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A SEMIÓTICA POÉTICA EM GONÇALVES DIAS

por ANTONIO ROBERVAL MIKETEN

 

Extraído de:

MIKETEN, Antonio RobervalEnigma e realidade: ensaios críticos.  Brasília:  Thesaurus, s.d.  154 p.  10,5x20 cm.   Inclui ensaios sobre Gonçalves Dias, Olavo Bilac, Cassiano Nunes, Marly de Oliveira, Domingos Carvalho da Silva, etc.  Col. A.M. (EA)  p. 15-19

 

          A obra de arte literária, no desencadear de sua epifania de símbolos, é uma fonte que gera sua própria significação. Para que seja produzido esse evento de sentidos, nela concorrem, de maneira harmónica, indissociável, em todos os níveis, os dois planos da linguagem: expressão e conteúdo. O papel da Semiótica Poética seria o de descrever a homologia que existe entre esses dois planos, indicando que a mensagem do texto artístico constitui denso bloco onde estrutura e conteúdo apresentam-se na imagem de um só elemento. Tal homologia faz com que todos os elementos da obra literária sejam repassados de sentido. Por conseguinte, a mensagem da obra de arte não é transmitida com os meios de uma estrutura elementar propriamente linguística e, por isso mesmo, seu conteúdo só pode ser apreendido a partir de sua complexa estrutura artística.

          A Semiótica desvenda, em "A Tempestade", a radical implicação da estrutura métrica de Gonçalves Dias com o todo semântico do poema. Nas vinte estrofes que compõem esse poema, com exceção do monossílabo e do dodecassílabo, concorrem todos os tipos de versos das dez restantes opções que oferece o sistema isossilábico da poesia em língua portuguesa.

          Assim, em processo de gradação ascendente e descendente, as estrofes se constroem em versos que crescem de duas a onze sílabas, e que, simetricamente, decrescem de onze a duas sílabas.

          A suavidade dos dissílabos iniciais indicia o prenúncio da tormenta:

Um raio

Fulgura

No espaço,

Esparso

De luz;

E trémulo

E puro

Se aviva,

S'esquiva,

Rutila,

Seduzi

 

          O clímax da tempestade está isomorficamente relacionado com o clímax da métrica do poema, ou seja, a estrofe de versos de onze sílabas. Portanto, estrutura e conteúdo se apresentam na imagem de um só elemento. Nessa estrofe, percebe-se, então, o torvelinho de um vento devastador:

 

Remexe-se a copa dos troncos altivos,
Transtorna-se, douda, baqueia também;
E o vento, que as rochas abala no cerro,
Os troncos enlaça nas asas de ferro,
E atira-os raivosos dos montes além.

 

          Após o vendaval, a chuva desaba na torrencial gradação descendente dos versos das estrofes subsequentes;

 

Da nuvem densa, que no espaço ondeia,

Rasga-se o negro bojo carregado,

E enquanto a luz do raio o sol roxeia,

Onde parece à terra estar colado,

Da chuva, que os sentidos nos enteia,

O forte peso em turbilhão mudado,

Das ruínas completa o grande estrago,

Parecendo mudar a terra em lago.

 

 

          O violento desabar da tormenta percorre oito estrofes, em processo decrescente, até encontrar a sua serenidade nos versos de duas sílabas onde cai, de uma folha, a última gota da tempestade:

 

A folha

Luzente

Do orvalho

Nitente

A gota

Retrai:

Vacila,

Palpita;

 

Mais grossa,

Hesita,

E treme

E cai.

 

          Verifica-se, pois, que a mensagem deste poema não pode existir e não pode ser transmitida fora de uma determinada estrutura: a homologia reinante entre sua métrica e seu conteúdo.

          As implicações estruturais dos diversos ritmos dos versos indianistas de "l-Juca-Pirama" com o tema os tornam passíveis de semantizaçâo. Na métrica heteróclita das dez partes desse longo poema, comparecem variados ritmos que tornam estrutural o indianismo de Gonçalves Dias. Assim, os hendecassílabos do primeiro canto — na cadência uniforme da acentuação na 2a, na 59, na 89 e ha 11a sílaba — reproduzem perfeitamente o som dos instrumentos musicais, usados pelos índios nas cerimônias religiosas ou guerreiras:

 

No meio das tabas de a menos verdores,

Cercadas de troncos — cobertos de flores,

Alteiam-se os tetos d'altiva nação;

São muitos seus filhos, nos ânimos fortes,

Temíveis na guerra, que em densas coortes

Assombram das matas a imensa extensão.

 

          Alternam-se, no sistema, duas sílabas átonas entre sílabas tónicas. A mesma alternância ocorre nos pentassílabos do canto de número oito:

 

Meu canto de morte,

Guerreiros, ouvi:

Sou filho das selvas,

Nas selvas cresci;

Guerreiros, descendo

Da tribo tupi.

 

          Os eneassílabos anapésticos do oitavo canto de "l-Juca-Pirama" também guardam duas sílabas átonas de permeio entre suas sílabas tónicas, traduzindo o indianismo estrutural de Gonçalves Dias:

 

— "Tu choraste em presença da morte?

Na presença de estranhos choraste?

Não descende o cobarde do forte;

 

Pois choraste, meu filho não és!
Possas tu, descendente maldito
De uma tribo de nobres guerreiros,
Implorando cruéis forasteiros,
Seres presa de vis Aimorés.

 

          O instrumento sagrado, usado nas cerimônias indígenas, era o maracá, espécie de chocalho: uma cabaça crivada, cheia de pedras ou búzios, e atravessada por um hastil ornado de penas multicores, que lhe servia de cabo, conforme nota do próprio Gonçalves Dias em Primeiros Cantos. Observe-se a referência a esse instrumento em uma das estrofes do poema "O Canto do Piaga":

 

Por que dormes, ó Piaga divino?

Começou-me a Visão a falar.

Por que dormes? O sacro instrumento

De per si já começa a vibrar.

 

          Do ponto de vista da Semiótica, então, muitos dos poemas de Gonçalves Dias oferecem verdadeira lição àqueles que praticam a métrica gratuita. Uma mensagem que se utilizasse de uma métrica sem compromissos com o estrato semântico do poema, para transmitir a sua informação, poderia causar estranhamento ao leitor, promovendo o concurso da função poética da linguagem em" sua operação, mas não atenderia ao requisito básico da obra literária: fazer com que todos os seus elementos sejam elementos de sentido. Se a métrica valesse em si e por si, sem implicações com o plano de conteúdo, o poema correria o risco fatal de se reduzir a uma burocrática consulta aos MANUAIS DE VERSIFICAÇÃO.

 

 

 
 
 
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