ODYLO COSTA, filho  
                  (1914-1979)  
                    Poeta  maranhense. Autor de muitos livros de poesia e prosa, destacando-se Boca da Noite, obra póstuma. Outros  títulos: Tempo de Lisboa e outros poemas, Cantiga incompleta e Notícias de Amor. Chegou a ser membro da  Academia Brasileira de Letras. 
                      
                    Veja também POESIA INFANTIL de  ODYLO COSTA FILHO  
  
                      
                    TEXTOS EM PORTUGUÊS /  TEXTOS EN ESPAÑOL 
                  Traducciones de Homero Icaza Sánchez y Estela dos Santos 
                     
                    
                      
                COSTA,  FILHO, Odylo.   Poesia  completa.  Edição preparada  por Virgílio Costa.  Rio de Janeiro:  Aeroplano: Fundação Biblioteca Nacional, 2010.    568 p.   
                      ISBN 978-85-7820-042-8  
                    
                    "Na verdade, Odylo é como se vestisse roupa de menino  em corpo de adulto, é um poeta contumaz e geral, e sabe tirar do soneto uma  sutil modulação em que se casam o gosto moderno e o clássico." CARLOS  DRUMMOND DE ANDRADE 
                         
                      Finamente, um alentado volume de 568 p. com a poesia completa deste importante  poeta maranhense,  que chegou a Academia  Brasileira de Letras. Publicou 8 títulos, cujos poemas foram revisados e  reunidos num volume bem cuidado, com o aval da  Fundação Biblioteca Nacional e apoio do  Instituto  que leva o nome do poeta.  As palavras de Drummond bastam para  apresentar um autor consagrado pela crítica.   
                      
                    
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                    REZA 
                      
                    Meu Deus,  tende pena 
                    do que  resta em mim: 
                    nem o  mundo é feio, 
                    nem a  vida, ruim. 
                      
                    Meu Deus,  dai-me força 
                    de amar  minha sorte: 
                    fazer luz  de vida 
                    das  trevas da morte. 
                      
                      
                    ORACIÓN 
                      
                    Dios mio, ten pena 
                    de lo que sobra en mí: 
                    ni es feo el mundo, 
                    ni la vida ruín. 
                      
                    Dios mío, dame fuerzas 
                    para amar mi suerte: 
                    tornar luz de vida 
                  las sombras de muerte.  
                  
                    
                    
                    GLOSA DE LOPE  DE VEGA 
                      
                        “… nos olhos me levais alma e sentidos…” 
                                                  Luís de Camões 
                      
                    “Dos libros, três pinturas, cuatro  flores”, 
                    pedia  Lope para ser feliz: 
                    Não falou  de riquezas nem de amores. 
                    Esse  pouco de pobre —não mais—quis. 
                      
                    Castos  delírios de espanhol asceta... 
                    Passaram  quatro séculos, e um dia 
                    Gabriel  Celaya, também grande poeta, 
                    jurou por  Deus que nada mais queria. 
                      
                    Temos,  porém, pai, mestre e capitão, 
                    no  soldado fortíssimo, que disse 
                    a uns  olhos entregar alma e sentidos. 
                      
                    De coisa  alguma havemos precisão. 
                    Livros,  quadros e flores, que doidice! 
                    Basta-nos  ser de um só Amor providos.  
                      
                      
                    GLOSA A LOPE DE VEJA 
                      
                      
                        “… nos olhos me levais alma e sentidos…” 
                                                  Luís de Camões 
                      
                    “Dos libros, três  pinturas, cuatro flores”, 
                    pedia Lope para ser feliz. 
                    No habló de riquezas ni de amores. 
                    Eso poco de pobre —no más—quiso. 
                      
                    Castos delirios de español asceta… 
                    Pasaron cuatro siglos y un día 
                    Gabriel Celaya, también gran poeta, 
                    juró por Dios que nada más quería. 
                      
                    Mas tenemos padre, maestro y capitán, 
                    en el soldado valiente que dijo 
                    a unos ojos entregar alma y sentidos. 
                      
                    De nada tenemos necesidad. 
                    ¡Libros, cuadros y flores, qué locura! 
                    Bástanos ser de un solo Amor provistos. 
                    
