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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 

 

Foto extraída de www.revistaestante.fnac.pt/pedro-mexia/

 

PEDRO MEXIA

 

 

Pedro Mexia (Lisboa, 1972) é um escritor e crítico literário português. Licenciado em Direito pela Universidade Católica Portuguesa. Entre 1998 e 2007 fez crítica literária no Diário de Notícias. É desde 2007 crítico no jornal Público, onde também assina uma crónica semanal. Escreve mensalmente na revista LER. Participou em programas de comentário político na televisão («O Eixo do Mal», SIC-Notícias) e na rádio («Governo Sombra», TSF). Tem colaborado regularmente em projectos das Produções Fictícias. Exerce actualmente as funções de director interino da Cinemateca Portuguesa.

 

Publicou seis livros de poemas: Duplo Império (1999), Em Memória (2000), Avalanche (2001), Eliot e Outras Observações (2003), Vida Oculta (2004), Senhor Fantasma (2007), e duas colectâneas de crónicas, Primeira Pessoa (2006) e Nada de Melancolia (2008).   Fonte: wikipedia

 

 

Vimos todos os filmes

 

Vimos todos os filmes

mas ainda não sabemos o fim de nenhum,

somos como a luz que desconhece

a própria velocidade.

Os relógios são a decoração doméstica

da angústia, damos corda

aos que precisam e não precisam

sem sabermos nada

da corda e da angústia.

Anos e anos amontoam-se

como nuvens ou tumores benignos

entre as nossas pequenas ciências

e o pressentimento de que

Deus escreve direito e nós

somos as linhas tortas.

 

 

Não me contaram

 

Ninguém morreu em nenhuma

guerra (ou não me contaram).

As estadas em África, acidentais.

 

Na política, estadonovismo,

depois e antes

o que antes e depois havia

 

mais parecido. Ninguém

se bateu em duelo. Nenhum

homossexual notório e decadente.

 

À pergunta “alguém se matou

na família?” a avó

respondeu-me uma vez surpresa

 

e quase severa (mas quem?).

Alguém passou uma noite

na prisão? Só se em alguam

 

precaução alcoólica, em época

de Queima das Fitas.

O meu avô livrou-se

 

fraudulentamente da tropa, mas foi

na I República, por isso

achamos bem e a história

 

Tem graça (“faleceu”

nos editais e pronto). Algumas

cartas foram queimadas

 

com as próprias pistas que

deixavam. Eis uma gaveta

imaginária de espantos.

Episódios ancestrais não se conhecem

mas a família

imediata oferece apenas

 

mitologias pequenas, monstruosidades

vulgares: doenças e dinheiros  e adultérios

 

e filhos “fora do matrimónio”

e loucuras mais ou menos

inofensivas. Serve

 

Para drama português, não

para tragédia grega,

para referência privada

 

ou que, em público, mostre, espantosa

a família que não tenho, um

exagero, em resumo,

 

como fazem os poemas à falta

de melhor motivo. Ou então,

não me contaram.

 

 

Poemas extraídos da revista POESIA SEMPRE, Num. 26, Ano 14, 2007. Edição da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro.

 

 

MEXIA, PedroContratempo. Poemas escolhidos. Rio de Janeiro: Tinta-da-China, 2016.  132 p.  14x20 cm.  ISBN978-85-65500-23-4  

"A poesia de Pedro Mexias transita quase sem espanto, desassombrada, por entre ruínas, lúcida e melancólica. Os versos fazem-se, sobretudo, como diapasão da simplicidade. Os mistérios surgem então como resquícios, restos que emergem da lembrança, testemunhos silenciosos e confusos: casas, automóveis, livros, espingardas, fotografias, animais, canções. Eis uma escrita voltada para as coisas materiais — acumuladas no lixo ou num ferro velho —, mas que no seu apego à matéria e ao corpo não se recusa ao estranhamento, à surpresa, à dúvida."      EUCANAÃ FERRAZ, na sobrecapa do livro.        

       

 

         PÓ   

        Nas estante os livros ficam
         (até se dispersarem ou desfazerem)
         enquanto tudo
         passa. O pó acumula-se
         e depois de limpo
         torna a acumular-se
         no cimo das lombadas.
         Quando a cidade está suja
         (obras, carros, poeiras)
         o pó é mais negro e por vezes
         espesso. Os livros ficam,
         valem mais que tudo,
         mas apesar do amor
         (amor das coisas mudas
         que sussurram)
         e do cuidado doméstico
         fica sempre, em baixo,
         do lado oposto à lombada,
         uma pequena marca negra
         do pó nas páginas.
         A marca faz parte dos livros.
         Estão marcados. Nós também.

 

         MEMÓRIA DESCRITIVA

        A sombra dos tectos altos
         não deixa respirar. A pintura
         esboroada como os ossos.
         A moldura verde das portas
         na solidão de ferro abandonada.
         Serradura nas frestas da madeira.
         Gonzos, chaves, uma gaveta
         com bocados e uma cama.
         Luzes fugazes em jornais antigos.
         Ganchos, fios, fendas.
         Uma almofada, restos
         dum romance francês, o metal
         de um candeeiro. Recantos,
         esquinas, manchas irregulares,
         pratos, móveis trôpegos, uma parede
         onde estala a cal. Tábuas pequenas,
         traves, bolor num espelho, vidrinhos,
         relógios, autocolantes, fechaduras,
         uma arca da qual ninguém
         se aproxima, pedaços de tecido
         alegre e tantas cadeiras.
  

 

E DEPOIS ISTO

Um delirium tremens, o sublime estático
e visível, o espaço cada vez maior
entre as paredes, a escrita do mundo,
o sólido ar crescendo, o diferente azul
da noite, um pulso iluminado, uma quarta-feira
iridescente, a porta por onde se torna
a passar, uma venda onde os olhos
transbordam, um veleiro imprevisto,
a contagem decrescente do fôlego, a proximidade
em saltos sucessivos, um fino crepúsculo,
a neve que no corpo principia,

         e depois isto, o contrário de tudo.

 

        Página publicada em novembro de 2009; ampliada e republicada em janeiro de 2018; página ampliada em dezembro de 2018

 


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