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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 

Foto: Agência AngolaPress

 

 

ARLINDO BARBEITOS


 

Arlindo do Carmo Pires Barbeitos, nasceu em Catete, Província de Icolo e Bengo, Angola, em 24 de Dezembro de 1940. Em 1961, foi obrigado a fugir de seu país por motivos políticos. Viveu na a França, Bélgica, Suíça, e Alemanha, onde cursou Antropologia e Sociologia na Universidade de Frankfurt. Tem doutorado  em Etnologia e foi professor na Universidade Livre de Berlim Ocidental e na Universidade de Angola,  para onde  regressou em 1975.

 

 

No tempo/em que as pacaças entravam

 

no tempo

em que as pacaças entravam

                   pelos povoados

o vôo alvoraçado das perdizes

carregava sonhos

que

a mãozinha inerme de criança

feliz

agarrava ao lusco-fusco dos muxitos

no tempo

em que as pacaças entravam

                   pelos povoados

 

                   (Na leveza do luar crescente)

 

 

Oh flor da noite/onde todo o orvalho se perde

 

Oh flor da noite

onde todo o orvalho se perde

 

teus olhos

não são estrelas

não são colibris

 

teus olhos

são abismos imensos

onde na escuridão

todo um passado se esconde

 

teus olhos

são abismos imensos

onde na escuridão

todo um futuro se forma

 

oh flor da noite

onde todo o orvalho se perde

 

teus olhos

não são estrelas

não são colibris

 

         (Angola Angolê Angolema)

 

 

"borboletas de luz"

 

borboletas de luz

 

esvoaçando

de cadáver em cadáver

colhem

o fedor dos mortos em

       vão

 

e

pelos buracos da renda

 dos dias

passam alacres

do mundo do esquecimento

ao país da indiferença

levando consigo

o pólen fatal

das flores da guerra

 

borboletas de luz

 

         (Na leveza do luar crescente)

 

 

"oh alambique..."

 

oh alambique

de saudade

 

destilando

álcool de poesia

pára pára

 

oh alambique

de saudade

 

         (Na leveza do luar crescente)

 

 

"imersa em sereno de lusco-fusco"

 

imersa

em     sereno de lusco-fusco

e

suspensa em vazio

 

São-Tomé

 

carrocel de montanhas

carregador de nuvens

transportados de sonhos

irrompendo

de abismo de espuma

e

sumindo

em precipício de bruma

 

São-Tomé

 

suspensa em vazio

e

imersa em sereno de lusco-fusco

 

                   (Na leveza do luar crescente)

 

 

"na leveza do luar crescente"

 

na

leveza do luar crescente

sobe

a ilusão da felicidade

que

teu gesto distraído

                   me dá

 

como se

plumas vogando suaves

na brisa

fossem

vida de pássaro apodrecendo

na

leveza do luar crescente

 

                   (Na leveza do luar crescente)

 

 

"na transparência da tardinha"

 

na transparência da tardinha

que

impávidos imbondeiros sombreiam

 

cantar de galinha do mato

é

eco de um tempo

em

que ilusão e verdade

cirandavam alheias ao mundo

 

a esperança medrava verde

verde

como rebento de capim de outubro

 

na transparência da tardinha

que

impávidos imbondeiros sombreiam

 

                   (Na leveza do luar crescente)

 

 

"pela névoa de pesadelo"

 

pela névoa de pesadelo

a dor passa

clandestina

a fronteira dos instantes

e implacável

monta guarda

ao porão dos dias

ao contorno dos gestos

ao ruído das coisas

e

ao sentido das palavras

embaciadas

pela névoa do pesadelo

 

                   (Na leveza do luar crescente)

 

 

 

CARNAVAL CARNAVAL CARNAVAL

 carnaval carnaval carnaval

guizos apitos dicanzas* gomas2** puitas*** e quissanges
vozes

vozes cantando berrando gritando chorando gargalhando

[e calando

papel riscado seda serapilheira peles e pele missangas pulseiras chapéus espelhinhos cacos de

[garrafas e outras coisas

vermelho amarelo verde azul

azul verde amarelo vermelho o céu e o sol

carnaval carnaval carnaval

 

olhos para o ar mãos sem nexo peitos em turbilhão ventres abobadados cus em assimetria e corpos jazendo gentes

gentes gingando bamboleando saracoteando

[massembando^ cambalhotando e dormindo

 

carnaval carnaval carnaval

poeira

poeira branca como fuba bombó***** cobrindo

crianças cães folhas mangas água e tudo

cheiro

cheiro de bode cheirando de lábios revirados e mijo

                                                           [das cabras

cheiro de bagre seco repousando na calma das quinda******
cheiro de catinga em nossos sovacos ardentes
cheiro de sentina que o vento traz das piteiras ao lado