                    
                    
                    ANTIGAMENTE 
                      
                    Antigamente  não acreditava no outro mundo. 
                    Pelo  menos tinha minhas dúvidas. 
                    Pensava  nele como categoria abstrata 
                    presença  (ou ausência) de amor 
                    inominado 
                    etéreo 
                    talvez  terrível. 
                      
                    Hoje  creio simplesmente num outro mundo 
                    parecido  com este: 
                    cadeiras,  mesa, copo d´água, 
                    e de novo  tuas mãos, tuas cartas: 
                    “Meus  queridos...” 
                      
                      
                    ANTIGUAMENTE 
                      
                    Antiguamente no creía en el otro mundo. 
                    Por lo menos tenía mis dudas. 
                    Pensaba en él como categoría abstracta 
                    presencia (o ausencia) de amor 
                    innominado 
                    etéreo 
                    tal vez terrible. 
                      
                    Hoy creo simplemente en otro mundo 
                    parecido a éste: 
                    sillas, mesa, vaso de agua, 
                    y de nuevo tus manos, tus cartas: 
                    “Mis queridos…” 
                    
                    
                    
                  SONETO DO SÓ 
                    
                    Só, neste  chão ocidental da Europa, 
                    sou  apenas lembrança, e só lembrança. 
                    A fé, se  na perdi, é que me agarro 
                    ao  padre-nosso que escutei menino. 
                      
                    A saudade  me tira o gosto às coisas 
                    e me  resseca os olhos enevoados. 
                    Campos e  barcos, trajes, casas, rios 
                    atravessam-me  o corpo sem ficar. 
                      
                    Mas  espero no espírito e no sangue. 
                    As rezas  que aprendi e que ensinei 
                    hão de  chegar a tempo de salvar-me. 
                      
                    Traspassado  do límpido segredo, 
                    hei de  com os dedos arrancar à terra 
                  alegria  de amor que não se acabe.  
                    
                      
                    SONETO DEL SOLITARIO 
                      
                    Solo, en este suelo occidental de Europa, 
                    apenas soy memoria, solamente. 
                    Si no perdí la fe, es que me agarro 
                    al padrenuestro que escuché de niño. 
                      
                    La saudade me quita el gusto a cosas 
                    y reseca mis ojos nublados. 
                    Campos y barcos, trajes, casas, ríos 
                    atraviesan mi cuerpo sin quedarse. 
                      
                    En el espíritu y la sangre espero. 
                    La oración que aprendí y que enseñé 
                    ha de llegar a tiempo de salvarme. 
                      
                    Traspasado de límpido secreto, 
                    arrancaré a la tierra con los dedos 
                    alegría de amor que no se acabe.  
                      
                      
                Publicados originalmente numa  antologia bilíngüe do Centro de Estudios Brasileños de Buenos Aires e  reproduzidos na REVISTA DE CULTURA BRASILEÑA, N. 51, diciembre de 198º.  Publicación de la Embajada  del Brasil en Madrid, España.  
                  
                  
                
                COSTA, filho, Odylo.  Tempo de Lisboa e outros poemas.  Lisboa: Círculo de Poesia, Livraria Morais  Editora, 1966.  108 p.  15,5x20 cm.   Apresentação de Manuel Bandeira. Ao final, uma “Errata”.  Col. A. M. (EA) 
                  
                  
                SONETO DE AMOR CARNAL 
                   
                  Há, neste amor carnal, esquecimento. 
                  Vem de repente, bruto como a sede, 
                  e desfaz sob a chuva e sob o vento 
                  os afrescos e as sombras da parede. 
   
                  Desmancha-se o mortal encantamento 
                  na unidade da trama de uma rede 
                  de veias. Desce o nada. E esse momento 
  é um copo d´água paa a eterna sede. 
   
                  Mas o que pacifica, o que transcende 
                  e faz da vida um vinho sempre lúcido, 
  é a confusão das almas na saudade. 
   
                  Ela que em teu cabelo a luz acende, 
                  que o mundo a nossos olhos faz translúcido 
                  e transverbera o chão na eternidade. 
  
