|     JORGE  DE AGUIAR   
 Nasceu em  Lisboa, em data desconhecida, tendo por pais a Pedro de Aguiar e a Mécia de  Sequeira. Foi Cavaleiro da Ordem Militar de São Tiago da Espada, e Alcaide-Mor  da Vila de Monforte. Sua mãe foi ama  da princesa D. Joana, filha do rei  Afonso V. Jorge de Aguiar casou-se   com D. Violante de Vasconcelos, não deixando prole. Nomeado capitão de uma  armada que navegava para a India, faleceu em viagem no ano de 1508. A respeito  dos seus versos, escreveu o critico português: Rodrigues Lapa: "Nestoutra, de Jorge de Aguiar, ha mais Fantasia e mais graça — que caracterizam a obra deste  poeta, mas a ínspiração não jorra menos límpida: é a pintura mais perfeita 
                  duma recaída de amor." (Lições de Literatura Portuguesa, 2.0edição, Coimbra, 1942). A cantiga  de Jorge de Aguiar, aqui publicada, figura no Cancioneiro Geral, de Garcia de Resende, 
                  aparecido em 1.516. 
 
       CORAÇAM, JÁ REPOUSAVAS
 
   Coraçam, já repousavas, 
 já não tinhas sojeiçam,
 
 já vivias, já folgavas,
 
 pois porque te sogigavas *
 
 outra vez, meu coraçam?
 
 
 Sofre, pois te nam sofreste 
 na vida que já vivias;
 
 sofre, pois te tu perdeste,
 
 sofre, pois nam conheceste
 
 como t' outra vez perdias.
 
 Sofre, pois já livre estavas
 
 equiseste sojeiçam,
 
 sofre, pois te nam lembravas
 
 das dores de qu'escapavas:
 
 sofre, sofre, coraçaml!
 
 *Subjugavas. 
    
                  Coraçam já repousavas,Já não tinhas sujeiçam,
 Já vivias, já folgavas;
 Pois porque te sojigavas
 Outra vez, meu coraçam?
 Sofre, pois te não sofreste
 Na vida que já vivias;
 Sofre, pois te tu perdeste,
 Sofre, pois não conheceste
 Como te outra vez perdias;
 Sofre, pois já livre estavas
 E quiseste sujeiçam;
 Sofre, pois te não lembravas
 Das dores de que escapavas:
 Sofre, sofre, coraçam!
             (Cancioneiro Geral, 1516)   
 
                                                                                       Tapeçaria medieval. Fonte da imagem:https://marketplace.secondlife.com
             CANTIGA    Esforça, meu coração,não te mates, se quiseres:
 lembre-te que são mulheres.
 Lembre-te qu´é por nascernenh~ua que não errasse;
 lembre-te que seu prazer,
 por bondade e merecer,
 não vi quem dele gostasse.
 Pois não te dês à paixão,
 toma prazer, se puderes,:
 lembre-te que são mulheres.
 Descansa, triste, descansa,que seus males são vinganças;
 tuas lágrima amansa,
 leix´as suas esperanças.
 Ca, pois nascem sem razão,
 nunca por ele lh´e espere:
 lembre-te que são mulheres.
 Tuas mui grandes firmezas,tuas grandes perdições,
 suas desleais noções
 causaram tuas tristezas.
 Pois não te mates em vão,
 que, quanto mais as quiseres,
 verás que são as mulheres.
 Que te presta padecer,que t´aproveita chorar,
 pois nunc´outras hão-de ser,
 nem s´hão  nunca de mudar?
 Deix´-as com sua noção,
 seu bem nunca lho esperes:
 lembre-te que são mulheres.
 Não te mates cruamentepor quem fez tão grande errada,
 que quem de si se não sente,
 por ti não lhe dará nada.
 Vive, lançando pregão,
 por tu fores e vieres,
 que são mulheres, mulheres!
   Cabo Espanha já foi perdidaPor Letabla talvez,
 e a Troia destruída
 por males qu´Helena fez.
 Desabafa, coração,
 vive, não te desesperes,
 qu´a que fez pecar Adão
 foi a mãe destas mulheres.
                                     (Cancioneiro Geral, 1516)   
 LIVRO DOS POEMAS.  LIVRO DOS SONETOS. LIVRO DO CORPO. LIVRO DOS  DESAFOROS.     LIVRO DAS CORTESÃES. LIVRO  DOS BICHOS..  Org. Sergio Faraco.   Porto Alegre:  L.P. & M., 2009.   624 p    ISBN 978-85-254-1839-5                  Ex. bibl. Antonio  Miranda   Da seção do LIVRO DOS DESAFOROS:
 
   CONTRA AS MULHERES
 Esforça,  meu coração,
 não te mates, se quiseres:
 lembra-te que são mulheres.
 
 Lembra-te que por nascer
 nenhuma que não errasse,
 lembra-te que seu prazer,
 por bondade, e merecer,
 não vi quem dele gostasse;
 pois não te dês à paixão,
 toma prazer se quiseres,
 lembra-te que são mulheres.
 
 Descansa, triste, descansa,
 que seus males são vinganças,
 tuas lágrimas amansa,
 deixas sus esperanças.
 Pois que nasceu sem razão,
 nunca por elas lh´es esperes,
 lembra-te que são mulheres.
 
 Tuas mui grandes firmezas,
 tuas grandes perdições,
 suas desleais nações
 causaram tuas tristezas.
 Pois não te mates em vão,
 que quanto mais as quiseres,
 verás que são as mulheres.
 
 Que te presta padecer,
 que te aproveita chorar,
 pois nunc´outras hão de ser
 nem são nunca de mudar?
 Deixas com sua nação,
 seu bem nunca lhe esperes,
 lembra-te que são mulheres.
 
 Não te mates cruamente
 por quem fez tão grande errada,
 que quem de si se não sente,
 por ti não lhe dará nada.
 Vive lançando pregão
 por onde fores e vieres,
 que são mulheres, mulheres.
 
 Final
 
 Espanha já foi perdida
 por Letabla uma vez,
 e a Tróia destruída
 por males que Helena fez.
 Desabafa, coração,
 vive, não te desesperes,
 que a que fez pecar Adão
 foi a mãe destas mulheres.
 Séc. XV, 1508
   * Página ampliada e republicada em agosto de 2022.   
 
   Página publicada em outubro de 2015 |