                                                        [de cacimba

cheiro de chuva de ontem nas lavras sem ninguém       

e cheiro de pólvora dum outro dia de fevereiro ainda

                                                        [por chegar

 

carnaval carnaval carnaval

 

feiticeiro velho que fala com jacaré
passeando lentamente de chucho no ombro e branco

brando vendendo vendendo carnaval carnaval carnaval

 

1      dicanza — chocalho.

  1. goma — espécie de tambor.
  2. pufta — cuíca
  3. massembando — dançar a massemba (dança tradicional de Angola).
  4. fuba bombó — farinha de mandioca.
  5. Quinda - cesto

 

 

 

O JOÃO CAMBUTA QUE FORA MILITAR

 

 

O joão cambuta   que fora militar tinha um apito da tropa

O Nando china que era mulato fez uma gaita de caniço

6 quinda - cesto

O Chico pernambucano que não era brasileiro mas que mancava da perna direita trouxe uma puíta* do avô caçador

 

O Tumba pastor porque era do sul
marcava ritmo com dois pauzinhos


O Pazito funileiro que vinha de Capolo
só tocava de assobio
mas não estragou a música.

 

*puita  - inztrumento musical

 

 

A SOMBRA DA ARVORE VELHA DE MUITOS SOBAS

 

 

A sombra da árvore velha de muitos sobas.*
só cresceram muxitos**

O sussurrar encarcoleante dos surucucus d'areia

marcava dédalos efémeros

que os quissondes*** iam devorando

A sombra da árvore velha de muitos sobas só cresceram muxitos

 

*sobas – chefes tradicionais
**muxitos – arbustos
***quissondes – formigas grandes

 

 

BEIJO ATÉ A GARGANTA TUA BOCA PANTANAL

 

 

Beijo até à garganta tua boca pantanal

paradeiro obsidiano de sapos miasmas excrementos e

                                                     [orquídeas roxas
respiro teu halo mortífero de febres palustres
chupo tua língua dura
tronco de mulemba* carcomida
que sopro de mologe** zangado
fez tombar à água
em noite de trovoada seca
respiro teu halo mortífaero de febres palustres
beijo até à garganta tua boca pantanal
paradeiro obsidiano de sapos miasmas excrementos e
                                                  [orquídeas roxas

 

 

*mulemba – árvore de fruto comestível
**mologe - feiticeiro

 

 

DIMENSÃO – REVISTA INTERNACIONAL DE POESIA.         ANO XX – No. 30.  Editor Bilharino.   Capa; Visual de Gabrile -Alfo Bertozzi. Uberaba, Minas Gerais, Brasil: 2000.  200 p.   No. 10 787      Uberaba, MG – Brasil. Capa: Visual de Gabriele-Aldo Bertozzi. Editor: Guido Bilharino 200 p.                   Ex. biblioteca de Antonio Miranda

 

 

               traços de nuvem
             em asa de pássaro vermelho

             voando

             mariposa do ocaso
             em teus lábios azuis

           
                         na calmia da paisagem
                         que teu olhar traz suspensa
                         afogada
                         desliza a memória de negreiros

                         amada
                         que lembrança terão os peixes


              pelas paredes
              fulvas
              deslizam as sombras da esperança

                as tuas palavras de lusco-fusco
                cobrem as coisas
                de um manto de penumbra
               
                a noite baixa
                sobre o labirinto da recordação
                e
                exangues se abrem os dedos

                as sombras da esperança
                fulvas
                deslizam pelas paredes

                          
                           suspensos
                         em matizes esbatidos de azul
                         e
                         do instante sem limite
                         pairam fuscos os pássaros

                         no vaso
                         a flor continua viçosa
                         e
                         as formigas correm como lá fora

                         na sombra opaca dos teus olhos
                                             descubro o mundo
                         mas
                         pelas mãos que afago
                         sobe a morte
                         como as águas em maré cheia
                     

*
Página ampliada e republicada em abril de 2024

 

 

 

 

Página publicada em junho de 2009; ampliada em janeiro de 2016

 



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