                  
                  
                  
                De 
                  Odylo  Costa, filho 
                  Boca da Noite 
                Rio  de Janeiro: Salamandra, 1979.   150 p. 
                  
                  
                NOIVA 
                  
                Linda, como somente vós  sabeis, 
                  forte, como a esperança que em vós ponho, 
                  alegre, como fostes, sois, sereis, 
                  assim vos penso, assim vos recomponho, 
                curvada embora à vida e às  suas leis 
                  mas nunca libertada do meu sonho.  
                  Fostes a noiva na manhã de Reis, 
                  ainda hoje o sois nos versos que componho. 
   
                  Leio Luis de Camões, o nosso poeta, 
                  a suspirar do amor mais desgraçado 
                  e a maldizer o dia em que nasceu. 
   
                  Sobreponho-me à morte e à dor secreta, 
                  o amor feliz, senhora, é o nosso fado, 
                  cantá-lo, a chave do destino meu. 
                  
                  
                UM SÓ AMOR 
                     
Amores? Não. Cantei um só amor. 
Não me arrependo da monotonia 
nem de cantar a posse e o possuidor. 
Se abelhas mansas dentro em mim havia 
 
por que negar o vôo para a flor? 
Até na momentânea nostalgia 
nossa pátria era a mesma.  A própria dor 
uniu mais do que junta uma alegria. 
 
Chegou a noite e seu silêncio mas 
para aclarar o mundo a luz secreta 
em teu cabelo pôs manchas de prata. 
 
E teço versos como que refaz 
a vida.  Todo o meu mister de poeta 
é de amor: madrigal e serenata.   
                  
                  
                
                De 
                  Odylo  Costa, filho 
                    un solo amor 
                      antologia bilíngue 
                    Buenos Aires: Centro de Esudios Brasileños; Embajada del Brasil, 1979, 
                 
                 
                  
                AMORES ANTIGOS 
                 
                 
                Quando  em tua presença falei de amores antigos 
                  olhava-os com a mesma visão distante de sementes  
                              que murcharam  na terra. 
                  Meu amor és só tu 
                  e não o comparo à luz do sol que essas todas as noites 
                                                 se  esconde: 
  é antes luz vegetal, interior, sempre idêntica 
                                                 a  si mesma, 
                  peixe cego subido do chão do oceano sobrenadando 
                                       atônito  na superfície.       
                  
                AMORES  ANTIGUOS 
                
                           Traducción de Homero Icaza Sanchez. 
                     
                     Cuando em tu presencia 
                    hablé de amores antigos, 
                    los miraba com la misma visión distante 
                    de semillas que se marchitaron em tierra. 
                     
                    Mi amor eres sólo tú 
                    y no lo comparo a la luz del sol 
                    que esa todas las noches se esconde: 
                    es antes luz vegetal, interior, 
                    siempre idêntica a sí misma. 
                     
                    — Ciego pez que vino del fondo del océano 
                    y sobenada atónito em la superfície.
                   
                  
                  ANTOLOGIA DE SONETOS PIAUIENSES [por]   Félix Aires.  [Teresina:  1972.]   218 p.     Impresso  no Senado Federal Centro Gráfico, Brasília.                                 Ex. bibl.  Antonio Miranda 
                    
                         SONETO DOS CINQUENTANOS 
                   
                         Não sinto como o herói do mestre egrégio, 
         Estou  com os homens e com Deus contente. 
         Revejo-me  dos tempos do colégio, 
         Aceito  o meu passado e o meu presente. 
   
         A  dor que Deus me deu, aceito-a.  Ponho 
         Máscaras  mansas no meu sofrimento. 
         Nem  quero mais que tenho, nem proponho 
         Mesmo  esse pouco dissipar no vento. 
   
         Tudo  se foi, mas tudo está presente: 
         O  rio, os bois, as árvores da infância, 
         Meu  pai, severo, minha mãe, paciente. 
   
         Faltam-me  o olhar e a voz desse menino 
         Mas  desce de seu gesto, na distância,  
         A  força com que enfrento o meu destino. 
                    
                    
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                  Página ampliada e republicada em março de 2023 
  
                   
                     
                       
                       
                      [poesia amorosa; poesia romântica: a noiva] 
                 
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