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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


POESIA MOÇAMBICANA

Seleção de Nelson Rossano


LUÍS CARLOS PATRAQUIM

LUÍS CARLOS PATRAQUIM

 

Língua

 

Mpurukuma, Língua, corpo quase,

o que sou de sobrepostas vozes,

Bayete!

E tu, pássaro da alma, Mpipi adejando

sobre o losango tumultuante de cores,

Templo onde me cerco,

não me abandones, cão inflando para o rio

uma escarninha balada que nos enforca.

Esfumou-se a Torre na praia nocturna,

a preposição que olfactava o nervo

e Ele dorme ainda e expulso.

Quando a palavra surge, inteira, das águas

e os espíritos batem a respiração do batuque,

Ele tacteia os nomes nas abóbadas de sangue

e entra pelo silêncio, dobrando-se

em número.

Leva-o nas tuas asas, ó sombra

que as patas de cinza espargiram no vento,

soluço de Leanor

em saínhos sete de capulanas mil,

Ilha mineral, Mpipi hílare no azul

onde me cego.

Que sinais sobre que mar do exílio ou

som de algas lavando-te o rosto, se inscreveram

em ti, mulher larga no Índico,

língua por dentro dos lábios cavando, obscuro,

um reino por achar?

Língua, Mpurukuma quase.

 

 

Depois das elegias

 

depois das elegias o alcandorado grito

sobre o deserto chão do poema,

desinventário de européis no fulgor

em barrocas cornijas de caniço ao alto,

a chuva,

e o chão ele mesmo vertigem,

as estiradas praias de silêncio

no tapume como ínsulas do incerto mar

na cidade dos cedros, sonetos antigos,

negreiros tijolos de incisões

a desaguar

 

 

 in Cadernos «Diálogo» 1

As Palavras Amadurecem – 1988

 

 

Metamorfose

 

a Mãe não era ainda mulher

e depois ficou Mãe

e a mulher é que é a vagem e a terra

então percebi a cor

e metáfora

mas agora morto Adamastor

tu viste-lhe o escorbuto e cantaste a madrugada

das mambas cuspideiras nos trilhos do mato

falemos dos casacos e do medo

tamborilando o som e a fala sobre as planícies verdes

e as espigas de bronze

as rótulas já não tremulam não e a sete de Marco

chama-se Junho desde um dia de há muito com meia dúzia

de satanhocos moçambicanos todos poetas gizando

a natureza e o chão no parnaso das balas

falemos da madrugada e ao entardecer

porque a monção chegou

e o último insone povoa a noite de pensamentos grávidos

num silêncio de rãs a tisana do desejo

enquanto os tocadores de viola

com que latas de rícino e amendoim

percutem outros tendões da memória

e concreta

a música é o brinquedo

a roda

e o sonho

das crianças que olham os casacos e riem

na despudorada inocência deste clarão matinal

que tu

clandestinamente plantaste

AOS GRITOS

 

 

in Cadernos «Diálogo» 1

As Palavras Amadurecem - 1988

 

O OSSO CÔNCAVO

 

De
Luis Carlos Petraquim
O OSSO CÔNCAVO
e outros poemas

Organização Floriano Martins
Artista Convidado Fernando Pacheco
São Paulo: Escrituras, 2008
174 p.   ISBN 978-85-7531-314-5

 


Luís Carlos Patraquim reúne em O Osso Côncavo e Outros Poemas (1980-2004) , simultaneamente título de um novo volume de poemas, e desta antologia pessoal, grande parte dos seus poemas, publicados anteriormente em Monção (1980), A Inadiável Viagem (1985), Vinte e tal Novas Formulações e Uma Elegia Carnívora (1991), Mariscando Luas (1992) e Lidemburgo Blues (1997).

 

O poeta é uma das vozes mais inovadoras da nova poesia moçambicana, que se revela logo no início da década de oitenta, demarcando-se da temática geral da exaltação ideológica. Uma opção de escrita, e de um percurso intertextualizado em outros textos da poesia moçambicana, que distinta e originalmente se destaca pela procura de um itinerário próprio, alicerçado em propostas anteriores, reformulando-as, e que inaugura diferentes vertentes para a lírica moçambicana.

 

É um percurso que se concretiza numa textualidade onde se revela e, ao mesmo tempo, se rasura a dimensão de natureza ideológica, que se inscreve, todavia, obtusa e transversalmente. Prática que contrasta com a postura, muitas vezes, vitoriosa do discurso mimético e pleno, erguido da então recente conquista da independência política. Escolha porventura difícil, subvertendo a monção favorável do slogan, da palavra de ordem e, digase também, o vazio editorial que, na altura, o primeiro livro do poeta veio preencher.   ANA MAFALDA LEITE

 

 

Estive com Luis Carlos Patraquim, em Fortaleza, durante a memorável Feira Internacional do Livro do Ceará, organizado por nosso amigo comum Floriano Martins, e o poeta ofereceu-me, com uma generosa dedicatória, sua antologia O OSSO CÒNCAVO E OUTROS POEMAS, lançado no Brasil, bela edição ilustrada pelo artista plástico Fernando Pacheco. Aqui vai uma seleção de seus magníficos poemas.  Antonio Miranda

 

ACONTECIMENTO

sobre as espigas trémulas
os pássaros migram
para os meridianos virgens
do eu rosto no vento
a densidade da boca

 

 

