Eva, é muito mais bela:  
                  agora,  seu olhar, de prantos se constela  
                  e  tem espinho nos rosais do seu sorriso   .  
                    
                  Por  que Deus, lá nos Céus, ficara em sobreaviso  
                  após  a excomunhão? Porque — atentando nela — 
                  quase  a desconheceu: em Eva a dor revela  
                  novas  graças do mais fabuloso improviso.  
                     
                   
                  Para  bem vê-la, Deus, quis à Terra descer.  
                  À  Terra amaldiçoada? À Terra da traição?  
                  À  Terra do pecado? À Terra do morrer?  
                     
                   
                  Que  fizeram? Se Deus, na Terra da Bonança,  
                  pôs,  com Espada de Fogo, os Anjos da Vingança,  
                  na  Terra do Suor, eles puseram: - "Não!. . " 
                    
                    
                  Página publicada em  novembro de 2015 
 
                  
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