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Sobre Antonio Miranda
 
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


O MODERNISMO É TÃO ANTIGO

 

Antonio Miranda

 

Posturas e imposturas. A arte do século XX foi devotada à renovação constante, à contestação e à constatação de ismos, movimentos centrados em manifestos, rupturas, avanços e retrocessos. Podemos exemplificar com o futurismo e seu culto à ciência e ao “progresso” tecnológico, passando pelo automatismo do surrealismo, culminando com o cubismo e uma transição clara entre o figurativismo e o geometrismo que pautou todas as vertentes do experimentalismo como primado da arte.

 

É óbvio que a arte dita moderna começou mesmo foi no final do século XIX, com a deformação da figura, com a quebra dos cânones do classicismo, nas raízes do abstracionismo. É lógico que essa concepção tem origens no passado e representou uma nova globalização, com a descoberta da expressão africana das máscaras, da paisagem na pintura e no ideograma oriental, e até nos confins da Polinésia com rituais e estilizações das imagens. O quadro vence os limites da tela, o poema acaba com o espaço em branco da folha de papel, a música supera a harmonia e até os instrumentos convencionais, a novela acaba com o naturalismo e rompe com a gramática e o cinema registra novas formas de expressão. Nada mais antigo do que o modernismo.

 

Faço estas constatações  ao visitar o Museu Nacional Centro de Arte Reina Sofia, em Madri. Não estava lá o Mondrian, mas o Ferdinand Léger ostentando traços e manchas depuradas, Juan Gris desfigurando e fragmentando a imagem, Picasso deformando o rosto humano para revelar seu interior. Havia ali também um retrato cubista do Tristan Tzara com seu olhar oblíquo. Mas o que mais me impressionou foi a mostra — fantástica!— do cinetismo, da op art, movimento artístico que eu vi nascer e fenecer. Bobagem: não nasceu nem morreu, surgiu e desvaneceu em meio a outras manifestações conseqüentes. O cinetismo é o geometrismo em ação ou simulação,  a transfiguração pelo movimento (mecânico) ou pelo desplazamiento do espectador em sua relação com a obra. Move-se a peça ou o público. Ilusão ótica, antecipação da holografia (embora esta já existisse) e da virtualidade. Efeitos visuais pré-psicodélicos, o rompimento com o plano, com a superfície, a reverberação e multiplicação das linhas e texturas. Fim da pintura para uns, uso de materiais nobres como a madeira e o metal (numa metamorfose entre pintura e escultura), instalações cromáticas, sensorialismo. Le Parc e Vassarelli com seus círculos e linhas interrompidas. Peças mecânicas impondo movimentos às partes e a penetrabilidade das esculturas de plástico ou alumínio de Jesus Soto. Por certo, a Venezuela se impõe, além de Soto, com os painéis longitudinais do Cruz-Diez e suas superfícies coloridas, e com as esculturas eólicas de Alejandro Otero (estas não estavam, infelizmente, presentes no Museu de Madri e, segundo se vê na Internet, atualmente estão em estado de risco nos espaços públicos de Caracas, sujeitas à intempérie e ao vandalismo, sem a atenção adequada para sua preservação).

 

Convivi com Alejandro Otero, com quem mantive diálogo “construtivista” sobre sua arte e sobre a arte contemporânea, no período que vivi na Venezuela, Foi uma convivência das mais pedagógicas e ilustrativas sobre a criação cinética daqueles tempos. A arte agora descambou para o conceitual e o virtual, desmaterilizou-se ou assumiu formas efêmeras, instantâneas, invadiu o espaço urbano e o ciberespaço, e assumiu maneiras coletivas e interativas. Mas o cubismo, cinetismo estão por aí sendo recriados, em intervenções urbanas, na internet, e até nas galerias de arte. Uma aventura fascinante de representação e em conteúdos com formas renovadas, no agora instituído hiperrealismo. Impossível não enxergar nestas “obras” os elementos constitutivos do futurismo, do construtivismo, do surrealismo, da optic art, do cinetismo, da arte pop, do minimalismo, numa hibridização sem limites, nos limites do “pensamento complexo”, de obra aberta, da arte cibernética, do experimentalismo inesgotável.

 (Madri, Espanha, 15 abril 2007) 



Aurora Cuevas Cerveró (coordenadora da seção de Poesia Espanhola) e Antonio Miranda em Madri, Espanha, em abril de 2007.

 



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