A VOZ  E O VENTO

com palavras faço a voz
e o vento
de que viajam e são

insistente desejo a lucilar
sobre a pele morna
de girassóis filtrando
teu rosto
seios
paisagem nua de ventre
com palavras a voz do que faço

estes dias infensos
a pendor de gume

 


REMINISCÊNCIA

às vezes o exílio
é uma árvore aberta
na imponderável noite

e nada espreita
a estrada larga
fonte do olhar

principia como um homem
multidões ao vento
a terra exangue
o grito arável

 


CANÇÃO

 

Para a Paula

  

chegarei com as árvores

meu amor ao som do sangue

às catedrais do puro gesto

com o grito e as aves

marítimas dentro das sílabas

ao breve cume da espuma

mãos nas mãos chegarei

 

chegarei com as espadas

areia verde dó planície

ao tutano meu amor da fome

com os frutos nos teus olhos

amante vento à espera

ao sexo nuclear do mundo

nervo a água chegarei

 

chegarei nas manhãs suadas

da voz meu amor liberta

à nocturna onda do poema

com as aves dentro do grito

ou só marítimo eco

à raiz exígua dos cristais

morte a morte chegarei

 

chegarei de pé ao silêncio

que vaza meu amor nos rios

remo a canto deslumbrados

contigo ao princípio chegarei

 

 

NATUREZA VIVA

Que o figo avermelhe a teu desejo,
Ovo granular, constelação;

E a polpa verde-escura,
Túmido impulso ou queda arborizando-se
Dentro dos ossos, te envolva,
Como estirada jaz a pele da infância.

 

 

Extraído de

 

 

 

POESIA SEMPRE – Revista Semestral de Poesia.  ANO 3 – NÚMERO 5 – FEVEREIRO 1995.  Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, Ministério da Cultura, Departamento Nacional do Livro, 1995.   Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

                Muhipiti

 

                  Para ti, com a ilha, a Rui Knopfli

         É onde deponho todas as armas. Uma palmeira
         harmonizando-nos o sonho. A sombra.
         Onde eu mesmo estou: Devagar e nu. Sobre
         as ondas eternas. Onde nunca fui e os anjos
         brincam aos barcos com livros como mãos.
         Onde comemos o acidulado último gomo
         das retóricas inúteis. É onde somos inúteis.
         Puros objetos naturais. Uma palmeira
         de miçangas com o sol. Cantando.
         Onde na noite a ilha recolhe todos os istmos
         e marulham as vozes. A estatuária nas verilhas.
         Golfando. Maconde não petrificada.
         É onde estou neste poema e nunca fui.
         O teu nome que grito a rir do nome.
         Do meu nome anulado. As vozes que te anunciam.
         E me perco. E estou nu. Devagar. Dentro do corpo.
         Uma palmeira abrindo-se para o silêncio.
         É onde sei a maxila que sangra. Onde os leopardos
         naufragam. O tempo. O cigarro a metralhar
         nos pulmões. A terra empapada. Golfando. Vermelha.
         É onde me confundo de ti. Um menino vergado
         ao peso de ser homem. Uma palmeira em azul
         humedecido sobre a fronte. A memória do infinito.
         O repouso que a si mesmo interroga. Ouve.
         A ronda e nenhum avião partiu. É onde estamos.
         Onde os pássaros são pássaros e tu dormes.
         E eu vagueio em soluços de sílabas. Onde
         Fujo deste poema. Uma palmeira de fogo.
         Na ilha. Incendiando-nos o nome.

 

 

         Drummondiana

 

                  Ao Gulamo Khan

 


         Já não elido, fiel amante da enunciação,
         o mundo durando. Carrego a minha no peito
         se abrindo  nenhuma dor maior —
         entre casuarinas que acenam da infância.
         Meus versos se despiram. A  noite,
         a inenarrável, a que espera sem iludida
         elisão rasgar este poema, sorri dos muros
         circum-navegando as casa. Como plantei muros!
         Como sou, sem pagamento, talvez um quark
         ou comburente de enzimas com alguma estória.
         Proteicas ideias se metamorfoseiam
         e a palavra escande e soçobra no silêncio.|
         José, Jacob, Macuácua, fazem um nome.
         Porém me perco. Não trago escada
         e nenhum anjo é maior do que o meu amor.
         Ela estremece. Em seu rosto acrescento
         a dissonante, vaga luz de lume, informulada
         poesia. Só ainda a funda música se estrutura,
         pura. Líquida substância desde as veias,
         esgueirando-se de sílabas, verbos, lívidas vogais.
         Aqui, sem marketing para viagens lunares,
         componho esta planície infensa aos escrúpulos
         da morte. Uma árvores cortada, apodrece!
         Os sexos são só sexos não futuráveis
         mas como explodem os corpos, em sôfregos,
         misteriosos abraços de máscaras e caniço.
         Como de granito pesam as barrigas dos meninos!
         Escrevo, não obstante, um país solar,
         rouca a língua que soluça em sintagmas antigos.
         Verde foi o pinho das gáveas com ferros
         para as Américas. A memória é isto.
         Mas já não elido. Também tenho um quarto,
         nenhum S. Benedito. Algumas esporas se ferem
         anima e cavaleiro. Do mundo à máquina chegará
         com a máquina — este avião de trigo, sujeito
         e objeto sem interrogações. Só ainda o mar
         espreita o meu desejo ondulante na areia.
         A tua flor anuncio, orquestração, maravilha,
         com o meu sêmen, o frágil milagre.

        

        
        

        

 

Página ampliada e republicada em dezembro de 2008; AMPLIADA e republicada em janeiro de 2018



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